quarta-feira, 17 de junho de 2020

Uso de Falsificações pela Igreja de Roma

Esta compilação de referências e citações a partir de fontes confiáveis e autoritativas mostra que os mais altos representantes da Igreja Católica utilizaram documentos falsos para promover suas agendas. A aprovação monumental concedida à falsidade dentro da Igreja Católica Romana é um sinal de que o Catolicismo Romano não foi instituído por Deus.

É muito significativo que as maiores controvérsias entre os latinos e os gregos não se devam a alguma suposta rebelião dos gregos, mas quando os latinos ambiciosos começam a usar documentos falsos para justificar novas pretensões ao poder, como a pretensa jurisdição universal do Bispo de Roma. É importante ressaltar que os dois Papas mais desobedientes foram o Papa Nicolau I (858 -867) e o Papa Leão IX (1049 -1054), e é digno de nota que um aumento considerável na circulação de documentos falsos ocorreu durante seus notórios episcopados.  Muitas vezes ao longo das interações Católicas Romanas com os Ortodoxos na história, e até hoje, os Católicos Romanos têm recorrido a citações incorretas dos Padres dos primeiros séculos e Concílios, o que mostra que seu sistema não é idêntico àquele proposto por aquelas antigas autoridades.

Embora a maioria desses documentos falsos tivessem sido desmascarados entre a Renascença e o século XVIII, e não mais reconhecidos como autênticos pelos latinos, essas falsificações tiveram um impacto significativo no crescimento do poder papal durante a Idade Média, e foram consideradas autênticas por muitas centenas de anos.  Até mesmo hoje, ainda é comum encontrarmos apologistas Romanos citando falsificações, obras reconhecidamente espúrias, documentos interpolados e escritos de autenticidade questionável em defesa do Papado e das doutrinas latinas.  Tudo isso, além de más traduções, citações incompletas, e outras frequentes citações incorretas e deturpações pelos Católicos Romanos.

É também um problema quando os Católicos Romanos citam documentos que se encontram preservados apenas na tradução latina, como algumas cartas de Padres Gregos que escreveram originalmente em grego, mas os únicos manuscritos disponíveis estão em latim.  Isso é um problema porque há muitos exemplos de documentos em que temos tanto o grego original quanto a tradução latina, e quando comparamos os dois, notamos diferenças consideráveis entre as duas versões, sendo a tradução latina interpolada ainda muito cedo com declarações como "A Igreja Romana sempre teve a Primazia" (uma interpolação feita por Roma no 6º Cânone do Concílio de Nicéia realizado em 325 d.C., como exposto na Sessão 16 do Concílio de Calcedônia em 451 d.C., o que coloca em dúvida Roma enquanto fiel conservador de documentos antigos - veja a seção abaixo sobre o 28º Cânone de Calcedônia), juntamente com muitas outras corrupções de textos originais. Vários exemplos do atual uso Católico Romano de falsificações abundam em bibliotecas do mundo todo, na Internet e em obras de apologistas de Roma, mas nos ocuparemos com a questão de como os membros históricos da Igreja Católica Romana têm feito uso dessas falsificações, e o impacto dessas fabricações.

Para ser justo, deve-se observar que encontramos muitos casos de autores Ortodoxos que não têm sido precisos no uso de suas fontes, mas isso é em um grau muito menor, e não resultou em nenhuma doutrina nova. Além disso, essa investigação não nos interessará aqui, pois este trabalho foca nos erros dos latinos.

"A história sempre foi o ponto fraco dos [Católicos Romanos] ... e Roma, ao falsificá-la, selou a sua própria condenação". (Joseph Overbeck, 1881, A Plain View of the Claims of the Orthodox Catholic Church as Opposed to All Other Christian denominations, p. 64)

"Além da modificação, ou melhor, da corrupção de [de textos] de tantos Padres, que eram monumentos genuínos da antiguidade, a adulteração em tantos falsos, e a intrusão de tantos autores espúrios no mundo, é uma clara evidência da carência da verdadeira antiguidade. ... Assim, as epístolas decretais foram falsificadas para sustentar o poder espiritual do papa, e a doação de Constantino para estabelecer o seu temporal." (Dr. Payne, Notes of the Church, pp. 163, 164)

"Sua opressão tirânica e as extorsões da Igreja Romana são a causa de nossa desunião". - Patriarca grego Germanus aos Cardeais Latinos, 1232 d.C.

"O teu poder plenário sobre os teus súditos nós acreditamos firmemente; o teu imensurável orgulho nós não podemos tolerar, e a tua ganância nós não podemos satisfazer.  Contigo está Satanás, conosco o Senhor." - Resposta dos gregos ao Papa João XXII

O professor Católico Romano Pe. James Francis Loughlin (1851 -1911) afirma: "Os Bispos de Roma sempre se distinguiram pela atenção escrupulosa à genuinidade de seus documentos". (James F. Loughlin, The Sixth Nicene Canon and the Papacy, The American Catholic Quarterly Review, Vol. V., janeiro a outubro de 1880, p. 235, Philadelphia, PA: Hardy & Mahony, 1880).

Uma Nota Introdutória presente na Série Padres Pré-Nicenos

A nota introdutória às Decretais de Pseudo-Isidoro na série Padres Pré-Nicenos diz o seguinte:

Os doutos editores da série Edimburgo nos deram apenas um exemplar dessas falsificações, que, fingindo ser uma série de "éditos papais" de Clemente e seus sucessores durante a era pre-Nicena, são, na verdade, um produto manufaturado do século IX, - a farsa mais impressionante na história do mundo, a mais bem sucedida e a mais obstinada em seu domínio sobre as nações esclarecidas. Como a estrutura de ripas e peças de madeira do pedreiro, sobre os quais ele forma um arco de pedra maciça, as Decretais serviram ao seu propósito, permitindo a Nicolau I fundar o Papado com sua aparente insignificante ajuda.  Uma vez levantado aquele arco inchado de vaidade, a estrutura poderia ser derrubada; mas o material ficou de pé, e suportou todo o peso que lhe foi imposto durante séculos. Seus pilares fortes têm sido a ignorância e o despotismo. Nicolau produziu sua frágil estrutura de impostura, e surpreendeu toda a Igreja com a audácia das pretensões que fundamentou sobre ela. A época, porém, era iletrada e acrítica; e, apesar dos protestos vindos da França sob a liderança de Hincmar, bispo de Rheims, o Ocidente submeteu-se pacientemente à subversão dos antigos cânones e das Constituições de Nicéia, e curvou-se ao jugo de uma nova lei canônica, da qual essas fraudes não só se tornaram uma parte integrante, como também a essencial.  O Oriente nunca os aceitou nem por um momento: seus grandes patriarcas mantêm o Sistema Niceno até os dias de hoje. Mas, como a religião estabelecida do "Sacro Império Romano", as igrejas nacionais da Europa Ocidental, uma a uma, sucumbiram a essa revolta diante da catolicidade histórica. As igrejas orientais eram mais numerosas. Elas se mantiveram fiéis às Constituições confirmadas por todos os Sínodos Ecumênicos; não alteraram qualquer palavra do Credo Niceno; defenderam a grande lei católica: "Que prevaleçam os costumes antigos"; e foram, e são até hoje, o grande tronco histórico da cristandade. O Papado criou o cisma ocidental, e procurou chamá-lo de "o cisma dos gregos". As Decretais tinham criado o Papado, e permitiram ao primeiro Papa considerar que a comunhão consigo mesmo era o teste da comunhão católica: daí sua excomunhão dos Orientais, que, após breves intervalos de relaxamento, se consolidou no cisma crônico do Papado, e produziu a terrível história da Igreja medieval na Europa Ocidental.

Ao nomear Nicolau I como o fundador do Papado, e o primeiro Papa, eu apenas sigo a consequência lógica de fatos admitidos e verdades demonstradas. Eu meramente aplico os princípios reconhecidos do pensamento moderno e da lei científica à ciência da história, e dispenso a técnica do empirismo nesta ciência, pois nossa época aboliu empirismos semelhantes nas ciências exatas. Durante séculos depois de Copérnico, mesmo aqueles que se deleitaram na luz do verdadeiro sistema do universo continuaram nas velhas rotinas, falando como se a teoria ptolemaica ainda fosse uma realidade: e assim os próprios historiadores cujas páginas lúcidas explodem todo o tecido da comunhão papal, continuam, na linguagem da fábula, dando aos primeiros bispos de Roma o título de "Papas"; contando São Pedro como o primeiro Papa; desorientando o estudioso com muitas confusões de fatos com fábulas; e concedendo ao tecido moderno do Romanismo o nome de "Igreja Católica", com todas as imensas vantagens que se acumulam à falsidade por tal abandono da verdade, e a consequente dotação da fraude com as vestes e o domínio da Antiguidade Apostólica.

O estudioso desta série deve ter notado os seguintes fatos fundamentais:
1. Que o nome papa era comum a todos os bispos, e não significava preeminência naqueles que o utilizavam.

2. Que as Sés Apostólicas eram todas igualmente consideradas matrizes de unidade, e as raízes de outras igrejas católicas.

3. Que, até o Concílio de Nicéia, todo o sistema da Igreja era estruturado sobre este princípio, e que estes eram os "costumes antigos" que aquele Concílio ordenou que fossem perpétuos.

4. Que "porque era a antiga capital do império", e por nenhuma outra razão (a idéia petrina nenhuma vez é mencionada), a primazia de honra foi concedida à Velha Roma, e igual honra à Nova Roma, porque era a nova capital.[1] [Constantinopla] deveria ser designada em segundo lugar na lista dos patriarcados, mas não ser de forma alguma inferior à Velha Roma; ao passo que o antigo e poderoso patriarcado de Alexandria cedeu esse mérito ao parvenu de Bizâncio com base apenas no princípio do Evangelho, "preferindo-vos em honra uns aos outros", e apenas porque o capital imperial deve ser o centro do concurso católico.
Agora, o resto da história deve ser buscado na história pós-Nicena. Os pontos relevantes são os seguintes:
1. A poderosa centralização acerca de Constantinopla; os três concílios realizados dentro de seus muros; a reunião dos outros concílios em seus arredores; a figura inconsiderável da "Velha Roma" na história estritamente eclesiástica; sua esterilidade de literatura, e de grandes filhos heróicos, como Atanásio e Crisóstomo no Oriente, e Cipriano e Agostinho no Ocidente; e sua decadência como capital, -  levou Leão I, e outros depois dele, a se concentrarem muito em "São Pedro", e a favorecerem novas idéias de sua grandeza pessoal, e de uma grandeza transmitida como herança de seus sucessores.  Até então, essas eram apenas "palavras de vaidosa arrogância"; mas elas levaram à fraude formulada das Decretais.

