segunda-feira, 14 de outubro de 2019

Notas sobre o Cordão de Oração e o Rosário

Komboskini (o cordão de oração): Meditações de um monge do Santo Monte Athos

Prefácio

Há alguns anos, com as bênçãos do reverendo Padre José, abade do mosteiro de Xiropotamos do Santo Monte Athos, reimprimimos, em um livreto, um artigo muito didático sobre o cordão de oração, que foi publicado na "Agioritiki Martiria", uma revista do Mosteiro de Xiropotamos.

Devido ao fato de o livreto ter se mostrado muito útil e por causa das necessidades pastorais de todos os irmãos Ortodoxos de língua inglesa ao redor do mundo, foi sugerido que deveríamos prosseguir e publicar este livreto em inglês.

Devemos agradecer ao reverendo Pe. José, abade do mosteiro de Xiropotamos, por sua oferta e amor.

O cordão de oração não se destina a ser usado apenas por monges, mas também pode ser usada por leigos e, geralmente, por qualquer pessoa que queira orar a Deus. O cordão de oração não é um tipo de amuleto com poderes mágicos ou exorcizantes, como aqueles dados a pessoas de mente simples por mágicos ou médiuns, usados no pulso ou no pescoço. Pelo contrário, é um objeto sagrado puramente Ortodoxo usado apenas para orar e nada mais. Usamos o cordão de oração para orar secretamente.

Nesse ponto, precisamos observar algo muito importante: existem muitos livros que se referem à oração. No entanto, antes de começarmos a seguir qualquer regra ou oração, devemos necessariamente pedir conselhos, bênçãos e orientação espiritual de nosso pai espiritual, ou seja, o padre a quem confessamos nossos pecados. Foi isso que os Santos Padres nos ensinaram durante séculos, a fim de evitar delusão e, assim, não nos perder do caminho Ortodoxo correto.

Existem duas maneiras pelas quais podemos orar usando o cordão de oração:

1. A qualquer hora do dia, quando temos tempo livre, sem ser visto por ninguém, seguramos secretamente o cordão de oração com a mão esquerda ou direita e passamos de nó em nó com o polegar sussurrando simultaneamente ou meditando sobre a oração: "Senhor Jesus Cristo tem piedade de mim" ou "Santíssima Mãe de Deus, salva-nos".

2. No momento de nossa oração regular, quando oramos seguindo a regra de oração que nosso pai espiritual nos disse para seguir, seguramos o cordão de oração com a mão esquerda entre o polegar e o dedo indicador e passamos de nó em nó. A cada nó, simultaneamente, fazemos duas coisas: i) com a mão direita, fazemos o sinal da cruz sobre nós mesmos e ii) dizemos a oração "Senhor Jesus Cristo, tem piedade de mim". Quando terminamos todos os nós do cordão de oração, continuamos seguindo o mesmo procedimento, tantas vezes quanto nosso pai espiritual nos mandou.

Esperamos que todos os nossos irmãos e irmãs em Cristo sejam ajudados por este pequeno livro, que é o resultado da experiência de um monge anônimo do Santo Monte Athos. Também esperamos que todos usem o cordão de oração da maneira que nossos Santos Padres nos ensinaram, mesmo que se viva numa sociedade e não em um mosteiro.

- Thessaloniki, Grécia, Arquimandrita José


(grego: κομποσκοίνι - komboskini; Russo: чётки - chotki)
Paremos por um momento apenas para olhar para um pequeno cordão de oração, como este feita de lã preta no Monte Athos. É uma bênção de um lugar santo. Como muitas coisas que temos na Igreja, é uma bênção preparada e dada a nós por um irmão ou pai em Cristo, uma testemunha viva da tradição viva. É preto, da cor do luto e da tristeza, e nos lembra para sermos sóbrios e sérios em nossas vidas. Somos ensinados que a oração arrependida, especialmente a Oração de Jesus, pode nos trazer o que os Santos Padres chamam de triste alegria - no grego "Harmolipi".

Lamentamos nossos pecados, nossas fraquezas e falhas diante de Deus, de nossos semelhantes e de nós mesmos; mas em Cristo, que derrama sua misericórdia e perdão sobre todos os que invocam o seu nome, essa tristeza se torna uma fonte de alegria e conforto. Esse cordão de oração é feito de lã, ou seja, foi tirado de uma ovelha, um lembrete de que somos ovelhas racionais do Bom Pastor, Cristo Senhor, e também um lembrete do Cordeiro de Deus que tira os pecados de o mundo (veja João 1:29). E a cruz também nos fala do sacrifício e vitória da vida sobre a morte, da humildade sobre o orgulho, do auto-sacrifício sobre o egoísmo, da luz sobre as trevas. E a borla? Bem, você pode usá-la para enxugar as lágrimas dos olhos ou, se não houver lágrimas, para lembrá-lo de chorar porque não consegue chorar.

