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segunda-feira, 31 de julho de 2017

Oração de Jesus e as práticas meditativas não-Cristãs

Me envolvi bastante com a Oração Centrante e a Meditação Cristã ensinada pelo monge beneditino John Main. Eu liderava grupos e retiros semanais de "meditação cristã" nas paróquias, retiros coordenados liderados por um conhecido monge beneditino, etc. Assim foi a minha vida por muitos anos. No último ano do meu envolvimento com este movimento, eu me encontrava num período de noviço como um Oblato Beneditino (aquele que tenta seguir a Regra de São Bento enquanto vive no mundo), tentando decidir se eu tomaria meus votos finais como oblato e permaneceria no movimento de Meditação Cristã, ou se deveria entrar na Igreja Ortodoxa. Ao entrar cada vez mais profundamente na disciplina da Meditação Cristã ao longo de muitos anos e conhecendo outros que tinham muita experiência nesta prática, e simultaneamente estudando a fé Ortodoxa e a Tradição da Oração de Jesus, percebi que a Meditação Cristã / Oração Centrante eram de origem e orientação espiritual muito diferente da tradição dos Pais do Deserto e sua continuação na Igreja Ortodoxa hoje. Cheguei à conclusão de que o MC / OC era completamente incompatível com a tradição Ortodoxa, e assim, no final, tive que fazer uma escolha para seguir o resto da minha vida.

A Meditação Cristã (MC) e a Oração Centrante (OC) foram tentativas de "cristianizar" a meditação de mantras hindus, como ensinado por Swami Satyananda na Malásia (no caso de MC) e Maharishi Mahesh Yogi (no caso da OC). Enquanto abade de Spenser Abbey em Massachusetts, Pe. Thomas Keating convidava mestres zen para ensinar seus monges trapistas / beneditinos a meditar. Uma vez que os métodos de oração de Meditação Cristã / Oração Centrante vêm diretamente do Oriente não-cristão, não há surpresa alguma que alguém venha a ter uma experiência semelhante praticando esses mesmos métodos, mesmo dentro de diferentes religiões. Na verdade, a experiência é muito parecida, e é por isso que, dentro dos círculos MC / OC, é muito popular acreditar que, no seu "núcleo místico", todas as religiões experimentam a mesma coisa e descrevem essa experiência em diferentes termos. Alguns descrevem sua experiência em termos de "Deus" e "Amor", enquanto outros em termos de "Vazio" ou "Absoluto", por exemplo, dependendo das doutrinas religiosas através das quais essa mesma experiência é interpretada.

Com o meu envolvimento cada vez mais profundo com a Ortodoxia, cheguei a ver que essa "experiência comum" no "núcleo místico" de todas essas práticas é apenas a experiência de nossa própria natureza criada, nosso próprio espírito humano criado. Essa experiência de nosso próprio espírito criado é muitas vezes descrita em termos de "realidade" exterior à consciência do tempo e do espaço, uma experiência de ilimitabilidade, de eternidade, de infinitude, de unicidade, etc. Esta é uma experiência muito iluminadora e transformadora para as pessoas, mas é simplesmente a experiência da realidade alcançada como uma consequência natural da aplicação de certa técnica psico-somática. Em outras palavras, essa experiência não tem nada a ver com entrar em comunhão com o Deus Incriado através de Suas energias divinas e incriadas (graça). Mas, tal experiência do espírito criado é algo ruim?

Na Meditação Cristã e na Oração Centrante, muitas vezes se ensina sobre a experiência de comunhão com Deus, quando, na realidade, os praticantes desses métodos são apenas conduzidos à experiência da infinitude de seu próprio espírito criado. Quando alguém experimenta seu próprio espírito criado e confunde essa experiência com a experiência do Deus Incriado, isso é um engano, e esse engano se torna o maior obstáculo para verdadeiramente conhecer Deus e entrar em comunhão com Ele. Esse engano, de fato, cria um obstáculo maior para conhecer Deus do que os obstáculos das mais grosseiras paixões porque esse alguém foi, em última instância, levado a adorar seu próprio eu como Deus. Essa é a experiência do hindu que diz "Atman é Brahman" ou "Si mesmo é Deus". Através da crença de que o próprio espírito criado por Deus é Deus ou igual a Deus, que é o mesmo que confundir seu espírito criado com o Espírito Incriado, cai-se no mesmo engano que Lúcifer no momento da sua grande queda.