2. Ambição uma vez entrando na fronteira da Catolicidade, encontramos uma idéia contrária à dos concílios na raiz da primeira usurpação de dignidade não-escritural. João "o Jejuador", bispo da Nova Roma, concebeu-se não apenas igual (como os concílios haviam decretado) ao bispo da Velha Roma, mas seu superior, em vista da decrepitude deste última, e sua ocupação pelos godos, enquanto a dignidade imperial de Constantinopla estava agora amadurecida. Ele se intitulou "Bispo Ecumênico".

3. Gregório era então bispo da "Velha Roma", e esse era o momento de afirmar o princípio das Decretais, se tal idéia alguma vez tivesse existido na época. Como ele enfrentou a arrogância de seu irmão? Não apelando para as Decretais, não afirmando que essa era a sua própria dignidade derivada de São Pedro, mas protestando contra tal rebaixamento de todos os outros patriarcas e de todos os outros bispos (que eram todos iguais), e pronunciando que a assunção ímpia de um título tão nefasto significaria um "precursor do Anticristo". Claramente, então, não havia um "Papa" conhecido pela cristandade no final do século VI.

4. Mas pouco tempo Gregório estava em seu túmulo quando a política da corte levou o imperador Phocas (um dos mais infames dos homens) a saciar a perversa ambição do novo bispo de Roma, concedendo-lhe a honra titular de ser um "precursor do Anticristo". Bonifácio III (607 d.C.) assumiu o audacioso título de "Bispo Universal". Mas era um mero título de corte: a Igreja nunca o reconheceu; e por isso, o título passou para seus sucessores como mero "bronze que soa, ou como o címbalo que retine" até os dias de Carlos Magno.

5. Em seu tempo, a fábula petrina havia crescido na mente ocidental. Toda a Europa Ocidental tinha apenas uma Sé Apostólica. Como "a Sé Apostólica" ela era conhecida em todo o Ocidente, assim como "o Posto de Correios" significa aquele que está mais próximo da nossa própria morada. O que era geograficamente verdadeiro, porém, tinha se tornado teologicamente falso; e o Bispo de Roma começou a considerar-se o único herdeiro da precedência apostólica, se não de toda autoridade e poder apostólico.

6. A formação do Império Ocidental favoreceu essa idéia: mas ela não tomou forma definitiva enquanto Carlos Magno vivia, pois ele se considerava, como Constantino, a "cabeça da Igreja"; e em sua época ele atuou como supremo pontífice, convocou o Concílio de Frankfurt, ignorou o bispo romano e, em suma, foi um Papa-leigo em todo o seu império. Que ninguém recusou a ele tudo o que ele reivindicou, que Adriano "se deitou como um jumento forte" sob o peso das reprimendas dele, e que Leão lhe prestou "homenagem" corporal, demonstram que ainda não existia nenhum personagem como um "Papa". Leão III havia "adorado" pessoalmente Carlos Magno com a homenagem que depois prestou aos pontífices, e Adriano havia dado a ele o exemplo de submissão pessoal.

7. Mas, tendo os filhos e sucessores frágeis de Carlos Magno se mostrado incapazes de exercer seu poder, o Ocidente apenas esperava um gênio ambicioso e original vir à Sé de Roma, para entregar-lhe tudo o que Carlos Magno tinha reivindicado, e para investi-lo com o caráter mais sagrado da cabeça apostólica para toda a Igreja.

8. Tal personalidade surgiu em Nicolau I. Ele encontrou as Decretais feitas à sua mão por algum impostor, e viu uma era iletrada, pronta para aceitar suas pretensões. Ele as usou, portanto, e as introduziu na lei canônica orgânica do Ocidente. O "Santo Império Romano" recebeu com relutância as fraudes impiedosas; o Oriente resistiu com desdém. Assim o Papado foi formado com base no "Santo Império Romano", e se arrogou o direito de cortar e anatematizar a maior parte da cristandade, com as antigas Sés patriarcais. Assim, temos em Nicolau a primeira figura da história em cuja pessoa se concentra o que Roma quer dizer com o Papado. Nenhum "Papa" existiu antes, no sentido de sua lei canônica; e não foi antes de dois séculos a mais que até um "Papa" presumiu pronunciar esse título peculiar ao Bispo de Roma.
Tais, portanto, são os fatos históricos, que tornam muito importante algum estudo sobre as Decretais. O que se segue é exclusivamente de fontes "Católico-Romanas". Diz o douto Dupin:
1. Todas essas Decretais eram desconhecidas por todos os antigos Padres, por todos os Papas e por todos os autores eclesiásticos que escreveram antes do século IX. Ora, que homem racional pode acreditar que tão vasto número de cartas, compostas por tantos Papas santos, contendo tantos pontos importantes em relação à disciplina da Igreja, poderia ser desconhecido para Eusébio, para São Jerônimo, para Santo Agostinho, para São Basílio e, em suma, para todos os autores que falaram de seus escritos, ou que escreveram sobre a disciplina da Igreja? Poderia acontecer que os Papas, a quem estas epístolas são tão favoráveis, nunca teriam citado e alegado elas para engrandecer a sua própria reputação?  Quem poderia imaginar que as decisões dessas Decretais nunca seriam sequer citadas em qualquer concílio ou em qualquer cânone? Aquele que refletir seriamente consigo mesmo, que, desde que essas Decretais foram impostas ao mundo, elas foram citadas em um número infinito de lugares pelos Papas, pelos concílios e, como frequentemente, pelos canonistas, prontamente ficará convencido de que elas teriam adquirido imenso crédito, e que teriam sido muitas vezes citadas pela antiguidade, se elas fossem genuínas e verdadeiras.
Devo aqui chamar a atenção para o fato importantíssimo de que, qualquer que tenha sido o autor dessas falsificações, os pontífices romanos e a comunhão "Católica Romana" como tal, se envolveram repetidas vezes com a fraude, como Dupin observa acima, e isso, muito depois que a fraude foi demonstrada e exposta; como prova disso cito o seguinte, de alguém cujos olhos foram abertos pela sua paciente investigação de tais fatos, mas que, ainda membro da comunhão Romana, escreveu ao seu co-religioso Cardeal Manning o seguinte:  
É credível que o Papado teria recorrido com tanta frequência a essas falsificações em favor de suas reivindicações extensas, se ele tivesse melhores autoridades - autoridades diferenciadas - às quais recorrer? Todos os disputantes do lado latino encontram nessas falsificações um argumento convincente contra os gregos. "Para provar isso", a jurisdição universal do Papa, disse o Abade Barlaão, ele próprio oriundo da Igreja Grega, convertido através delas, a fim de converter seus compatriotas, "basta examinar as epístolas decretais dos pontífices romanos de São Clemente a São Silvestre".  Na vigésima quinta sessão do Concílio de Florença, o provincial dos dominicanos é ordenado a se dirigir aos gregos sobre os direitos do Papa, estando o Papa presente. Por duas vezes ele argumenta a partir da pseudo-decretal de Santo Anacleto, em outro momento a partir de uma carta sinodal de Santo Atanásio para Félix, em outro momento a partir de uma carta de Júlio aos Orientais, todas elas falsificações. Depois, em resposta a objeções recebidas por Bessarion, na conferência, quanto à autoridade delas, independentemente de qualquer questão da autenticidade das mesmas, sua posição em outro discurso é, "que essas epístolas decretais dos Papas, sendo epístolas sinodais em cada caso, possuem a mesma autoridade que os próprios Cânones." Podemos precisar de mais provas do peso que é atribuído a elas no lado latino?

Os papas apelaram a elas em sua capacidade oficial, bem como enquanto doutores particulares; (1) Leão IX, por exemplo, apelou à pseudo-doação na epístola prolixa escrita por ele, ou em seu nome, a Miguel Cerulário, patriarca de Constantinopla, na véspera do cisma. (2) Eugênio IV apelou às pseudo-Decretais de São Alexandre e Júlio, durante as negociações para cura da mesmo, em suas instruções aos armênios. (3) Mas por que, meu senhor, preciso ir mais longe para obter provas, quando no Catecismo do Concílio de Trento, que é há três séculos o próprio instrutor credenciado do clero, recomendado com autoridade por tantos papas, apesar do real valor dessas miseráveis fraudes ter existido por três séculos perante o mundo, encontro estas palavras: 'Sobre a primazia do Sumo Pontífice, veja a terceira epístola (ou seja, a pseudo-decretal) de Anacleto'! Tal é, na realidade, a autoridade a que o clero de nossos dias são encaminhados, em primeiro lugar, para uma posição sólida e verdadeira sobre a primazia. (4) Depois, quando tiverem dominado o que ali se diz, poderão recorrer a mais três autoridades, todas igualmente retiradas do Graciano, as quais não deixarão de interpretar de acordo com as idéias que já assimilaram. Também não posso deixar de chamar a atenção para um caso muito mais flagrante. A respeito do sacramento da confirmação, muitas questões haviam sido levantadas pelos Reformadores, elaboradas para fazer as pessoas pensarem, e ansiosas por conhecer a verdade estrita a respeito dele. Sobre isso, o Catecismo procede da seguinte forma:

"Como já foi demonstrado o quanto seria necessário ensinar em geral, com respeito a todos os sacramentos, por quem eles foram instituídos, portanto, há necessidade de instrução semelhante com respeito à confirmação, para que os fiéis possam ser mais atraídos pela santidade deste sacramento. Os pastores devem, portanto, explicar que não só Cristo Nosso Senhor foi o autor do mesmo, mas que, conforme atesta o Romano pontífice São Fabiano (ou seja, a pseudo-decretal a ele atribuída), Ele instituiu o rito do crisma, e as palavras usadas pela Igreja Católica na sua administração."
Estranho fenômeno, de fato, que as afirmações de tais autoridades ainda sejam ordenadas para serem ensinadas como evangelho em nossos púlpitos atualmente, quando todos que conhecem os mais básicos rudimentos da história eclesiástica sabem o quanto são, na realidade, absolutamente inautênticas, e como inquestionavelmente as autoridades citadas para prová-las são falsificações.

Absolutamente, meu senhor, com tais evidências diante de mim, sou incapaz de resistir à conclusão de que a veracidade não é uma das características mais fortes do ensinamento mesmo da Igreja moderna de Roma; pois não é este um caso palpável onde suas mais elevadas autoridades vivas são tanto indiferentes a ter possíveis inverdades pregadas a partir do púlpito, como algo mais do que indiferente ao ter falsificações, após sua descoberta como tal, proferidas a partir do púlpito para autenticar fatos?