Além disso, desde os tempos do Antigo Testamento, pequenas borlas têm sido uma decoração para vestimentas sagradas, um lembrete da tradição sagrada da qual participamos quando usamos o cordão de oração.

Os cordões de oração são feitos de acordo com uma tradição cuja origem se perde na antiguidade. Talvez uma das formas mais antigas fosse simplesmente colher pequenas pedrinhas ou sementes e movê-las de um local ou de um recipiente para outro, quando alguém dizia sua regra de oração ou fazia sua regra de pequenas metanoias ou prostrações. Conta-se a história de um monge que decidiu fazer nós com uma corda, que ele poderia usar na execução de sua regra diária de oração. Mas o diabo continuava desatando os nós que ele fazia na corda, frustrando os esforços do pobre monge. Então um anjo apareceu e ensinou ao monge um tipo especial de nó que consiste em laços de cruzes entrelaçadas, e esses nós o diabo não conseguiu desfazer.

Os cordões de oração existem em uma grande variedade de formas e tamanhos. A maioria dos cordões de oração tem uma cruz entrelaçada ou presa para marcar o "fim" e também possui algum tipo de marcador após cada 10, 25 ou 50 nós ou contas. Existem muitas formas de cordões de oração, alguns feitos de lã ou seda ou outros materiais mais elegantes ou mais simples. Outros são feitos de contas ou da flor seca de uma planta chamada "Lágrimas da Mãe de Deus".

O cordão de oração é um dos itens dados a um monge cristão Ortodoxo no momento da tonsura: é dado a ele como sua espada espiritual com a qual ele, como soldado de Cristo, deve guerrear contra nosso inimigo espiritual, o diabo. Esta espada é manejada invocando o nome de nosso Senhor e Deus e Salvador Jesus Cristo, em um pedido que Ele tenha piedade de mim, pecador. Essa oração pode ser dita de forma mais curta, como: "Senhor Jesus Cristo, tem piedade de mim"; ou de uma forma mais longa, como: "Pelas orações da Santíssima Mãe de Deus e de todos os santos, Senhor Jesus Cristo tem  piedade de mim".

Outras breves orações: a oração do publicano: "Deus, tem misericórdia de mim, que sou pecador" (veja Lucas 18:13), a oração à Mãe de Deus: "Santíssima Mãe de Deus, salva-nos", ou outras breves orações ao Anjo da Guarda, a santos individuais ou a todos os santos também pode ser oferecido com a ajuda do cordão de oração. Uma forma comum de tal oração é: Santo Anjo da Guarda - ou Santo (nome) - ora a Deus por mim. Mudando as palavras dessas breves orações e dizendo: "tem misericórdia de nós" ou "rogai por nós", ou incluindo o nome ou nomes das pessoas pelas quais queremos orar, também podemos usar a corda de oração para orações intercessórias. Isso também se aplica aos que já partiram nesta vida: "Dê descanso, ó Senhor, a alma do Teu servo (nome)."

Quando os monges carregam o cordão de oração nas mãos, ele serve como um lembrete de sua obrigação de orar incessantemente, seguindo o mandamento do Santo Apóstolo Paulo de "orai sem cessar". Qualquer pessoa pode manter um cordão de oração no bolso ou em algum outro local discreto, onde pode ser facilmente usado despercebido quando em situações em que é melhor orar ou lembrar a oração em segredo, sem atrair a atenção de outras pessoas. O cordão de oração também pode ser colocado sobre a cabeceira da cama, em um automóvel, com uma pequena cruz ou ícone, ou em outros locais apropriados, como lembrete de oração e uma espécie de bênção e presença santa e piedosa em nossas vidas.

Mas agora, discutiremos brevemente o uso principal para o qual esse cordão de oração foi feito. Todo o propósito do cordão de oração é ajudar-nos a oferecer nossas orações diante de Deus e Seus santos. Além de servir como um lembrete externo e uma bênção presente conosco, como esse pequeno cordão pode nos ajudar a orar? Podemos orar sem um cordão de oração, é claro, e há momentos em que o uso do cordão de oração pode se tornar uma distração para nós em nossas tentativas de nos concentrar na oração. Com isso em mente, consideremos algumas maneiras pelas quais o cordão de oração pode ser útil. 