O movimento contemplativo no Ocidente hoje, que é liderado principalmente pelos ensinamentos da Oração Centrante e da Meditação Cristã, tem em seu centro o engano  espiritual e a confusão em relação à experiência de Deus e ao próprio espírito criado. Não é de admirar, então, que os líderes deste movimento, do famoso Thomas Merton aos "mestres" de nosso próprio tempo, não vejam nenhum problema com os Cristãos que aprendem a meditar com Mestres Zens e gurus Hindus (conheci alguns Católicos Romanos que também são Zen Roshis certificados, por exemplo). A prática desses métodos levou a um "Novo Cristianismo" que não é um retorno à tradição dos Pais do Deserto (que este movimento tenta explorar, ao justificar-se) e a Igreja primitiva, mas é uma traição do próprio fundamento da fé apostólica e estabelecimento de uma nova fé que estabelece os fundamentos da futura religião do Anticristo.

É muito popular nos ensinamentos da OC / MC referir-se à tradição Ortodoxa da Oração de Jesus como sendo da mesma tradição. De fato, foi assim como aprendi pela primeira vez sobre a Igreja Ortodoxa. Quando se examina profundamente sobre cada tradição, no entanto, percebe-se que tudo é abordado de forma bem diferente. Você pode, então, examinar a continuidade e a consistência da tradição Ortodoxa da Oração de Jesus e sua completa inseparabilidade do batismo na Igreja Ortodoxa e da participação na vida sacramental Ortodoxa.Você pode então comparar isso com as tradições criadas recentemente da Oração Centrante e da Meditação Cristã, que não têm continuidade viva com a Igreja primitiva, mas que só foram revividas através do contato com o Oriente não-cristão. Você pode então examinar os frutos dessas tradições, pode examinar os antigos Pais do Deserto e os Pais do Deserto contemporâneos da Igreja Ortodoxa que têm exatamente a mesma tradição e visão de mundo como os Pais antigos; e compare isso com o fato de que os movimentos de OC / MC não produziram santos contemporâneos como os Pais do Deserto. Quanto mais profundo você entrar nessas questões, mais você verá a divergência e, no entanto, apenas uma dessas tradições é consistente com a fé "entregue de uma vez por todas aos santos".

Algumas citações do Ancião Sofrônio de Essex e do Hieromonge Damasceno de Platina do livro "Christ the Eternal Tao":