Isso, mais uma vez, me lembra bastante uma conversa que tive com o excelente sacerdote francês que me recebeu na Igreja Católica Romana, algum tempo depois daquele evento. Eu, como anglicano, tinha perguntado muito diligentemente sobre a genuinidade da Santa Casa: e tendo visitado Nazaré e Loretto desde então, e mergulhado de novo na questão em cada lugar, voltei mais profundamente convencido do que nunca do seu caráter totalmente fictício, apesar dos privilégios que lhe foram concedidos por tantos papas. Ao declarar-lhe minhas convicções, sua única resposta foi: 'Há muitas coisas no Breviário nas quais eu mesmo não acredito'. Oh! as pedras de tropeço de um sistema no qual as falsificações têm sido tão amplamente utilizadas, no qual ainda se pensa ser possível que o clero derivem edificações a partir de lendas em que eles não conseguem acreditar, e a instrução do povo a partir de obras de reconhecida fraude!
Mais adiante Dupin comenta:
O primeiro homem que as publicou, se é que podemos acreditar em Hincmar, foi um tal Riculphus, bispo de Mentz, que morreu por volta do século IX. Acredita-se comumente, visto que a coleção leva o nome de Isidoro, que ele as trouxe da Espanha. Mas ela nunca poderia ter sido criada pelo grande arcebispo de Sevilha; e há grandes razões para acreditar que nenhum espanhol, mas sim algum alemão ou francês, começou essa fraude.

Da mesma forma, parece provável que alguns desses Decretais tenham sido impostos desde a época de Riculphus. Bento, diácono da igreja de Mentz, que fez uma coleção de cânones para os sucessores de Riculphus, pode ter colocado a última mão nessa coleção de Decretais falsos atribuídos a um Isidoro, uma pessoa distinta do famoso bispo de Sevilha, e de sobrenome Peccator, ou Mercator. Por volta de sua época um certo Isidoro veio da Espanha, junto com alguns comerciantes, e depois se retirou para Mentz. Não improvavelmente, portanto, o nome desse homem foi dado à coleção, e naturalmente acreditou-se que ela foi trazida da Espanha.
E como essas cartas apareceram pela primeira vez numa era obscura e iletrada, qual a surpresa de que tenham sido recebidas com muito pouca oposição? E mesmo assim o Arcebispo Hincmar de Rheims, juntamente com outros bispos franceses, tiveram grande dificuldade em aceitá-las, mesmo naquela época. logo depois, porém, elas adquiriram alguma autoridade, devido ao apoio dado à corte de Roma, cujas pretensões elas favoreciam poderosamente.
Sobre a fraude similar da "Doação de Constantino", talvez seja bom citar a mesma autoridade erudita. Mas isto deve ser encontrado em outro lugar [Elucidação II].

Permitam-me agora voltar ao mesmo erudito galicano sincero, Dupin, que observa o seguinte:
2. A fraude dessas cartas é incontestavelmente provada a partir disso: porque são compostas de um conjunto de passagens retiradas dos Padres, Concílios, epístolas papais e ordenanças imperiais, que apareceram depois do terceiro século, até meados do nono. 

3. As citações das Escrituras em todas essas cartas seguem a Vulgata de São Jerônimo, o que demonstra que elas datam desde sua época (420 d.C.), e consequentemente não procedem de Papas que viveram muito antes de São Jerônimo.
4. A matéria destas cartas não está de modo algum de acordo com os tempos em que viviam aqueles a quem são atribuídas.

5. Estas Decretais estão cheias de anacronismos.  Os consulados e os nomes dos cônsules mencionados nas mesmas são confusos e fora de ordem; e, além disso, as verdadeiras datas dos próprios escritores, como Bispos de Roma, não concordam com as indicadas nestas cartas.
6. O estilo delas é extremamente bárbaro, cheio de solecismos; e nelas encontramos com frequência certas palavras nunca usadas antes dos últimos tempos. Além disso, todas elas são de um só estilo! Como é possível que tantos Papas diferentes, vivendo em diferentes séculos, escrevam todos da mesma maneira?
Dupin passa então a examinar toda a coleção com conhecimento e sinceridade, mostrando que cada uma delas "carrega consigo sinais inequívocos de mentira e fraude". Que o estudioso recorra às suas páginas, portanto. Eu o acompanho na seguinte enumeração das fraudes que ele calmamente expõe com lógica de busca e demonstração: 
1. São Clemente a São Tiago, o Irmão do Senhor. - Claramente falsa.

2. A Segunda Epístola de Clemente para o Mesmo. - Igualmente falsa.

3. São Clemente a todos os Bispos sufragâneos, Sacerdotes, Diáconos e Outros do Clero: a todos os Príncipes Grandes e Pequenos e a todos os Fiéis.
Dupin observa: "Este próprio título já é suficiente para provar a fraude, pois, nos tempos de São Clemente, não havia "príncipes grandes ou pequenos" na Igreja". Ele acrescenta que se fala de "subdiáconos", uma ordem então não existente, e que ela é remendada a partir de restos das Recognições apócrifas.
4. Uma Quarta Carta do Mesmo. Ela se auto-refuta pelos "mesmos motivos".

5. A Quinta Carta de São Clemente, Bispo de Roma e Sucessor de São Pedro, a São Tiago.
"Mas", diz Dupin, "como São Tiago morreu antes de São Pedro, segue-se necessariamente que esta epístola não pode ter sido escrita por São Clemente". Mais ainda, "temos uma epístola genuína de São Clemente, cujo estilo é totalmente diferente daquela desses Decretais".
6. A Epístola de Anacleto.  - Bárbaro, cheia de solecismos e falsidades.

7. Uma Segunda Epístola de Anacleto. - Cheia de passagens de autores que viveram muito depois da época de Anacleto.

8. Uma Terceira Carta, etc. - Espúria pelas mesmas razões.

9. Uma Epístola de Evaristo. - Remendada a partir de escritos de Inocêncio do século V, datados sob cônsules não contemporâneos do alegado escritor.

10. Uma Segunda Epístola do Mesmo. - Repleta de remendos de séculos posteriores.

11. Uma Epístola de Alexandre. - Contém passagens de pelo menos um autor do século VIII.

12. Uma Segunda Epístola do Mesmo. - Refere ao Concílio de Laodicéia, que foi realizado (d.C. 365) após a morte de Alexandre.

13. Uma Terceira Epístola, etc. - Cita um autor do século V.

14. Uma Epístola de Xystus. - Datada sob um cônsul que viveu em outra época, e cita autores de séculos depois de sua própria época.

15. Uma segunda epístola do mesmo. -Sujeita às mesmas objeções, anacronismos. etc.

16. Uma Epístola do Telesforo. - Datas falsas, remendada a partir de autores posteriores, etc.

17. Uma Epístola de Hyginus. - Anacronismos, etc.

18. Uma segunda do mesmo. - Repleta de anacronismos, e datada falsamente por cônsules que não eram da sua época.

19. Uma Epístola de Pio I. - Cheia de absurdos, e cita "o Código de Teodósio"!

20. Um Segunda. - É dirigida a Justus, etc. Péssimo latim, e totalmente desconhecido para a antiguidade, embora Barônio tenha tentado defendê-la.

21. Uma Terceira Carta, etc. - Dirigida a Justus, bispo de Viena. Falsa pelas mesmas razões.

22. Uma Epístola de Anicetus. - Cheia de equívocos quanto a datas, etc. Menciona nomes, títulos, e afins, nunca ouvidos antes das épocas posteriores.

23. Uma Epístola de Soter. - Datada sob os cônsules que viveram antes de Soter ser bispo de Roma.

24. Uma Segunda Carta, etc. - Fala de "monges", "mantos" e outras coisas de épocas posteriores; é remendada a partir de escritos de épocas posteriores, e datada sob os cônsules que não eram seus contemporâneos.

25. Uma Epístola de Eleutherus.- Sujeita à objeções semelhantes.

26. Uma Segunda Carta, etc. - Anacronismos.

27. Uma Terceira Carta, etc. - Destinada a "Desidério, bispo de Viena". Não havia tal bispo até o século VI.

28. Uma Quarta Carta, etc. - Cita autores posteriores, e é desmentida pelo seu estilo.

29. Uma Epístola de Zefirino. - Pouca importância a ser atribuída a qualquer coisa proveniente de tal fonte; mas Dupin (que viveu antes da má índole de Zefirino vir à luz nos escritos de Hipólito) acusa-a de ignorância, e mostra que é um remendo de idéias e escritores posteriores.

30. Uma Segunda Carta. - "Ainda mais uma clara fraude", diz Dupin

31. Uma Epístola de São Calisto. - Que tipo de "santo" ele foi, nossos leitores já estão informados. Esta epístola é como as anteriores de Zefirino.

32. Uma Segunda Epístola, etc. - Citações de escritos do século VIII.

33. Uma Epístola de Urbano. - Cita a Vulgata, o o Código de Teodósio, e Gregório IV.

34. Uma Epístola de Pontiano. - Anacronismos.

35. Uma Segunda Epístola, etc. - Bárbaro e impossível.

36. Uma Epístola de Antero. - Igualmente impossível; cheia de anacronismos.

37. Uma Epístola de Fabiano. -  Contradiz os fatos da história que dizem respeito a Cipriano, Cornélio e Novatus.

38. Uma Segunda Epístola, etc. - Auto-refutada por seus monstruosos detalhes de erros e coisas do tipo.

39. Uma Terceira Epístola, etc. - Cita autores do século VI.

40. Uma Epístola de Cornélio, etc. - Contradiz fatos históricos, etc.

41. Uma Segunda Epístola, etc. - Igualmente cheia de equívocos. "Mas nada", diz Dupin, "mostra mais nitidamente a fraude dessas duas cartas do que a diferença de estilo em relação àquelas verdadeiramente atribuídas a Cornélio nas obras de Cipriano".

42. Uma Terceira Carta, etc. - Igualmente falsa evidentemente. Dupin, com sua habitual franqueza, comenta: "Encontramos nela a palavra 'Missa', que era desconhecida pelos contemporâneos de Cornélio".
43. Uma Epístola de Lúcio. - É datada de seis meses antes dele se tornar Bispo de Roma, e cita autores que viveram séculos depois de sua morte.

44. Uma Epístola de Estêvão. - "Cheia de citações de autores posteriores".

45. Uma Segunda Epístola, etc. - Sujeita a uma objeção semelhante; não se harmoniza com os tempos a que é referida.
Aqui Dupin vê-se cansado, e termina a sua crítica da seguinte forma:
Por razões semelhantes, devemos julgar, da mesma forma, as duas Epístolas de Sixtus II; as duas de Dionísio; as três de São Félix I; as duas de Eutychianus; uma de Caio; duas de Marcelino e as de Marcelo; as três de Eusébio; as de Miltiades e o restante da coleção de Isidoro: estão cheias de passagens de Padres, Papas e Concílios, mais recentes do que os próprios Papas a quem se pretende que tenham sido escritas.  Nelas há muitas coisas que chocam com a história conhecida daqueles tempos, e foram propositadamente elaboradas para favorecer a corte de Roma e para apoiar suas pretensões contra os direitos dos bispos e as liberdades das igrejas. Mas tomaria muito tempo para mostrar a falsidade grosseira desses monumentos. Elas são agora rejeitadas por consentimento comum, e mesmo por aqueles autores que são mais favoráveis à corte de Roma, que são obrigados a abandonar o favorecimento dessas epístolas, embora elas tenham prestado um grande serviço no desenvolvimento da grandeza da corte de Roma, e arruinado a antiga disciplina da Igreja, especialmente com referência aos direitos dos bispos e às decisões eclesiásticas.
O que segue é o Prefácio do Tradutor a essas fraudes:
A respeito desses Decretais, Dean Milman diz: "Até esse período as Decretais, as cartas ou éditos dos Bispos de Roma, segundo a coleção autorizada ou comum de Dionsísio, começaram com o Papa Siricius, por volta do final do século IV. À coleção de Dionísio foi acrescentada aquela dos Concílios autênticos, que levavam o nome de Isidoro de Sevilha.  De repente, foi promulgado, inesperadamente, sem preparo, não absolutamente incontestado, mas aparentemente desconsiderando de imediato toda dúvida, um novo código, que aos antigos documentos autênticos foram acrescentados cinquenta e nove cartas e decretos dos vinte papas mais antigos de Clemente a Melquíades, e a doação de Constantino; e na terceira parte, entre os decretos dos papas e dos concílios desde Silvestre a Gregório II, trinta e nove decretos falsos, e os atos falsos de vários concílios".