Há momentos em que nossa oração é fervorosa e é fácil para nós orar. Há momentos em que nossos pensamentos estão tão distraídos que achamos praticamente impossível nos concentrar na oração. Isto é especialmente verdade quando tentamos manter uma regra de oração todos os dias. Alguns dias correm muito bem, mas outras vezes - se não na maioria das vezes? - nossos esforços parecem quase em vão. Mas, como somos "criaturas de hábitos", como diz o ditado, é muito proveitoso reservar um horário (ou horários) especial e regular durante o dia para a oração. O tempo da noite antes de dormir é um bom momento, pois é importante terminar o dia com oração. A manhã, ao acordar do sono, também é bom, para começar o novo dia com oração. Ou uma pessoa pode encontrar outros momentos durante o dia em que é capaz de ficar quieta e se concentrar.

Estamos tentando estabelecer uma regra de oração em nossas vidas, não uma exceção, por isso queremos encontrar um momento em que todos os dias possamos encontrar um pouco de silêncio para nos concentrarmos e voltarmos os olhos da nossa alma para Deus.

Podemos ler algumas orações de um livro de orações como parte dessa regra ou oferecer orações e encontrar quietude em nossas almas de outras maneiras, como ler literatura religiosa, refletir sobre os eventos do dia anterior - "Anaskopisis" [1] - e assim por diante. Mas uma das maneiras mais eficazes de obter benefícios de uma regra de oração é dizer regularmente um número definido da Oração de Jesus todos os dias. Não precisa ser um número grande, e pode demorar apenas quinze minutos, mas essa será a parte de nossos dias que pertence a Deus, os pequenos grãos de sal que darão sabor à nossa vida cristã. Essa prática é hoje recomendada por muitos médicos em prol da saúde física de uma pessoa, especialmente para superar o estresse. Melhor ainda, encontre pouco espaço de tempo em vários pontos do dia e encha-os regularmente com os preciosos tesouros da oração, um tesouro que ninguém pode roubar de você, que foi preparado para você no céu (veja: Mat. 6: 20)

Ao manter um número consistente de orações como parte dessa regra diária, um cordão de oração pode ser bastante útil. Com o cordão de oração, você pode oferecer um número definido de orações e concentrar-se nas palavras da oração conforme você as oferece. Depois de recolher seus pensamentos, pegue a cruz no cordão de oração em sua mão esquerda, segurando-a levemente entre o polegar e o dedo indicador. Então, fazendo o sinal da cruz silenciosamente, sussurre a Oração de Jesus. À medida que seus pensamentos se tornam mais concentrados, talvez você não precise continuar fazendo o sinal de cruz ou fazendo a oração de forma audível. Outras vezes, quando a concentração está difícil, use o sinal da cruz e susurre como meios para ajudar a manter a mente em oração.

É bom ficar de pé, com a cabeça inclinada, em uma posição humilde; algumas pessoas gostam de levantar as mãos de vez em quando em seus pedidos de misericórdia. Outros, porém, acham mais útil sentar ou ajoelhar-se, com a cabeça baixa, para se concentrar. Depende muito do indivíduo e também de sua saúde e formação. O importante é ficar quieto e se concentrar nas palavras da oração ao repeti-la.

Obviamente, uma pessoa tem que combater a tentação de "se apressar". Por esse motivo, algumas pessoas usam um relógio em vez de uma corda de oração como uma medida externa para sua regra de oração. Ao usar um relógio, uma pessoa pode dedicar um certo tempo à oração, embora não possa acompanhar o número exato de orações que ele diz. Mas, novamente, relógios com sinais sonoros eletrônicos são um desenvolvimento bastante recente, e manter um relógio alto que sacode os nervos com um alarme alto raramente prova ser um grande benefício para a oração. 