Pe. Damasceno escreve sobre a experiência da luz interior:
"Aqui estamos pisando em terreno perigoso, por isso é necessário ir devagar. É aqui que muitos daqueles que praticam vigilância caíram na delusão ao longo dos séculos. Tudo depende da pureza da intenção daquele que está entrando. Se a intenção (consciente ou inconsciente) não é enfrentar a condição de pecado de si mesmo, de arrepender-se e assim reconciliar-se com Deus, mas, em vez disso, é de "ser espiritual" enquanto continua a adorar a si mesmo, então, pode-se, ao tornar-se consciente da luz do próprio espírito, começar a adorá-la como Deus. Esta é a derradeira delusão."
Arquimandrita Sofrônio é então citado:
"Alcançando os limites onde 'o dia e a noite chegam ao fim', o homem contempla a beleza de seu próprio espírito que muitos identificam com o Ser Divino. Eles veem uma luz, mas não é a Luz Verdadeira na qual 'não há qualquer escuridão'. É a luz natural peculiar à mente do homem criado à imagem de Deus.
"A luz mental, que ultrapassa qualquer outra luz do conhecimento empírico, pode ainda ser chamada de escuridão, uma vez que é a escuridão da alienação e Deus não está nela. E, talvez, neste caso mais do que qualquer outro, devemos escutar o aviso do Senhor: "Tome cuidado, portanto, que a luz que está em você não seja a escuridão". A primeira catástrofe cósmica pré-histórica - a queda de Lúcifer, filho da manhã, que se tornou o príncipe das trevas - foi devido à sua contemplação enamorada de sua própria beleza, que terminou em sua auto-deificação".
Pe. Damasceno então comenta esta passagem:
"A escuridão da alienação de que o Pe. Sofrônio fala é o estado de ter se elevado acima de todos os processos de pensamento que descrevemos anteriormente. Se o motivo da pessoa é orgulho, ela parará neste ponto, admirando seu próprio brilho; mas esse brilho ainda será escuridão. Ele pensará que encontrou Deus, mas Deus não estará ali. Ele encontrará uma espécie de paz, mas será uma paz separada de Deus.
 "Ir além do pensamento não é ainda alcançar o verdadeiro conhecimento. Tal conhecimento vem da Palavra falando silenciosamente no espírito que está ansiando por Ela; não vem do próprio espírito. A Palavra virá e fará Sua morada com o espírito somente se a pessoa se aproximar de Ele com absoluta humildade, pois Ele mesmo é humildade e semelhante atrai semelhante".
Pe. Sofrônio escreve mais sobre aqueles que se aproximam sem humildade:
"...uma vez que aqueles que entram pela primeira vez na esfera do 'silêncio da mente' experimentam uma certa admiração mística, eles confundem sua contemplação com a comunhão mística com o Divino, ao passo que, na realidade, eles ainda estão dentro dos limites da natureza humana criada. A mente aqui, é verdade, passa além das fronteiras do tempo e do espaço, e é isso que lhe dá uma sensação de apreensão da sabedoria eterna. Isso é tão longe quanto a inteligência humana pode ir seguindo o caminho do desenvolvimento natural e da auto-contemplação ...
"Habitando na escuridão da alienação, a mente conhece um deleite peculiar e uma sensação de paz... Purificando as fronteiras do tempo, tal contemplação aproxima a mente ao conhecimento do não-transitório, portanto dando ao homem uma cognição nova, mas ainda abstrata. Ai daquele que confunde esta sabedoria com o conhecimento do Deus verdadeiro, e essa contemplação com uma comunhão no Ser Divino. Ai daquele porque a escuridão da alienação nas fronteiras da verdadeira visão se torna uma passagem impenetrável e uma barreira mais forte entre ele e Deus que a escuridão devido a revolta da paixão grosseira, ou a escuridão de instigações obviamente demoníacas ou a escuridão que resulta da perda da graça e do abandono por Deus. Ai daquele, pois ele se desviará e cairá em delusão, já que Deus não está na escuridão da alienação".
Experimentar a escuridão da alienação e a luz da mente, diz o Pe. Sofrônio, "é naturalmente acessível para o homem", mas experimentar a Luz Incriada da Divindade é dado ao homem por uma ação especial de Deus. Essas duas experiências diferem qualitativamente uma da outra. Pe. Sofrônio escreve:
"Foi-me concedido contemplar diferentes tipos de luz e luzes - a luz que o artista conhece quando exaltado pela beleza do mundo visível, a luz da contemplação filosófica que se desenvolve em uma experiência mística. Incluamos até mesmo a 'luz' do conhecimento científico que é sempre e inevitavelmente de valor muito relativo. Fui tentado por manifestações de luz de espíritos hostis. Mas já adulto, quando retornei a Cristo como Deus perfeito, a Luz eterna brilhou sobre mim. Essa maravilhosa Luz, mesmo na medida que me foi concedida do Alto, eclipsou tudo, assim como o sol nascente eclipsa a estrela mais brilhante".
O Pe. Damasceno então comenta sobre esta passagem:
"Nós não praticamos a vigilância para que possamos nos tornar silenciosos e serenos. Em vez disso, ficamos em silêncio para que possamos conhecer a verdade desagradável sobre nós mesmos, e para que 'ouçamos' o Tao / Logos falando diretamente ao nosso ser interior. Ele não fala com uma voz audível; Sua voz não faz nenhum barulho mesmo na mente... a escritura chama Sua voz mansa e delicada. Não podemos ouvir, a menos que sintonizemos, separando de todo o ruído estático em nossas cabeças ".
Após essas palavras, o Pe. Damasceno então descreve o ensinamento Ortodoxo em relação à Oração de Jesus.