Em relação à autoria e data das Decretais falsas, Dean Milman diz: "O autor ou autores dessas fraudes tão audaciosas e elaboradas são desconhecidos; a data e local de sua compilação são colocados em limites tão estreitos que podem ser determinados no espaço de poucos anos, e dentro de uma região muito circunscrita. As Decretais falsas não vieram de Roma; a data de sua chegada a Roma, após serem conhecidas no além dos Alpes, parece quase certa. Num ano Nicholas I aparentemente desconhece a existência delas; no ano seguinte fala delas com pleno conhecimento. Elas contêm palavras claramente usadas no Concílio de Paris, 829 d.C., consequentemente são de data posterior. Elas eram conhecidas pelo Levita Benedito de Mentz, que compôs um suplemento à coleção de capitulares por Ansegise, entre 840 e 847 d.C. A cidade de Mentz é designada com quase igual certeza como o lugar em que, se não foram efetivamente compostas, foram promulgadas pela primeira vez como lei canônica da cristandade".
(Arthur Cleveland Coxe (editor do volume), Stewart Dingwall Fordyce Salmond (tradutor), The Decretals, Alexander Roberts e James Donaldson (editores da série), The Ante-Nicene Fathers, Vol. VIII., VI., pp. 601 -607, Nova York, NY: Charles Scribner's Sons, 1906; itálico no original).

Decretais Pseudo-Isidorianas
Decretalia autem, quæ a sanctis Pontificibus primæ sedis Romanæ Ecclesiæ sunt instituta, cujus auctoritateatque sanctione omnes Synobi et sancta Concilia roborantur, et stabilitatem sumunt, cur vos non habere velobservare dicitis? – Papa Nicolau I ao Patriarca São Fócio
As Falsas Decretais Isidorianas referem-se a uma coleção de cartas papais falsificadas e outros documentos apócrifos criados por volta do ano 850.  São Isidoro, que foi bispo de Sevilha na Espanha de 600 a 636, foi considerado o compilador da coleção. Esses documentos falsificados alegavam ser dos primeiros séculos da Igreja, mas incorporavam as idéias anacrônicas do poder papal. Essa falsificação favoreceu muito o Papado e teve autoridade quase incontestável por cerca de setecentos anos, desde o século IX até o século XVI.  A Enciclopédia Católica tem um ótimo artigo sobre esse tópico, e confirma: "Hoje em dia todos concordam que essas supostas cartas papais são falsificações".

A Enciclopédia Católica escreve sobre o propósito do falsificador: "Seu principal interesse era defender os bispos; e se o papado se beneficiou com o que ele fez, pode ser demonstrado que foi uma consequência necessária do papa ter se tornado o defensor do bispo. E ainda que seja necessário admitir que os papas se beneficiaram com as falsificações, a boa fé deles está fora de dúvida".

Entretanto, a rápida aceitação pelos Papas dessas falsificações levanta suspeitas sobre a afirmação de que a "boa fé [dos Papas] está fora de dúvida". Henry Hart Milman (1791 - 1868), sacerdote e historiador anglicano, e em sua discussão sobre as Falsas Decretais em seu "História do Cristianismo Latino" (publicado em 1855), questionou:
Esta adoção imediata, ainda que um pouco cautelosa, da falsificação, sem qualquer contestação da fraude, pelo Papa Nicolau, parece-me menos passível de atenuação benevolente do que a invenção original. Foi, na verdade, uma forte tentação. Mas, em Roma, onde tais documentos nunca haviam sido conhecidos, é difícil imaginar com que argumentos um homem, não ignorante, poderia convencer-se, ou acreditar que poderia convencer-se, da autenticidade dos mesmos.  Era uma longa, contínua e ininterrupta série de cartas, uma coletânea acumulada de decretos de concílios, dos quais os arquivos de Roma não demonstravam qualquer vestígio, das quais as tradições de Roma eram totalmente silenciosas: ainda assim, não há uma santa indignação diante da fraude, nenhuma elevada reprovação por parte daqueles que ousaram sentar-se no trono pontifício e falar em nome de Papa depois de Papa. Há uma justificação deliberada e ardilosa da autoridade deles. São alegadas razões pelas quais é impossível supor que o próprio Nicolas acreditava na validade das mesmas, pelo fato de sua reconhecida ausência dos arquivos Romanos. Os sucessores de Nicolau também não apresentaram maiores escrúpulos em se fortalecerem com essa recepção e, portanto, apenas uma ajuda insuspeita. É impossível negar que, ao menos citando sem reservas ou hesitações, os pontífices Romanos aprovaram deliberadamente esta grande fraude histórica.
A partir da Enciclopédia Católica, verificamos que esta falsificação desempenhou um papel significativo na Igreja: "A coleção Pseudo-Isidoriana, cuja autenticidade foi por muito tempo admitida, exerceu considerável influência na disciplina eclesiástica", e ainda, "as 'Decretais Falsas' certamente afetaram a disciplina eclesiástica".

O falsificador "enganou também os papas, quando sua obra foi levada a Roma por Rothade de Soissons por volta do verão de 864".  Também na carta do Papa Nicolau
aos bispos francos, datada de 22 de janeiro de 865, a propósito de Rothade, ele apresenta a teoria sobre os apelos muito de acordo com a maneira como Isidoro a havia apresentado; tanto assim que um escritor fala do parfum isidorien que a carta exala (Fournier). Se as cartas dos primeiros papas (ou seja, as decretais de Isidoro) não são citadas explicitamente, pelo menos são feitas alusão a elas. (Enciclopédia Católica)
A defesa Católica Romana é afirmar que as falsificações não afirmaram nada de novo e, no entanto, admitem que elas influenciaram significativamente a Igreja, e não haveria necessidade de fabricar provas para o que já era admitido e exercido desde o início da religião cristã, caso existissem previamente documentos autênticos apropriados.  Não me parece que o uso generalizado desses documentos falsos e os erros crescentes dos latinos sejam mera coincidência.

De acordo com a Enciclopédia Católica, a recepção das falsificações de Isidoro
ocorreu provavelmente durante o pontificado de Nicolau I (858-867). Parece certo que ele conhecia as decretais, e é possível que ele tenha até possuído uma cópia delas. ... A coleção isidoriana foi publicada entre 847 e 852. ... E é um fato indubitável que a partir do ano 864, em casos como este a que nos referimos, as idéias e expressões de Isidoro exerceram uma forte influência sobre a conduta e as decisões de Nicolau I.
O trecho seguinte é de um artigo intitulado "Falsas Decretais" na "Enciclopédia Católica":
O Papa Adriano II (867-872) as conhecia e, em uma carta datada de 26 de dezembro de 871, aprova a mudança de Actard, Bispo de Nantes, para a Sé Metropolitana de Tours, e cita uma das falsas decretais. Citações feitas por Estêvão V (885-891) não são prova conclusiva de que ele utilizou diretamente o texto de Isidoro; e o mesmo se pode dizer de referências ocasionais a ele durante o século X, que ocorrem nas cartas dos papas ou dos legados papais. Entretanto, outros autores na Itália mostram menos reservas no uso das falsas decretais. Assim, no final do século IX e início do século X elas são citadas por Auxilius nos tratados que ele escreveu em defesa das ordenações realizadas pelo Papa Formosus (891-896). É verdade que Auxilius nasceu entre os francos, como também Rathier, bispo de Verona, que também cita Isidoro. Attone de Vercelli, porém, era italiano, e ele o cita. No final do século IX e durante o século X, extratos das falsas decretais começam a ser incluídos nas coleções de direito canônico - na coleção dedicada ao bispo Anselmo de Milão, na coleção Réginon, por volta de 906, entre os decretos de Burchard, bispo de Worms. No entanto, até meados do século XI, as falsas decretais não obtiveram uma base oficial na legislação eclesiástica. Elas nada mais eram do que uma coleção feita na Gália, e foi somente sob Leão IX (1048-1054) que elas se firmaram em Roma. Quando o Bispo de Toul tornou-se Papa e iniciou a reforma da Igreja, reformando a Cúria Romana, ele levou consigo para Roma a coleção apócrifa. Anselmo de Lucca, o amigo e conselheiro de Gregório VII, compôs uma extensa coleção de cânones entre os quais os de Isidoro aparecem em grande parte. A mesma coisa aconteceu no caso da coleção do Cardeal Deusdedit, composta mais ou menos na mesma época. E, por fim, quando em 1140 Graciano escreveu seu "Decreto", ele extraiu extensivamente da coleção de Isidoro. Dessa forma, a coleção conquistou um lugar importante nas escolas de direito e jurisprudência. É verdade que a coleção Graciana nunca teve a aprovação de ser o texto oficial do direito eclesiástico, mas ela tornou-se o livro-texto das escolas do século XII e, mesmo com as falsas decretais a ele acrescentadas, manteve um lugar de honra com a faculdade de direito canônico. Foi ela que forneceu o texto do instrutor "diário" sobre as coisas mais essenciais a serem conhecidas. E a faculdade de direito se denominou faculdade do Decreto; o que mostra a importância que foi dada, nas escolas, aos textos Isidorianos inseridos nas decretais.
A Enciclopédia Católica admite que essas falsificações tiveram uma enorme influência na Idade Média:
Dito isto, somos livres para confessar francamente que em esferas menores do que as da teologia e do direito, as falsas decretais nem sempre exerceram uma influência positiva. Na história, por exemplo, sua influência foi desastrosa. Sem dúvida, elas não carregam toda a culpa pela visão distorcida e lendária que a Idade Média tinha da antiguidade eclesiástica. Durante a Idade Média era quase uma impossibilidade consultar todas as fontes de informação, e era difícil verificar e controlar as que estavam à mão. Não era fácil distinguir os documentos genuínos dos apócrifos. E essa dificuldade, que era o grande obstáculo da cultura medieval, era sempre um obstáculo para o progresso do estudo histórico. Deve-se admitir que as falsificações isidorianas aumentaram a dificuldade até se tornarem quase intransponíveis. As falsificações turvaram toda a perspectiva histórica. Os costumes e métodos próprios do século IX se destacaram em relevo lado a lado com a disciplina dos primeiros séculos da Igreja. E, como uma consequência, a Idade Média sabia muito pouco sobre o crescimento histórico dos direitos do papado durante esses primeiros séculos. Sua visão da antiguidade era muito simples, e talvez tenha sido também em relação à sistematização da teologia. No geral, não era fácil desenvolver um senso histórico durante a Idade Média.
O artigo da "Enciclopédia Católica" sobre "Direito Canônico" também menciona as Falsas Decretais:
(6) A coleção das Falsas Decretais, ou de Pseudo-Isidoro (por volta de 850), é a última e mais completa das coleções "cronológicas", e portanto a mais utilizada pelos autores das coleções "sistemáticas" subsequentes; é a coleção "hispana" ou espanhola junto com as decretais apócrifas atribuídas aos papas dos primeiros séculos até a época de São Damásio, quando começam as autênticas decretais. Exerceu uma influência muito grande.
(7) Para concluir a lista de coleções, onde os canonistas posteriores iriam reunir seus materiais, devemos citar os "Penitenciais", as "Ordines" ou coleções rituais, os "Formulários", especialmente o "Liber Diurnus"; também compilações de leis puramente laicas, ou semi-eclesiásticas, como as "Capitulares" (q.v.). O nome "capitula" ou "capitularia" é dado também às ordenações episcopais bastante comuns no século IX. Deve-se notar que o autor das Falsas Decretais também forjou falsas "Capitulares", sob o nome de Bento Diácono, e falsa "Capitula" episcopal, sob o nome de Angilramnus, Bispo de Metz.
O autor deste artigo na Enciclopédia Católica é Auguste Marie Félix Boudinhon (1858-1941), que foi Professor de Direito Canônico na Universidade Católica de Paris, e foi Cónego Honorário de Paris. Boudinhon escreveu mais de 50 artigos para a "Enciclopédia Católica" e 10 artigos para a "Encyclopædia Britannica" (http://en.wikisource.org/wiki/Author:Auguste_Boudinhon). O jornal "Catholic Herald" tem o seguinte obituário para o "Mgr. A. Boudinhon", "reitor da Igreja Francesa de Roma", em 25 de julho de 1941: Mons. August Boudinhon, vice-presidente do Conselho Superior da Pontifícia Obra de Propagação da Fé, e Reitor da Igreja de São Luís dos Franceses em Roma, faleceu aos 82 anos de idade. Como Professor de Direito Canônico no Instituto Católico de Paris, foi colega do falecido Cardeal Pietro Gasperi. Ele veio para Roma em 1916 como Reitor da Igreja Nacional Francesa, e quando faleceu era consultor de várias das Congregações Sagradas". (http://archive.catholicherald.co.uk/article/25th-july-1941/7/mgr-a-boudinhon)