O cordão de oração também é uma maneira conveniente de acompanhar o número de pequenas metanoias ou prostrações que uma pessoa faz durante sua regra de oração. Fazer o sinal da cruz sobre si mesmo e depois se curvar e tocar o chão com as pontas dos dedos, ou se ajoelhar e tocar a testa no chão são maneiras muito antigas de oferecer orações a Deus e Seus Santos. Pode-se combinar essas pequenas metanoias ou prostrações com a Oração de Jesus ou qualquer uma das breves orações que mencionamos acima. A ação física de curvar-se ou ajoelhar-se pode contribuir para o fervor da oração e dar expressão à nossa súplica, à medida que nos humilhamos diante de Deus. Esta é uma maneira pela qual podemos cumprir o mandamento apostólico de louvar a Deus, tanto em nossa alma quanto em nosso corpo. [2] Muitas pessoas usam o cordão de oração quando se deitam para dormir. Depois de abençoarem a sua cama fazendo o sinal da cruz sobre ela, eles pegam seu cordão de oração, se abençoam com o sinal da cruz enquanto se deitam na cama e oram silenciosamente com cordão de oração até adormecerem.

E acordar com o cordão de de oração ainda nos dedos ou ao seu lado no travesseiro ajuda a começar o novo dia com oração. Mas terminar o dia anterior com uma oração silenciosa é uma maneira ainda melhor de se preparar para um começo de oração do novo dia, sem mencionar a preparação para o Dia Eterno, caso adormecermos naquela noite na morte. E outros seguram seu cordão de oração durante momentos de inatividade, como durante o trajeto ou a viagem. A qualquer hora do dia, sempre que você se lembrar de fazer isso, você pode colocar um pequeno cordão de oração nos dedos, e a associação dessa ação com a oração que você oferece em outros momentos ajudará você a se concentrar e a oferecer algumas orações durante o curso do dia, onde quer que esteja, o que quer que esteja fazendo. E este é um passo importante para cumprir o mandamento de orar sem cessar.

O santo bispo Inácio Brianchaninov menciona que os longos serviços realizados na Igreja Ortodoxa também são uma boa oportunidade para orar com o cordão de oração. Muitas vezes, há momentos em que é difícil se concentrar nas palavras que estão sendo lidas ou cantadas, e é mais fácil se concentrar silenciosamente nas próprias orações privadas, sejam orações extemporâneas por alguma necessidade especial, orações repetitivas ou salmos que conhecemos de cor, ou repetir alguma oração breve, especialmente a Oração de Jesus, com a ajuda do cordão de oração. De fato, isso geralmente ajuda a pessoa a se concentrar melhor no próprio serviço, algo mencionado por São Serafim de Sarov. Obviamente, quando estamos orando nos serviços, nossa oração se junta à de toda a Igreja.

Estamos constantemente ocupados por todos os tipos de pensamentos que aparecem em nossas cabeças, e parece que mal começamos a orar e já nos pegamos pensando em outra coisa. Aqui, novamente, a presença física do cordão de oração em nossos dedos pode ajudar-nos a nos recuperar e retornar à nossa tarefa de oração mais rapidamente. Ou, o tocar em um dos marcadores ou na cruz no cordão de oração, enquanto o movemos pelos dedos, nos lembra que fomos desviados das orações que pretendíamos oferecer. E imediatamente podemos oferecer nossas orações novamente, sem nos enredarmos mais em nossos pensamentos sobre o quão fácil é nos distrairmos na oração a Deus.

Aqui, abordamos a grande ciência da oração, o que os Santos Padres chamaram de "arte das artes". Há uma excelente e rica literatura escrita pelos grandes homens de oração de todas as épocas que podem ajudar a guiar-nos no aprendizado, com a ajuda de Deus, desta maior e mais benéfica de todas as ciências. A leitura regular do Santo Evangelho, a vida dos santos e outras publicações devocionais e espirituais podem ser de grande ajuda. Obras como a Filocalia contêm instruções e orientações importantes e inspiradoras para aprender a orar como cristão, que é um aspecto essencial de ser um cristão. Acima de tudo, porém, é preciso a graça de Deus na Igreja, especialmente na comunhão dos Santos Mistérios.

Estes são apenas alguns pensamentos introdutórios sobre como podemos fazer um bom uso de um cordão de oração. Mas o importante é começar a orar. O cordão de oração não ora por si só, embora alguns deles sejam tão magníficos que possam dar essa impressão. Aqui está uma ajuda importante e tradicional na oferta de orações, e especialmente para uma regra diária de oração. Mas o importante é concentrar-se nas palavras da oração, oferecer orações sinceras a Jesus Cristo, nosso Senhor e Deus.