Na tradição Ortodoxa da Oração de Jesus, a prática da Oração não pode ser separada da vida sacramental e ascética Ortodoxa. Uma vez que as práticas de meditação não-cristãs, como aquelas seguidas por budistas, hindus e muitos cristãos não-Ortodoxos (na tradição de Thomas Keating, Thomas Merton, John Main, etc.) são principalmente técnicas psico-somáticas que levam a experiência da natureza criada de si mesmo, essas técnicas podem ser facilmente praticadas por pessoas diferentes, independentemente da sua religião, e todos os que praticam essas técnicas chegam a uma experiência similar. Na Igreja Ortodoxa, no entanto, a salvação do homem, a theosis e todo o seu desenvolvimento espiritual começa com a recepção do Espírito Santo através do batismo e crisma na Igreja Ortodoxa. Ao entrar e permanecer na Igreja Ortodoxa, o homem começa a receber e ser deificado pelas Energias Incriadas de Deus enquanto cresce em humildade, virtude e arrependimento na medida em que recebe regularmente a graça deificante através dos sacramentos da Igreja Ortodoxa.

Confissão, arrependimento, humildade e autocontrole proporcionam o terreno fértil para que as sementes da Oração de Jesus cresçam e deem frutos; fornece também as folhas protetoras que guardam e preservam a fruta da doença e do calor abrasador do orgulho e da delusão. Para uma árvore dar frutos, no entanto, não é suficiente ter um bom solo e folhas para proteção, mas é necessário também a luz solar para o crescimento e a vitalidade. Do mesmo modo, junto com a confissão, arrependimento, humildade e autocontrole, o homem precisa dos raios divinos da graça incriada dos sacramentos da Igreja Ortodoxa.

[...]

Houve muitos Católicos de Rito Oriental que tentaram progredir na Oração de Jesus, mas que eventualmente perceberam que não poderiam fazer muito progresso até que se converteram à Ortodoxia. Já comentei sobre o fato de que na Igreja Ortodoxa o desenvolvimento espiritual do homem e a theosis começam com o batismo e a crisma na Igreja Ortodoxa. Como tenho certeza que você sabe, a Igreja Ortodoxa não considera os batismos ou outros sacramentos realizados fora da Igreja Ortodoxa como sacramentos verdadeiros e plenos-de-graça. As Energias Incriadas de Deus operam através dos sacramentos da Igreja, mas quando um sacerdote ou bispo entra em cisma e é desligado completamente do corpo de Cristo, os sacramentos realizados deixam de ser eficazes e plenos-de-graça. Esta realidade explica como tantos abusos ocorreram no Catolicismo Romano uma vez que se separaram da Igreja, assim como explica o caos do Protestantismo e a ausência em ambos os grupos de santos que têm a mesma estatura e cosmovisão (phronema) dos santos dos primeiros séculos. [...]

Em relação àqueles que se converteram à Ortodoxia vindo Catolicismo de Rito Oriental e sua afirmação de que alguns Ortodoxos se converteram ao Catolicismo de Rito Oriental, penso particularmente em pessoas como Hieromonge Gabriel (Bunge) e o Hieromonge Placide (Deseille) que eram estudiosos patrísticos e viveram décadas como monges no Rito Oriental sob o Papa antes de chegar à conclusão de que eles estavam em um beco sem saída que só poderia ser resolvido entrando na Igreja Ortodoxa. Você tem essas pessoas, que viveram durante décadas como monges Ortodoxos e eram conhecidos como estudiosos patrísticos, que chegaram à conclusão de que estavam em um beco sem saída na Ortodoxia e fugiram para o Papa?

Sobre a questão de julgar o progresso dos outros, meu único ponto é que eu ouvi vários relatos daqueles que procuraram praticar a Oração de Jesus de forma séria no Catolicismo Oriental e perceberam que era uma tentativa inútil e assim converteram-se para a Ortodoxia. Pe. Theophanes de Kapsokalyvia, por exemplo, disse depois de sua conversão que ele realmente não conseguia compreender a Oração de Jesus corretamente até sua conversão à Ortodoxia. Outros Católicos Romanos ou de Católicos de Rito Orientais de longa data falaram da grande graça que receberam depois de entrarem na Igreja Ortodoxa.