Os Católicos Romanos acusam Fócio de ser o ambicioso fomentador do cisma, mas lemos o seguinte sobre o seu antagonista e contemporâneo Papa Nicolau I: 
Podemos admitir que, embora a contenda do papa seja justificada, os argumentos com os quais ele a fundamenta são, por vezes, susceptíveis de ataque. Assim, em uma carta dirigida ao Concílio de Soissons em 863, ele deseja afirmar seu direito de intervir nos julgamentos dos bispos, mesmo quando não havia nenhum apelo feito a Roma. Isso constituiu uma afirmação do poder absoluto da Santa Sé, uma afirmação que ele poderia ter fundamentado por muitos argumentos sólidos; no entanto, para nossa surpresa, ele afirmou como fundamentação a isso os cânones do Concílio de Sardica, que nada dizem a esse respeito. O Concílio de Sardica (343) visou muito particularmente salvaguardar os direitos legais dos bispos perseguidos; esse era seu objetivo principal, e não visava, de modo algum, definir os direitos de Roma em questões do gênero. Estes cânones marcam um dos primeiros passos na questão da disciplina da Igreja. …

É verdade que em sua carta de 22 de janeiro de 865, Nicolau I declara que os bispos francos recorrem aos decretos dos primeiros papas (ou seja, as decretais de Isidoro).
Referindo-se, evidentemente, às falsas decretais, o Papa Nicolau I declara em uma epístola:
Decretales epistolae Rom. Pontificum sunt recipiendae, etiamsi non sunt canonum codici compaginatae: quoniam inter ipsos canones unum b. Leonis capitulum constat esse permixtum, quo omnia decretalia constituta sedes apostolicae custodiri mandantur.—Itaque nihil interest, utrum sint omnia decretalia sedis Apost. constituta inter canones conciliorum immixta, cum omnia in uno copore compaginare non possint et illa eis intersint, quae firmitatem his quae desunt et vigorem suum assignet.—Sanctus Gelasius (quoque) non dixit suscipiendas decretales epistolas quae inter canones habentur, nec tantum quas moderni pontifices ediderunt, sed quas beatissimi Papae diversis temporibus ab urbe Roma dederunt.
(Nicolai I. Epist. ad universos episcopos Galliae ann. 865 (Mansi xv. p. 694 sq.; citado em Schaff, History of the Christian Church, ed. 1908, Vol. IV, p. 272)

Na noite de Natal de 864, o Papa Nicolau declarou em um sermão:
Embora os Bispos não tivessem o direito de realizar um Sínodo sem o mandado da Sé Apostólica, eles tinham convocado Rothad para lá, e mesmo que ele não tivesse apelado para a Sé Apostólica, eles não deveriam, como bem sabeis, ter se oposto a tantas e grandes Decretais e imprudentemente depor um Bispo. (Nicholas, P. I., Servto quern de Rothadi causa ... in missa fecit ... die vigiliarum Naiiv. Domini (a.D. 864) ; P.L. cxix. 890-1.;  tradução inglesa citada em Denny, Papalism, p. 112)
[...]

Em um concílio realizado em Roma no ano 1074, o segundo do pontificado de Gregório VII, um desses decretos Isidorianos, atribuído a Marcellus, que é atribuído ao ano 304 d.C., é citado como autoridade suficiente para a invalidade dos concílios realizados sem a aprovação da Santa Sé.  O terceiro capítulo deste Concílio diz o seguinte: 
Este bem-aventurado Papa [Marcellus], que, perante o Concílio de Nicéia, selou seus Decretos com martírio, no décimo primeiro capítulo, diz:  Os próprios Apóstolos, e seus sucessores, pela inspiração do Senhor, decretaram: "Não deve haver Sínodo sem a autoridade da Sé de Roma".  (Eclectic and Congregational Review, 1860, New Series, Vol. III., p. 655)
Em outra Bula, o Papa Gregório VII se refere às palavras da Pseudo-Decretal de Anacleto, como aponta o estudioso Católico gallicano Fleury em seu Histoire Ecclésiastique. (tr. ing. em Edward Bouverie Pusey, 1865, The Church of England: A Portion of Christ's One Holy Catholic Church, p. 244)

No artigo "Decretais Pseudo-Isidorianos e Outras Falsificações" da Enciclopédia Schaff-Herzog, vemos mais exemplos do uso generalizado da coleção falsificada na Idade Média:
Foi na Francônia Ocidental (e na província de Reims) que a obra concluída e publicada apareceu pela primeira vez. As primeiras citações conhecidas são de Hincmar de 852 (ou 857; veja 4, acima). Nas contestações de Hincmar com seus sufragâneos, Rothad de Soissons e Hincmar de Laon, as falsas decretais foram o fator decisivo no primeiro caso, com ajuda do papa, em favor do sufragâneo, no segundo caso contra o subordinado recalcitrante. Há alguma razão para acreditar que Hincmar percebeu o verdadeiro caráter dos documentos; ele era suficientemente instruído para tal, mas parece ter depreciado a controvérsia que deveria seguir, se ele falasse ousadamente; e, além disso, ele não se mostrou relutante, ocasionalmente, em usar as decretais para seus próprios propósitos e vencer seus inimigos com as armas deles próprios. É provável que Rothad tenha levado as decretais para Roma em 864 e as tenha apresentado ao Papa Nicolau I. As primeiras indicações seguras de que Nicholas as conhecia aparecem em seu discurso de Natal daquele ano e em uma carta de janeiro de 865 aos bispos francos, sendo ambas afirmações a respeito do conflito de Rothad com Hincmar. Adriano II, em 871, cita uma decretal de Pseudo-Anterus, e um discurso sinodal de 869, provavelmente composto pelo próprio Adriano, tem mais de trinta citações da coleção do Pseudo-Isidore; é destacado como o primeiro uso extensivo das falsas decretais em favor das reivindicações da sé Romana. Nos movimentos de reforma do século XI foram reveladas todas as possibilidades e efeitos das mesmas. Na Alemanha as primeiras citações estão nos atos sinodais de Worms (868), Colônia (887), Metz (893), Tribur (895) e - em maior número - Hohenaltheim (916). Em Gerstungen (1085), ambos os partidos gregoriano e imperial recorreram às falsas decretais; e uma declaração do legado papal (que depois se tornou Papa Urbano II) e dos bispos saxões a respeito delas é digna de nota por seu tom duvidoso e desdenhoso. Elas foram introduzidas na Inglaterra por Lanfranc. Na Espanha elas chegaram apenas como incorporadas nas coleções posteriores de cânones. Foram estas coleções que mais contribuíram para a sua aceitação e divulgação. A mais antiga que incorpora o material Pseudo-isidoriano (A2) é a Collectio Anselmo dedicata, composta, provavelmente em Milão, entre 883 e 897. Outras surgiram (veja Direito Canônico, II., 5, § 1), e uma coleção feita na Itália sob Leão IX por volta de 1050 é pouco mais que um compêndio da Pseudo-Isidoriana (250 de seus 315 capítulos provêm da falsificação). Quando foi admitida no Decretum de Graciano, sua aceitação tornou-se absoluta.  Com a possível exceção de Hincmar e a expressão reservada do Sínodo de Gerstungen, ninguém levantou sua voz contra as falsificações até o século XV.
Nota: "A Nova Enciclopédia Schaff-Herzog do Conhecimento Religioso", é considerada "a enciclopédia mais abrangente, detalhada e significativa para a religião cristã em língua inglesa".  É uma obra multi-volume bastante erudita, com cerca de 10.000 páginas, escrita em sua maioria a partir da perspectiva Protestante, e a adaptação da obra do teólogo alemão Johann Jakob Herzog "começou sob a liderança de Philip Schaff, mas desde então já contou com a contribuição de mais de 100 editores e 600 estudiosos".  (http://www.ccel.org/ccel/schaff/encyc09)

Na coleção de Direito Canônico comumente conhecida como Excertos de Egbert, "Há artigos retirados das ''decretais'' dos primeiros Papas fabricados pelo falso Isidoro, e dos atos espúrios do suposto Concílio Romano sob o Papa Silvestre". (Roundell Palmer, Earl of Selborne, 1888, Ancient Facts and Fictions Concerning Churches and Tithes, Part II., p.244).  Esta coleção de direito canônico originou-se no sul da Inglaterra por volta do ano 1005.