Se este pequeno cordão de oração ajuda você a fazer uma oração ou o lembra de orar ou o ajuda de alguma forma a se tornar mais orante, terá cumprido seu propósito, ele terá ligado você mais intimamente com Cristo nosso Deus, e também o aproximará mais do Reino de Deus, pois "o Reino de Deus está dentro de você". (veja Lucas 17:21)

Epílogo

Temos que observar, mais uma vez, que em relação a qualquer regra de oração sobre a oração com o cordão de oração ou qualquer outra regra (jejum etc.), a primeira e a última palavra devem ser ditas por nosso pai espiritual, a fim de evitar delusões, como os Santos Padres nos ensinaram.

Algumas citações sobre a Oração "Senhor Jesus Cristo, tem piedade de mim" de nossos Santos Padres

Na primeira epístola aos tessalonicenses, o apóstolo Paulo diz: "Orai sem cessar".

São João Crisóstomo, em seu discurso sobre sobriedade e oração, diz o seguinte: "Irmãos, estejam sempre ocupados com a oração intelectual e não se afastem de Deus até receberem a misericórdia e a piedade de Deus. Nunca peça nada, a não ser Sua infinita misericórdia e isso é suficiente para a sua salvação.Quando pedir Sua misericórdia, clame em voz alta com coração humilde e contrito de manhã a noite e, se possível, durante toda a noite, dizendo incessantemente: Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, tem piedade de nós ".

São João Climaco diz o seguinte: "Vença os inimigos em sua mente com o nome de Deus. Você não encontrará nenhuma outra arma mais eficaz que essa! Da mesma forma, você conseguirá apaziguar suas paixões dentro de si e eliminá-las com o auxílio da oração".

São Serafim de Sarov diz: "Quando a mente e o coração estão unidos em oração e a alma está totalmente concentrada em um único desejo por Deus, então o coração se aquece e a luz de Cristo começa a brilhar e enche o homem interior com paz e alegria. Devemos agradecer ao Senhor por tudo e nos entregar à Sua vontade; devemos também oferecer a Ele todos os nossos pensamentos e palavras, e nos esforçar para fazer com que tudo sirva apenas Sua boa vontade".

Santo Isichios escreve sobre a oração: "Através da constante lembrança e invocação a Jesus Cristo, uma santa condição é criada em nossa mente. Isso acontece, se recorrermos a Jesus Cristo com fervor, clamando em voz alta por Ele dia e noite, de modo que a repetição leva ao hábito e o hábito se torna uma segunda natureza!".

Hieromártir São Cosmas Aetolos (+1779) diz: "Eu aconselho você a fazer um Komboskini, todos vocês, jovens e velhos, e segure-o na mão esquerda e faça o sinal da cruz com a mão direita e diga: 'Senhor Jesus Cristo, tem piedade em mim'" .... "Aconselho todos os cristãos a fazerem cruzes e komboskinis e ora a Deus para abençoá-los, para que possam mantê-los como amuletos ".

Notas

[1] Anaskopisis: no sentido paternal de examinar-se, de se controlar, a fim de sentir remorso por nossos pecados e se tornar melhor, mas também reconhecer a beneficência de Deus.

[2] I Coríntios 6:20: "Glorificai, pois, a Deus no vosso corpo, e no vosso espírito, os quais pertencem a Deus".

Em inglês: http://orthodoxinfo.com/praxis/comboschini.aspx

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Trecho do livro "A Igreja Ortodoxa" do Bispo Kallistos Ware 
(Traduzido por Padre Pedro Oliveira)

Existe um tipo de oração privada, largamente usada no ocidente desde os tempos da Contra-Reforma, que nunca foi um assunto da espiritualidade Ortodoxa, a "Meditação" formal, feita de acordo com um método, (o Inaciano, o Sulpiciano, o Salesiano, ou algum outro). Os Ortodoxos são encorajados a ler as escrituras ou os Santos Padres lenta e pensativamente; mas tal exercício, ainda que encarado como excelente, não se considera que constitua uma oração, nem foi sistematizado e reduzido a um «Método.» Cada um é solicitado a ler do modo que ele ache mais útil.

Mas ainda que os Ortodoxos não pratiquem a Meditação discursiva, existe um outro tipo de oração pessoal que por muitos séculos desempenhou uma parte extraordinariamente importante na vida da Ortodoxia: a Oração do Coração: «Senhor Jesus Cristo, Filho do Deus Vivo, tem piedade de mim, pecador (a)» Como algumas vezes é dito que os Ortodoxos não dão suficiente atenção à pessoa do Cristo Encarnado, é importante chamar a atenção para o fato que essa oração seguramente a mais clássica das orações Ortodoxas, é essencialmente Cristocêntrica, e uma oração endereçada para e concentrada no Senhor Jesus Cristo. Aqueles que são conduzidos à tradição da Oração do Coração não são liberados para em nenhum momento esquecer o Cristo Encarnado.