Dentro da Igreja Ortodoxa, temos muitos exemplos contemporâneos de hesicastas que se esforçaram dia e noite orando a Oração de Jesus e cujas vidas exemplificam as mesmas qualidades espirituais que os Pais do Deserto de antigamente. Nunca ouvi falar de algum hesicasta contemporâneo do Catolicismo de Rito Oriental cuja vida era do mesmo caráter espiritual que nossos santos e anciãos Ortodoxos contemporâneos. Nunca vi um livro sobre a Oração de Jesus por um hesicasta contemporâneo do Catolicismo de Rito Oriental. Eu suponho que, se um Católico de Rito Oriental quisesse seriamente aprender a orar a Oração de Jesus, ele iria encontrar pouco apoio dentro do Catolicismo de Rito Oriental e precisaria recorrer aos livros e conselhos dos santos e anciões Ortodoxos que não consideram o Rito Oriental Católico como parte da Igreja e não possuem comunhão com os Católicos de Rito Oriental. Claro, se eu estiver errado nisso, sinta-se livre para contestar esses pontos. 

Antes de eu ser Ortodoxo, os beneditinos que tentavam recuperar práticas de "oração contemplativa" sempre foram rápidos em apontar que tal tradição havia morrido no Catolicismo Romano após o Cisma (embora eles culpariam o escolasticismo ao invés do Cisma), mas que uma semelhante (para eles) tradição da Oração de Jesus permaneceu viva na tradição da Igreja Ortodoxa dos tempos apostólicos até hoje. Para aqueles que desejam aprender verdadeiramente este modo de oração, é necessário fazer parte desta tradição viva.


O texto é um depoimento-resposta encontrado no forum Orthodox.Christianity.net (link)




quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

Atitude Ortodoxa em relação aos Cristãos Não-ortodoxos (Pe. Seraphim Rose)

Alguns anos antes de falecer, Pe. Seraphim recebeu uma carta de uma mulher afro-americana que, como catecúmena aprendendo sobre a Ortodoxia, estava lutando para entender a atitude pouco caridosa que alguns Cristãos Ortodoxos mostravam àqueles que estavam fora da Igreja, uma atitude que lhe lembrava de como seu próprio povo tinha sido tratado. "Estou bastante preocupada", esta mulher escreveu, "sobre a forma de como a Ortodoxia vê os Cristãos Ocidentais, isto é, Protestantes e Católicos Romanos. Eu li muitos artigos de muitos escritores Ortodoxos, e alguns usam palavras como "papistas", etc. que eu acho profundamente preocupante e bastante ofensivas. Eu acho ofensiva porque, como uma pessoa de uma raça que já foi submetida a muitos insultos, eu desprezo e não desejo adotar o hábito de xingar. Até mesmo o termo "herético" me perturba...

"Como fico com meus amigos e parentes? Eles não sabem sobre a Ortodoxia e eles não entendem isso. No entanto, eles acreditam e louvam Cristo... Devo tratar meus amigos e parentes como se eles não tivessem Deus, sem Cristo? Ou devo chamá-los de Cristãos, mas que não conhecem a verdadeira Igreja?

"Quando fiz essa pergunta, não posso deixar de pensar em São Inocêncio do Alasca quando visitou os mosteiros franciscanos na Califórnia. Ele permaneceu completamente ortodoxo, mesmo tratando os padres que encontrou lá com bondade, caridade e não com xingamentos. Isso, espero, é o que a Ortodoxia diz sobre como se deve tratar os outros Cristãos."

O dilema dessa mulher era bastante comum às pessoas que entram na Fé Ortodoxa. Aproximando-se do fim de sua curta vida e tendo abandonado sua amargura juvenil, Pe. Serafim respondeu o seguinte:
Fiquei feliz em receber sua carta - feliz, não porque você está confusa sobre a questão que lhe incomoda, mas porque sua atitude revela que na verdade da Ortodoxia pela qual você é atraída, você deseja encontrar uma espaço para uma atitude amorosa e compassiva para aqueles que estão fora da Fé Ortodoxa.

Eu acredito firmemente que realmente é isto o que a ortodoxia ensina ...

Explicarei brevemente o que acredito ser a atitude ortodoxa em relação aos cristãos não-ortodoxos.

1. A Ortodoxia é a Igreja fundada por Cristo para a salvação da humanidade e, portanto, devemos guardar com a nossa vida a pureza de sua doutrina e a nossa fidelidade a ela. Na Igreja Ortodoxa, apenas, a graça é dada através dos sacramentos (a maioria das outras igrejas nem sequer afirmam ter sacramentos em qualquer sentido sério). Só a Igreja Ortodoxa é o Corpo de Cristo, e se a salvação é suficientemente difícil dentro da Igreja Ortodoxa, quanto mais difícil deve ser fora da Igreja!