É digno de nota que apesar das dúvidas levantadas, a posição oficial da Igreja Romana próximo ao final do século XVI, em sua coleção oficial de leis canônicas, era a de que os decretais Pseudo-isidorianas eram genuínos:

A Idade Média foi enganada por essa enorme falsificação, mas durante a Renascença os homens eruditos e os canonistas em geral começaram a reconhecer a fraude. Dois cardeais, João de Torquemada (1468) e Nicolau de Cusa (1464), declararam que os documentos mais antigos eram falsificações, especialmente aqueles que alegavam ser de Clemente e Anacleto. Então a suspeita começou a crescer. Erasmo (falecido em 1536) e canonistas que haviam se juntado à Reforma, como Charles du Moulin (falecido em 1568), ou canonistas Católicos como Antoine le Conte (falecido em 1586), e depois deles os Centúrias de Magdeburg, em 1559, levantaram a questão diretamente perante o mundo dos eruditos. No entanto, a edição oficial do "Corpus Juris", em 1580, manteve a genuinidade das falsas decretais, muitos fragmentos das quais se encontram no "Decretum" do Graciano.

(Enciclopédia Católica)

Bartoli, um ex-jesuíta que se converteu ao Protestantismo, escreve: "E deve ser observado aqui, que quando em 1582, por ordem do Papa Gregório XIII e sob a revisão de uma comissão por ele nomeada, o texto correto do Corpus Juris foi publicado, as falsas decretais foram mantidas, embora, mesmo naquela época, a maioria dos eruditos pediu a supressão das mesmas". (Bartoli, p. 116). Mais sobre Bartoli adiante, na seção Falsificações. Observe também que  trinta citações são atribuídas ao Papa Anacleto no Corpus Juris.

Foi apenas no século XVII que elas foram formalmente repudiadas pelos Católicos Romanos, incentivados pelos estudos dos estudiosos Protestantes: "Em 1628 o Protestante Blondel publicou seu estudo decisivo, 'Pseudo-Isidorus et Turrianus vapulantes'. Desde então, a natureza apócrifa das decretais de Isidoro tem sido um fato histórico estabelecido. As últimas das falsas decretais que escaparam à crítica a Blondel foram identificadas por dois padres Católicos, os irmãos Ballerini, no século XVIII". (Enciclopédia Católica)

Quando o verdadeiro caráter dessas decretais foi plenamente demonstrado pelos "Centúrias de Magdeburg" (1559), alguns latinos as abandonaram, mas o jesuíta Francisco Turrianus (também chamado de Torres; 1509 - 1584), tentou provar a genuinidade delas em sua resposta "Adv. Magdeburg. Centuriatores pro canonibus Apostolorum et epistolis Decretalibus Pontificum Apostolorum, libri quinque" (1572). Para esta obra David Blondel escreveu uma resposta intitulada "Pseudo-Isidorus et Turrianus Vapulantes" (1628), que pôs fim à questão para além de toda objeção.

Turrianus é outro caso de um alto representante do Catolicismo Romano em defesa de documentos falsos. Assim a Enciclopédia Católica apresenta a biografia de Francisco Turrianus: "Em 1562 Pio IV o enviou ao Concílio de Trento, e em 8 de janeiro de 1567, tornou-se jesuíta. Foi professor no Colégio Romano, participou na revisão da Vulgata Sixtina e teve Hósio e Barônio como associados literários. Seus contemporâneos o chamavam de "helluo librorum", pela rapidez com que ele examinava as principais bibliotecas. Ele defendeu as doutrinas da Imaculada Conceição, a autoridade do soberano pontífice sobre o concílio, a autoridade divinamente instituída dos bispos, a comunhão sob uma só espécie para os leigos, a autenticidade dos cânones apostólicos e as decretais Pseudo-isidorianas".

Outros Católicos Romanos que tentaram defender as Falsas Decretais também fracassaram: "tentativas posteriores -Bonaventura Malvasia (Nuntius veritatis, Roma, 1635) e Eduard Dumond (Les fausses décrétales), em Revuedes questionam historiques, i. e ii. - fracassaram em demonstrar". (Wasserschleben, Pseudo-Isidorian Decretals, A Religious Encyclopædia, 1891, Vol. III., p. 1968)

Coulton escreve:
O último estudioso a tentar uma defesa da genuinidade destas decretais foi o beneditino espanhol J. S. Aguirre, Professor de Teologia em Salamanca e Secretário da Inquisição na Espanha, na sétima dissertação da sua Collectio Conciliorum Hispanae. O livro foi impresso em 1683, e o autor foi promovido ao Cardinalato em 1686; mas nenhum estudioso Romanista moderno leva a sério sua dissertação. 
(G. G. Coulton, Romanism and Truth, Vol. I., Ch. II., p. 23, nota 3, Londres:  The Faith Press, 1930).

Zeger Bernhard van Espen (1646 - 1728) foi um erudito padre Católico Romano e professor de Direito Canônico. A Enciclopédia Católica afirma: "Ele foi consultado por todas as classes por causa de seu profundo conhecimento de direito canônico, e sua famosa obra, 'Jus canonicum universum', embora tenha levantado inúmeras críticas justas, ainda permanece notável". No entanto, Van Espen era um galicano, o que significa que ele é considerado como tendo errado de acordo com o padrão do Vaticano I, porque o galicanismo elevava os poderes dos bispos para combater os poderes do papa, ensinando que um Concílio Ecumênico está acima do Papa. Devido ao galicanismo firme de Van Espen, todas as suas obras foram colocadas no "Índice de Livros Proibidos", embora nem todas as obras galicanas estejam no Index.

Van Espen escreve sobre as Decretais Pseudo-isidorianas: "É indubitável que a Cúria Romana apoiou esta coleção de falsas Decretais com o máximo zelo, e esforçou-se para que estas cartas Decretais pudessem ser recebidas em toda parte como autênticas e como emanando dos primeiros e santíssimos Pontífices, e que a autoridade nelas reivindicada para os Pontífices Romanos pudesse ser reconhecida por todos, ... por esta falsificação e recepção das Decretais a disciplina dos Padres foi rompida, e ... além disso, os Pontífices Romanos inseriram nas suas próprias Decretais, e quiseram que fossem tomadas por lei, os novos princípios afirmados nestas Decretais como se nos tivessem sido transmitidas a nós pela tradição Apostólica". (Van Espen, Comment. in jus novum Canonicum, pars secunda, diss. prima, De Collectione Isidori, op. tom. iii. 453. Lovanii, 1753.; tradução inglesa citada na p.593 da obra Papalism por Edward Denny)

Yves Congar (1904 - 1995), um erudito historiador, professor e ecumenista Católico dominicano, embora tentando defender o uso latino das Falsas Decretais, observa
Quanto às Falsas Decretais, não precisamos repetir o que hoje é universalmente admitido, que não foram atos de Roma, mas de clérigos francos, visando assegurar à Igreja a sua independência em relação aos poderes seculares. Mas elas contribuíram para o aumento do poder papal e da ideologia que expressa esse poder. Cf. Fleury, Hist. eclesiast. 4º "Discursos" no início do Vol. XVI, e Haller, op. cit. Hartmann, op. cit., 28, mostrou que os textos de Pseudo-Isidoro apresentam os papas usando os mesmos termos imperativos com os bispos orientais que eles empregavam em sua competência metropolitana ou ocidental. Os textos pontifícios das Falsas Decretais tratam o mundo inteiro como sufragâneos do Papa, tendo a obrigação da conformidade, não só na fé, mas na disciplina e nos costumes.
(Congar, After Nine Hundred Years, 1959, p. 137).

Esta obra foi publicada originalmente em Paris, em 1954, e foi traduzida do francês em 1959. A tradução inglesa traz o Nihil Obstat de John A. Goodwine, J. C. D., Censor Librorum, e o Imprimatur de Francis Cardinal Spellman, Arcebispo de Nova York. A nota abaixo disso diz: "O Nihil obstat e o Imprimatur são declarações oficiais de que um livro ou panfleto está livre de erro doutrinário ou moral. Não há nenhuma implicação de que aqueles que concederam o Nihil obstat e o Imprimatur concordem com as opiniões ou declarações expressas".

Christianus Lupus, jesuíta do final do século XVII, um dos eclesiásticos mais eruditos de sua época, descreve assim o estado das coisas no que diz respeito aos interesses de Roma: "Naquela época a majestade da sé apostólica e todo governo eclesiástico estava muito abalado; na Gália e Alemanha pelos Francos (leigos), na Itália e Ilíria pelos Lombardos e Gregos, na Espanha pelos Sarracenos. Portanto, com o objetivo de restaurar a autoridade papal e a decadente disciplina da igreja, alguns piedosos filhos da igreja - não sei quem eram - inventaram certas epístolas decretais com os nomes dos antigos pontífices de Roma; e estes são os documentos que agora chamamos de coleção de Isidoro Mercator". (Thomas Greenwood, 1859, Cathedri Petri, Livro VI., p. 180). No entanto, Lupus ainda se refere à Doação de Constantino como fato indiscutível (veja a próxima seção).

É interessante ressaltar a inconsistência dos estudos Católicos Romanos sobre as Falsas Decretais. Muitas obras Católicas Romanas do século XIX nem mesmo admitiam que o Papa Nicolau I foi influenciado pelas decretais. O autor do artigo "Falsas Decretais" na Enciclopédia Católica parece ter uma perspectiva diferente da do autor do artigo da Enciclopédia Católica sobre "O Papa São Nicolau I".

Embora o artigo sobre "o Papa São Nicolau I" escreva que ele foi "um dos grandes papas da Idade Média, que exerceu influência decisiva sobre o desenvolvimento histórico do papado e sua posição entre as nações cristãs da Europa Ocidental", o artigo também resume um estudo Católico Romano sobre o uso das falsificações pelo Papa Nicolau I: "Após exaustiva investigação, Schrörs concluiu que o papa não conhecia a coleção pseudo-isidoriana em toda a sua extensão, nem fez uso de suas partes individuais; que talvez ele tivesse um conhecimento geral das falsas decretais, mas não baseou sua concepção da lei sobre as mesmas, e que devia seu conhecimento sobre elas apenas pelos documentos que lhe chegaram do Império Franco".