Como auxilio para recitar essa oração muitos Ortodoxos usam um rosário, que difere em estrutura do terço ocidental; um Rosário Ortodoxo é quase sempre feito de lã, assim ao contrário de uma fieira contas, ele não faz barulho.

A Oração do Coração, é uma oração de maravilhosa versatilidade. É uma oração para principiantes, mas igualmente uma oração que conduz aos mais profundos mistérios da vida contemplativa. Pode ser usada por qualquer um, a qualquer hora, em qualquer lugar; esperando em filas, andando, viajando em ônibus ou trens; no trabalho; quando incapaz de dormir à noite; em tempos de especial ansiedade quando é impossível se concentrar em outro tipo de oração. Mas enquanto logicamente todo Cristão pode usar a Oração em momentos impares, é uma questão diferente recitar a Oração mais ou menos continuadamente e usar os exercícios físicos que foram associados a ela. Os escritores espirituais Ortodoxos insistem que aqueles que usam a Oração do Coração sistematicamente, deveriam sempre que possível, colocarem-se sob a guia de um orientador experiente e não fazer nada por sua iniciativa própria.

Para alguns chega um momento em que a oração do Coração «entra no coração,» de modo que ela não é mais recitada por um esforço deliberado, mas é recitada espontaneamente, continuamente mesmo quando se esteja falando ou escrevendo, presente nos sonhos, acordando-nos na manhã. Nas palavras de São Isaac, o Sírio:
«Quando o Espírito faz sua morada no homem, ele não deixa de orar, porque o Espírito orará constantemente nele. Então, nem quando ele dorme, nem quando está acordado, a oração será removida de sua alma; quando ele come e quando bebe, quando se deita ou quando faz algum trabalho, mesmo quando está imerso no sono, os perfumes da oração soprarão espontaneamente em seu coração» (Mystic Treatises, editado por Wensinck, pg.174).
Os Ortodoxos acreditam que o poder de Deus está presente no nome de Jesus, de modo que a invocação desse Divino Nome age como um efetivo sinal da ação de Deus, como um tipo de sacramento (um Monge da Igreja do Oriente, A oração de Jesus, Chevetogne, 1952, pg.87). ‘O Nome de Jesus, presente no coração humano, comunica a ele, o poder da deificação… Brilhando através do coração, a luz do Nome de Jesus ilumina todo o universo’ (S. Bulgakov, The Orthodox Church, pg.170-171).

Tanto para aqueles que recitam a Oração continuadamente quanto para aqueles que a empregam ocasionalmente, ela prova ser uma grande fonte de segurança e de alegria. Para citar o Peregrino Russo: «E é assim que eu ando agora, e repetindo a oração do coração sem cessar, que é mais preciosa e doce para mim do que qualquer outra coisa do mundo. As vezes eu ando algo como 43 ou 44 milhas por dia, e não sinto que estou andando. Estou ciente apenas do fato de estar dizendo minha oração. Quando o frio amargo me penetra, eu começo a dizer minha oração mais fervorosamente, e rapidamente sou aquecido por inteiro. Quando a fome começa e me sobrepujar, eu chamo o Nome de Jesus mais vezes, e esqueço de meu desejo por comida. Quando caio doente e tenho reumatismo nas minhas costas e pernas, fixo meus pensamentos na Oração e não noto a dor. Se qualquer um me ofende eu só tenho que pensar, «quão doce é a Oração do Coração!»e a injuria e a raiva passam logo e eu esqueço de tudo… Eu agradeço a Deus que agora eu entenda o significado das palavras que eu ouvi na Epístola: «Orai sem cessar» (1 Ts 5:17; The Way of a Pilgrim, pg. 17-18).
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Nota do skemmata (baseada em comentários de sites, grupos e blogs ortodoxos):