 2. No entanto, não cabe a nós definir o estado daqueles que estão fora da Igreja Ortodoxa. Se Deus deseja conceder a salvação a alguns que são cristãos na melhor maneira que eles conhecem, mas sem nunca conhecer a Igreja Ortodoxa - isso depende dEle, não de nós. Mas quando Ele faz isso, é algo que está fora do caminho normal que Ele estabeleceu para a salvação - que está na Igreja, como parte do Corpo de Cristo. Eu mesmo posso aceitar a experiência dos protestantes como "nascidos de novo" em Cristo; conheci pessoas que mudaram suas vidas inteiramente por meio do encontro com Cristo, e eu não posso negar sua experiência apenas porque elas não são ortodoxas. Eu chamo essas pessoas de cristãos "subjetivos" ou "iniciantes". Mas, enquanto não estiverem unidos à Igreja Ortodoxa, não podem ter a plenitude do cristianismo, não podem ser objetivamente cristãos como pertencentes ao Corpo de Cristo e receber a graça dos sacramentos. Penso que é por isso que existem tantas seitas entre eles - eles começam a vida cristã com uma genuína conversão a Cristo, mas não podem continuar a vida cristã de maneira correta até que estejam unidos à Igreja Ortodoxa e, portanto, eles substituem suas próprias opiniões e experiências subjetivas pelos ensinamentos e sacramentos da Igreja.

Sobre aqueles cristãos que estão fora da Igreja Ortodoxa, portanto, eu diria: eles ainda não têm toda a verdade - talvez ainda não tenha sido revelada a eles, ou talvez seja nossa culpa por não viver e ensinar a Fé Ortodoxa em uma maneira que eles possam entender. Com tais pessoas não podemos ser um na Fé, mas não há razão para que os consideremos totalmente estranhos ou iguais aos pagãos (embora também não devemos ser hostis aos pagãos - eles também não viram a verdade!). É verdade que muitos dos hinos não-ortodoxos contêm um ensinamento ou pelo menos alguma ênfase que é errado - especialmente a ideia de que quando alguém é "salvo", não é necessário fazer nada mais porque Cristo fez tudo. Essa ideia impede que as pessoas vejam a verdade da Ortodoxia, que enfatiza a idéia de lutar pela salvação mesmo depois de Cristo nos ter dado, como diz São Paulo: "Trabalhai vossa salvação com temor e tremor". [Filip. 2:12]. Mas quase todos os cânticos religiosos de Natal estão corretos, e eles são cantados por cristãos ortodoxos na América (alguns deles mesmo nos monastérios mais rigorosos!).
A palavra "herege" (como dizemos em nosso artigo sobre Pe. Dimitry Dudko) é, de fato, utilizada com muita frequência hoje em dia. Ela tem um significado e uma função definida para distinguir os novos ensinamentos do ensinamento Ortodoxo; mas poucos dos cristãos não-ortodoxos hoje são conscientemente "hereges", e realmente não faz bem chamá-los assim.

No final, acho que a atitude do Pe. Dimitry Dudko é a correta: devemos ver as pessoas não-ortodoxas como pessoas a quem a Ortodoxia ainda não foi revelada, como pessoas que são potencialmente ortodoxas (se pelo menos nós mesmos lhes déssemos um melhor exemplo!). Não há razão para que não possamos chamá-los cristãos e estar em bons termos com eles, reconhecer que temos pelo menos nossa fé em Cristo em comum, e vivermos em paz especialmente com nossas famílias. A atitude de São Inocêncio aos católicos romanos na Califórnia é um bom exemplo para nós. Uma atitude severa e polêmica é exigida apenas quando os não-ortodoxos estão tentando afastar nosso rebanho ou mudar nosso ensino...

Quanto aos preconceitos - estes pertencem às pessoas, não à Igreja. A ortodoxia não exige que você aceite quaisquer preconceitos ou opiniões sobre outras raças, nações, etc.

Do livro Father Seraphim Rose: His Life and pelo Hieromonge Damasceno