No entanto, foi admitido em outros lugares, por estudiosos mais honestos, que o Papa Nicolau I fez uso das decretais Pseudo-Isidorianas, referindo-se a elas em questões de autoridade, e ele certamente foi muito influenciado por elas, de modo que vemos aqui a incongruência absurda de autores Católicos Romanos, mesmo na era dos estudos críticos, quando essas cartas papais apócrifas haviam sido expostas como invenções.

Mesmo os Católicos Romanos que admitem que as falsas decretais influenciaram o Papa Nicolau e seus sucessores tentam minimizar a medida em que essa falsificação favorece o Papado. Uma consulta a extratos dessas falsas decretais dissipará de imediato a idéia de que essas decretais não afirmaram significativamente o poder papal.

Por exemplo, na suposta Terceira Epístola de Anacleto (por volta de 81 d.C.), este antigo Papa de Roma é levado a dizer "se entre vós surgirem processos mais difíceis, remetei-os ao supremo tribunal desta Santa Sé como à cabeça, para que possam ser encerrados pela decisão Apostólica, porque assim foi desejado pelo Senhor, e é declarado pelos referidos testemunhos como tendo sido assim determinado por Ele".

Outra falsa epístola, que se dizia ser a Terceira do Papa Félix I (269 - 274 d.C.), diz: "todos as questões duvidosas e maiores costumam receber suas resoluções desta Santa Sé desde o tempo dos Apóstolos que a instruíram por seus escritos, e por isso fizestes bem em querer que vós e outros fossem fortalecidos e instruídos pelo conselho desta Santa Sé".

Muito mais exemplos semelhantes podem ser mostrados, que o leitor pode encontrar na Nota 13 da obra Papalism do Edward Denny (pp. 612 - 621; veja o final desta seção).

George Salmon (1819 - 1904), um matemático irlandês, teólogo anglicano, e diretor do Trinity College Dublin, escreveu:
Se quisermos saber o que essas cartas representaram na construção da estrutura Romana, basta olharmos para o Direito Canônico. O 'Decretum' do Graciano cita 324 vezes as epístolas dos papas dos primeiros quatro séculos; e dessas 324 citações, 313 provêm das cartas que hoje são universalmente conhecidas como falsas. Eu não posso garantir a autenticidade dos onze restantes.Ao escrever uma palestra anterior tive a oportunidade de me referir a Belarmino, para ver se ele poderia citar algum Padre aplicando a Roma o texto em que Cristo ora para que a fé de Pedro não desfaleça. Descobri que ele não pôde citar nenhum escritor que não fosse papa; e os papas que ele começa citando são retirados das falsas decretais. O tratado de Belarmino baseia-se no de Melchior Canus; e das 20 citações que ele oferece sobre esse tópico, 18 foram retiradas das falsas decretais. Portanto, é inútil negar que essa falsificação seja o fundamento sobre o qual a crença Romana no poder papal foi fundada.
(George Salmon, The Infallibility of the Church, Lecture XXIII, pp. 453 – 454, London: John Murray, 1890, 2nd Ed.; veja o resto desta palestra para mais informações.)

É muito significativo que 18 das 20 citações de Melchior Canus sejam falsas, num capítulo sobre os privilégios divinos da Sé Romana e do Papa em matéria de fé (veja T. J. Bailey (tradutor), Auguste Gratry, Second Letter to Monseigneur Dechamps, I., pp. 8 –13, London: J. T. Hayes, 1870), mas pensamos que Salmon vai longe demais em sua afirmação de que "essa falsificação [é] o fundamento sobre o qual a crença Romana no poder papal foi fundada", mas certamente serviu para promover e apoiar as concepções errôneas dos latinos sobre a posição do Bispo de Roma, o que contribuiu para o cisma deles, e ajudou a mantê-los em seu cisma, juntamente com outras falsificações. Por outro lado, o jesuíta Paul Bottalla, que escreveu exaustivamente defendendo a Igreja Romana das críticas relacionadas às falsas decretais, faz uma afirmação muito forte, que "A menos que ele [Edmund Ffoulkes] esteja preparado para admitir este paradoxo, ele deve se juntar a todos os escritores mais eruditos da Europa, Protestantes não menos do que Católicos, confessando que a falsificação das Decretais contribuiu em nada para originar e estabelecer, ou para propagar a doutrina da supremacia Papal na Igreja. "(Rev. Paul Bottalla, The Papacy and Schism: Strictures on Mr. Foulkes' Letter to Archbishop Manning, III., p. 25, Londres: Burns, Oates, and Company, 1869). A afirmação de Bottalla de que a falsificação "contribuiu em nada" para "propagar a doutrina da supremacia papal" é comprovadamente incorreta pelas evidências aqui expostas, onde temos visto muitas citações das Pseudo-Decretais em defesa do poder papal  (algumas das quais Bottalla está ciente (op. cit., VIII., pp. 55 -58), na tentativa de persuadir os Ortodoxos na controvérsia.)

Tudo o que Bottalla admite é: "Em outras palavras, consideramos a mudança introduzida na disciplina da Igreja através da influência das Falsas Decretais, como afetando apenas pontos de detalhe, ou melhor, como não sendo mais do que a aplicação prática de princípios já universalmente admitidos".   (Rev. Paul Bottalla, The Papacy and Schism: Strictures on Mr. Foulkes' Letter to Archbishop Manning, VII., p. 51, Londres: Burns, Oates, and Company, 1869).

O estudioso anglicano William Edward Scudamore (1813 -1881) escreve:
Para mostrar que os Padres entenderam as palavras de Nosso Senhor como uma promessa de infalibilidade ao Papa, Belarmino cita dez autores diversos.  Sete deles são eles mesmos Papas, mas suas citações dos dois mais antigos são falsificadas; do terceiro nada adianta ao propósito; enquanto o resto, o que quer que signifiquem, são tão recentes (variando de 680 a 1200 d.C.) que não têm valor para a sua causa.  Dos seus testemunhos restantes, um é uma passagem totalmente irrelevante de Teofilato (1070 d.C.), outro é de São Bernardo (1140 d.C.) que diz sobre a Sé de Roma: "A que outra Sé foi dito, eu tenho rezado por ti, &c. ?" e a terceira de uma adição falsa a uma Epístola de Crisólogo, a qual um grande crítico e historiador Católico Romano (Dupin, cent. v. Petr. Chrysol.; vol. i. p. 485) considera ter sido acrescentada ao texto genuíno expressamente "para elevar a autoridade da Igreja de Roma".
(William Edward Scudamore, 1855, England and Rome: a discussion of the principal doctrines and passages of history in common debate between the members of the two communions, Letter IV., Part I., Sect.II., xi., p. 116)

Johannes Graciano foi um importante canonista latino medieval, a quem a Enciclopédia Católica chama de "o verdadeiro fundador da ciência do direito canônico".  Como mencionado anteriormente, o famoso "Decretum" de Graciano, que foi escrito em meados do século XII, "forneceu o texto do instrutor 'diário' sobre as coisas mais essenciais a serem conhecidas"A obra de Graciano também foi endossada pelos Papas, como escreve a Enciclopédia Católica sobre o Papa Alexandre III (Papa de 1159 -1181), "Como professor em Bolonha ele adquiriu uma grande reputação como canonista, que ele aumentou com a publicação de seu comentário sobre o 'Decretum' de Graciano, popularmente conhecido como 'Summa Magistri Rolandi'."

Melchior Canus (1509 -1560) foi um bispo e teólogo dominicano, professor principal da Universidade de Alcalá, e que participou do Concílio de Trento.  A Enciclopédia Católica escreve: "No início de 1551 ele foi enviado pelo imperador ao Concílio de Trento. Ele foi acompanhado por Dominic Soto, e, como outros membros da ordem, foi capaz, por sua erudição histórica e seu domínio da teologia escolástica e positiva, de prestar um importante serviço nas deliberações e realizações do Concílio."

São Roberto Belarmino (1542 -1621) foi um distinto teólogo jesuíta, escritor, professor e cardeal, e foi declarado oficialmente como "Doutor da Igreja Universal".

Há algumas seções excelentes sobre Falsificações em "O Papa e o Concílio", publicado na véspera do Concílio Vaticano de 1870 por um dos homens mais eruditos da comunhão Católica Romana, Johann Joseph Ignaz von Döllinger (em colaboração com o professor Victor Aimé Huber que se converteu ao Protestantismo vindo do Catolicismo Romano), que mais tarde rejeitou o dogma da Infalibilidade Papal e foi influente no movimento Velho Católico. Döllinger escreveu com o pseudônimo Janus (Janus, The Pope and the Council, pp. 94 -150, 278 -289, 396 -402, Londres:  Rivingtons, 1870, Terceira Ed.)

Para mais material sobre essas famosas cartas e demais análises, recomendamos o Capítulo VI e Notas 12 -15 da obra Papalism de Edward Denny (Edward Denny, Papalism, pp. 109 -117, 612 -622, London: Rivingtons, 1912). Vol. VIII. da série Ante-Nicene Fathers contém traduções de várias cartas papais falsificadas da coleção Pseudo-isidoriana (Arthur Cleveland Coxe (editor de volume), Stewart Dingwall Fordyce Salmond (tradutor), The Decretals, Alexander Roberts e James Donaldson (editores da série), The Ante-Nicene Fathers, Vol. VIII., VI., pp. 609 -641, Nova York, NY: Charles Scribner's Sons, 1906).

[...]

O Dr. F. N. Funk, um erudito professor Católico Romano e historiador da Igreja, escreve sobre as Falsas Decretais:

Mas em meados do século IX uma nova obra surgiu na Gália ocidental; seu autor desconhecido descreve-se a si mesmo como Isidorus Mercator. As primeiras testemunhas da existência da obra são os Concílios de Soissons (853) e Quiercy (857), que fazem uso dela; eles indicam que ela foi composta entre os Francos, e a mesma conclusão será obtida se os manuscritos e as fontes utilizadas na coleção forem levadas em consideração. As Decretais em questão encontram-se em duas recensões, uma mais curta e outra mais longa, das quais apenas a última nos interessa no momento, tendo, em uma data inicial, completamente suplantado a outra. Além do prefácio e dos apêndices, ela se divide em três partes, das quais a primeira contém os 50 Cânones Apostólicos reconhecidos no Ocidente, 59 Decretais ou Bulas e Breves Papais datados desde Clemente I a Miltiades, e a carta pela qual foi feita a Doação de Constantino, a segunda apresenta os Cânones dos antigos Concílios, que aqui são copiados da coleção espanhola; a terceira parte contém os Decretais Papais de Silvestre I a Gregório II (314-731). Quanto ao objeto da coleção, o próprio escritor nos diz que desejava canonum sententias colligere et uno in volumineredigere et de multis unum facer - em outras palavras, que sua intenção era meramente a de compor um livro de referência de Direito Canônico. Sua intenção, entretanto, não é desculpa para suas falsificações em grande escala. As breves papais da primeira parte de sua obra são, todas elas, falsificações, e o mesmo se aplica a muitas incluídas na última parte da obra; tampouco pode o autor desejar perdão pelo fato de que grande parte do material que usa é realmente retirado de documentos primitivos. O mais provável é que sua verdadeira intenção fosse fortalecer a mão dos bispos contra os metropolitas e contra o poder secular. A essa intenção corresponde seu interesse em ampliar o ofício dos primazes e convencer o leitor de que causae maiores (pelo que ele quer dizer causae episcopates) só podem ser decididas por Roma. Pode também ter sido seu desejo de sanar até certo ponto as feridas produzidas na Igreja pelas guerras civis sob Lewis o Piedoso e seus filhos, e de melhorar a posição da Igreja. Seu esforço pode ter sido o de apoiar os Concílios de Paris (829, 846), Aachen (836) e Meaux (845), mas, seja este o caso ou não, Möhler certamente errou ao considerar isto como o objetivo principal da obra. 
Como a obra, no geral, é dedicada a justificar costumes que já estavam em poder, seria uma afirmação exagerada dizer que Pseudo-Isidoro fundou um sistema inteiramente novo de Direito Canônico. Mas a sua importância não deve ser subestimada. Ao reservar à Santa Sé a decisão das causae maiores, que antes era um privilégio dos sínodos provinciais, ele ajudou poderosamente a impulsionar a causa da primazia Romana.