O Rosário Católico Romano 
"Mais uma vez baseando-se nos Santos Padres, Pe. Serafim (Rose) aconselhou seus filhos espirituais a não confiarem ou se deixarem levar pela imaginação, especialmente durante a oração. Pe. Alexey Young lembra como, quando ele ainda era Católico Romano se preparando para se tornar Ortodoxo, ele recebeu uma importante lição do Pe. Serafim: “Perguntei ao Pe. Serafim sobre meditação, que minha esposa e eu, ainda sob a influência de nossa formação Católica Romana, fazíamos em nossa rotina regular de oração da manhã. Ainda não tínhamos percebido que o entendimento Ortodoxo da meditação é bem diferente da visão cristã ocidental. Em uma conversa, Pe. Serafim explicou que o uso da imaginação nos sistemas espirituais ocidentais de meditação - ou seja, rezar o Rosário, as Estações da Cruz ou fazer os Exercícios Espirituais de Inácio de Loyola, etc. - não era compatível com a espiritualidade Ortodoxa e era proibido porque a imaginação só passou a ter uso após a queda de Adão e Eva; é uma das funções mais inferiores da alma e o playground favorito do diabo, que pode e usa a imaginação humana para enganar e desviar até pessoas bem-intencionadas.” Pe. Alexey Young, Letters from Fr. Seraphim, pp. 12-13.
No ocidente, alguns Ortodoxos passaram a utilizar a palavra rosário pra referir-se ao cordão de oração utilizado pelos Ortodoxos. No entanto, é importante destacar que o mesmo termo pode significar duas coisas distintas: 1) uma ferramenta utilizada para acompanhar qualquer oração, facilitando a contagem (não há nada errado em usá-lo para isso) 2) uma prática espiritual Católica Romana que surgiu após o cisma e que não é espiritualmente saudável, na qual os Católicos Romanos são encorajados a fazerem uso da imaginação. Por que não é espiritualmente saudável? Porque nosso intelecto é caído e por meio das imaginações o demônio nos ataca. Deus está em nosso coração. Essa prática Católica Romana foca não no coração, mas nas explorações vívidas da mente e isso pode tornar aquele que ora vulnerável a visões demoníacas. A meta da prática Ortodoxa é levar a mente (nous) ao coração.  Para os Ortodoxos, não há prática de piedade afetiva. A "visualização" meditativa não é encorajada. A imaginação e as emoções são faculdades caídas e não são apropriadas para a devoção. É claro que é bom ter emoções ou imaginação,  mas elas não devem ser estimuladas na oração. Além disso, confundir emoções pela piedade é um erro.

Em geral, na Ortodoxia, "elevar nossa mente" é se esforçar para eliminar todo pensamento, incluindo imagens mentais, concentrando-se nas palavras da oração. Ao fazer a oração, comumente vagamos em devaneios, distrações externas, pensamentos invasores (de nossa própria imaginação ou de demônios) etc. A oração pura é uma guerra que visa manter deliberadamente nossas mentes focadas na oração e na REAL presença invisível de nosso Senhor. O uso da imaginação durante a oração é uma porta de entrada para a influência demoníaca que conduz ao estado de engano espiritual (prelest). É importante destacar que a proibição é contra imaginações / visualizações durante a ORAÇÃO, especificamente durante a Oração de Jesus. NÃO é uma proibição durante o culto litúrgico, nem nos momentos de contemplação e etc. Afinal, a própria idéia por trás dos ícones é que eles elevam nossas mentes e corações a coisas espirituais mais elevadas. Em outras palavras, há um tempo para meditação e / ou contemplação em que é perfeitamente bom e recomendável lembrar-se dos santos, da Mãe de Deus, de Cristo, dos anjos, as festas, as narrativas bíblicas ou patrísticas etc. Mas o momento de oração é momento de oração. É um momento para comungar com Deus; não se envolver em imaginações ou devaneios. Essencialmente, o Rosário não é diretamente comparável com a oração sem imagem hesicasta; tem mais em comum com as horas, canons e acatistes. Rigorosamente falando, não existe um "Rosário Ortodoxo", ele é chamado Komboskini ou Cordão de Oração. Chamá-lo de "Rosário Ortodoxo" é como chamar o Rosário de "Komboskini Romano", são duas coisas completamente diferentes.

Citamos aqui um trecho do artigo As Aparições de Fátima e o Cristianismo Ortodoxo
Na sexta aparição a aparição chama-se "Senhora do Rosário". Um dos métodos recomendados repetidamente pela aparição para obter a paz mundial é o uso diário do Rosário. Agora, o Rosário é uma devoção distintamente católica romana, que é estranha à piedade ortodoxa. O Rosário consiste de quinze "mistérios", ou  tópicos para meditação, p. a Anunciação, a Crucificação, a Coroação de Maria como Rainha do Céu, etc.; enquanto recita-se a Ave Maria dez vezes para cada mistério, deve-se tentar visualizar o evento comemorado nesse mistério.
Como acontece com muitos métodos cristãos ocidentais de meditação, essa abordagem encoraja o uso ativo da imaginação, algo que os Santos Padres nos ensinam que é uma fonte perigosa de erros e enganos: quando começamos a imaginar os eventos na vida de nosso Senhor, inevitavelmente os revestimos em nossos próprios termos e os apresentamos de uma maneira que seja agradável a nós mesmos; assim nos tornamos a medida dos acontecimentos em Sua vida e deixamos de lado facilmente aqueles aspectos com os quais não nos sentimos confortáveis.
Os Santos Padres nos ensinam, ao contrário, a sempre sermos cautelosos com a imaginação, a aprender a controlá-la, não a desenvolvê-la. Além disso, o uso da imaginação ao recitar as palavras da Ave Maria significa que não se está atendendo às palavras da oração. Em vez de auxiliar a concentrar-se nas palavras dirigidas a Deus e aos santos na oração, esse método de fato estimula a distração e os pensamentos errantes, ocultando-os sob a aparência de "meditações" sobre os acontecimentos da história sagrada, aqueles imaginados pela pessoa que ora. Assim, o Rosário Católico Romano é muito diferente no que diz respeito ao uso e a intenção comparado a cordão-de-oração Ortodoxo de onde se desenvolveu, cujo propósito é ajudar a pessoa orando a se concentrar mais intensamente sobre as palavras de sua oração e impedir seus pensamentos de vagar. 

São Serafim de Sarov utilizava o cordão de oração dos velhos-crentes chamado de Lestovka
São Serafim de Sarov e o Rosário

É comum ouvir "São Serafim ensinou uma versão Ortodoxa do Rosário Católico Romano". Não, ele não ensinou. Atribuir a São Serafim de Sarov a prática Católica Romana é um erro. A repetição da oração "Rejubila-te, ó Virgem" não é o mesmo que o Rosário. Ele recomendou uma regra de oração especial para as freiras Diveevo seguirem, que envolvia dar 3 voltas em torno de seu convento enquanto oravam com o cordão de oração. A primeira volta fazia-se a oração à Virgem, a segunda volta, o Pai Nosso, a última volta orava-se para os vivos e os que repousaram.

No entanto, era apenas para as freiras Diveo, não para o leigo comum. São Serafim prescreveu outra regra de oração para o leigo comum... Pai Nosso 3x, o hino a Theotokos “Ó Theotokos e Virgem, rejubila…” 3x e, por fim, o Símbolo de Nossa Fé 1x.

Em resumo, era:

A] Significativamente diferente (sem meditações, mistérios, práticas emocionais) do Rosário Católico Romano

B] Era uma obediência específica para as freiras sob seus cuidados; isto é, não uma devoção a ser usada por todos os fiéis. E

C] Estava confinada a uma localização geográfica específica no mosteiro das mulheres de Diveevo.

Por fim, citamos o seguinte comentário:
1. A maioria das fontes que atribuem o Rosário a São Serafim citam elas mesmas, e ainda não encontrei uma citação de uma fonte sólida. 
2. Deparei com uma sugestão de que o Serafim associado ao Rosário pode ter sido uma pessoa diferente, um novo mártir (Bispo Serafim Zvezdinsky), e não São Serafim de Sarov (o que poderia explicar a falta de uma fonte sólida relacionada a São Serafim de Sarov). 
3. Nenhuma fonte indica uma regra de oração mais complexa do que quinze séries de dez repetições de "Ó Theotokos e Virgem rejubila...", com uma breve oração antes de cada série e algumas outras orações breves depois de cada série.

Sobre o papel da imaginação na Tradição Ortodoxa veja os seguintes artigos:

Arquimandrita Sofrônio - Das Diversas Formas da Imaginação e do Combate Ascético Contra Elas (aqui)
Pe. Sergei Sveshnikov - Imagens Mentais na Devoção Privada Ortodoxa (aqui)
São Teófano, o Recluso - O Controle da Imaginação e da Memória (aqui)
M. V. Lodyzhenskii  - Misticismo Ortodoxo e o Misticismo Católico-Romano (aqui)

Um comentário:

  1. "Só uma Religião pode ser verdadeira: a revelada por Deus; a única Religião revelada por Deus é a Igreja Católica." (Papa Pio XI)

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