As decretais foram utilizadas em Roma primeiramente por Nicolau I, que recorreu a elas quando anulou a decisão dos bispos da Gália, que em 864 haviam deposto Rothadius, bispo de Soissons (N.A. XXV, 1900, pp. 652-63; segundo o Hist. J. 1904, pp. 1-33, ele conhecia apenas algumas passagens das Decretais, e não encontrou nelas a sua pretensão), e ao longo da Idade Média elas foram geralmente consideradas genuínas. Foi apenas a força vinculante delas que foi questionada no início, por exemplo, por Hinkmar de Rheims no caso de seu sobrinho e homônimo de Laon. As primeiras dúvidas reais quanto à sua credibilidade foram expressas no século XV por Nicolau de Cusa e Juan de Torquemada, e embora as suas restrições não tenham conseguido abalar a profunda persuasão geral, no entanto, no século seguinte, assim que a coleção foi amplamente divulgada pela imprensa (foi impressa pela primeira vez por Merlin em sua Collectio Conciliorum, 1523), a natureza fraudulenta da composição foi apoiada em todos. Os argumentos apresentados pelo jesuíta Torres a favor da autenticidade dela contra os Centúrias de Magdeburg foram triunfantemente refutados pelo teólogo Protestante Blondel (Pseudo-Isidorus et Turrianus vapulantes, 1622).

(Funk, A Manual of Church History, Vol i., p. 287 - 289, Tradução Autorizada da 5ª Edição Alemã, 1910)

Esta obra tem o Imprimatur e Nihil Obstat das autoridades e censores Católicos Romanos, e a primeira edição foi publicada em 1886. Funk foi considerado como o sucessor do grande historiador da igreja Hefele. A Enciclopédia Católica escreve: "Em 1870 Funk foi nomeado professor extraordinário, e em 1875 professor ordinário de história da igreja, patrologia e arqueologia cristã, um cargo que ele ocupou até sua morte. Sua vida foi, doravante, inteiramente dedicada aos seus deveres profissionais e às pesquisas históricas, especialmente aos vários ramos da história da Igreja primitiva. … Entre os historiadores Católicos que a Alemanha produziu nas últimas três décadas, Funk foi sem dúvida a maior autoridade e o principal escritor histórico dos primeiros séculos da cristandade. Claro e puramente crítico no método, seu único objetivo era o estabelecimento da verdade histórica. Seu caráter era franco e consciente; sua vida era irrepreensível, pois se tornou ministro de Deus. Como um controversalista, ele podia ser severo quando um adversário se permitia ser influenciado por qualquer outro motivo que não fosse a demonstração da verdade exata. Seu método criou uma escola entre os historiadores Católicos da Alemanha que tem sido um benefício para o avanço da investigação histórica sincera e da crítica acadêmica".

Hefele menciona que as decretais Pseudo-isidorianas entraram nas coleções Romanas de Concílios, desde as primeiras coleções publicadas:
Sec. 12. Histórias dos Concílios.
James Merlin, cônego e principal penitenciário da igreja metropolitana de Paris, foi o primeiro que publicou uma coletânea dos atos dos concílios. Esta edição, naturalmente muito incompleta, apareceu em Paris em 1523, em um volume de fólio, em duas partes. Uma segunda impressão foi publicada em Colônia em 1530, enriquecida por dois documentos, a bula dourada de Carlos IV e a bula de Pio II, na qual ele proibiu um apelo do Papa a um concílio ecumênico. A terceira edição, in octavo, publicada em Paris em 1536, não teve adições. Como todas as coletâneas dos concílios que foram feitas posteriormente, com exceção da edição romana de 1609, a edição de Merlin continha, juntamente com os atos dos concílios ecumênicos, os de vários sínodos provinciais, bem como muitas decretais papais. Deve-se mencionar que somente este teve a coleção das falsas Decretais Isidorianas impressas de forma contínua, ao passo que nas coleções mais recentes elas estão distribuídas em ordem cronológica, atribuindo a cada concílio ou a cada Papa a parte que lhe foi atribuída por pseudo-Isidoro. (Os detalhes mais longos da edição de Merlin encontram-se na obra de Salmon, doutor e bibliotecário da Sorbonne, Traité de l’Etude des Conciles et de leurs collections, etc., nouvelle edition, Paris 1726, pp. 288 sq. e 724. Nesta última passagem Salmon ressalta as falhas das coleções de Merlin).
(Hefele, A History of the Christian Councils, Vol I., pp. 67-68, Segunda Edição, Revisada, 1894)

O padre Católico Romano Thomas Harding (1516 - 1572), em sua célebre controvérsia com o bispo anglicano John Jewel, defende a Supremacia Papal, citando o Pseudo-Anacleto:
Mas eu, neste tratado, procurando evitar a prolixidade, tendo tido a intenção de dizer algo a este número dos outros artigos, e sabendo que esta questão da primazia já é amplamente e bem tratada pelos outros, somente visitarei (por assim dizer) levemente neste momento, e não me lançarei rapidamente no profundo debate e tratamento da mesma. Primeiro, quanto ao direito da primazia pela lei de Deus, por estas antigas autoridades ele foi reconhecido. Anacleto, o santo bispo e mártir, estudioso de São Pedro, e a partir dele consagrado sacerdote, em sua epístola aos bispos da Itália, escreve assim: In novo … testamento, post Christum, &c. :“No novo testamento, a ordem dos sacerdotes começou depois de nosso Senhor Cristo, de Pedro; porque a ele foi primeiro concedido episcopado na igreja de Cristo, pois como nosso Senhor lhe disse: 'Tu és Pedro; e sobre esta pedra edificarei a minha igreja; e as portas do inferno não prevalecerão contra ela; e a ti darei as chaves do reino dos céus'. Assim, Pedro recebeu de nosso Senhor, primeiramente, o poder de ligar e desligar; e, primeiramente, levou as pessoas à fé, em virtude de sua pregação. Quanto aos outros apóstolos, eles receberam honra e poder em semelhante comunhão com ele, e quiseram que ele fosse o príncipe deles, ou governador chefe".

Em outra epístola a todos os bispos, aludindo ao mesmo texto, a favor da primazia da sé de Roma, falando da disposição das igrejas confiadas aos patriarcas e primazes, diz assim muito claramente: "Esta santa e apostólica igreja de Roma obteve a primazia, não dos apóstolos, mas do próprio Senhor e Salvador, e obteve a preeminência do poder sobre todas as igrejas, e sobre todo o rebanho do povo cristão, assim como Ele disse ao apóstolo bem-aventurado Pedro: 'Tu és Pedro; e sobre esta rocha'", &c.
 (The Works of John Jewel, 1845, Vol. I., p. 341)

Harding escreveu em 1564, antes dos latinos terem admitido amplamente a natureza falsa dessas decretais isidorianas, mas Jewel responde com boas razões para duvidar da autenticidade das mesmas. Vale a pena ler todo o capítulo de Jewel contra a supremacia do Bispo de Roma, bem como os seus outros excelentes artigos.

O Papa Nicolau I, em sua sexta epístola, dirigida a São Fócio, diz:
Mas os decretos feitos pelos santos papas da sé principal da Igreja Romana, por cuja autoridade e sanção todos os sínodos e santos concílios são fortalecidos e estabelecidos, por que dizeis, que não os recebeis e observais?

(Decretalia autem, quæ a sanctis Pontificibus primæ sedis Romanæ Ecclesiæ sunt instituta, cujus auctoritate atque sanctione omnes Synobi et sancta Concilia roborantur, et stabilitatem sumunt, cur vos non habere vel observare dicitis?)
(Conc. Labb., tom. viii., Nicolai Papæ I. epist. vi., ad Photium, col 285, D., Paris 1671; citado em Charles Elliot,1877, Quarta Edição, Delineation of Roman Catholicism, Livro III., Cap. XI., p. 672).


Os membros da Igreja latina continuaram citando documentos falsos em sua tentativa de persuadir os gregos durante as tentativas de reunião do século XV.

O padre Ortodoxo russo Sergius Bulgakov (1871 -1944) observa:
Vale observar que João de Ragusa, na sua resposta a Bessarion, justificou o poder do papa sobre os bispos como seus vigários pelo fato de São Pedro ter nomeado patriarcas, metropolitas e bispos para várias dioceses; em apoio a isso, citou uma passagem espúria do Anaclite de pseudo-Isidoro, e um texto também espúrio do 6º cânon do 1º Concílio de Nicéia. (O texto tinha sido provado como espúrio no IV Concílio Ecumênico de 451, onde os legados papais tinham tentado fazer uso dele). Nos seus argumentos João de Ragusa também se referiu ao texto notoriamente espúrio Donatio Constantini - um documento que já tinha sido provado ser falso por Laurentius Valla e Nicolau Cusanus (Hefele VII. 733).
(Bulgakov, The Vatican Dogma, III., South Canaan, PA: St. Tikhon Press, 1959 [Originalmente Paris, 1929].)

De acordo com a Enciclopédia Católica, João de Ragusa (1380 -1443) foi:
um teólogo dominicano, presidente do Concílio de Basileia, legado a Constantinopla ... Em razão de suas grandes proezas em teologia, escritura e línguas orientais, foi considerado um oráculo em sua Dalmácia, sua terra natal. Na Universidade de Paris brilhou de forma notável e lá recebeu o chapéu de doutor por volta do início do século XV. No ano de 1426 foi nomeado procurador geral da Ordem Dominicana, e foi residir em Roma sob o Papa Matinho V. Lá recebeu notas de honra e estima do Papa e do Colégio dos Cardeais, e o Papa o nomeou teólogo papal para o Concílio Geral de Basileia.
(Albert Reinhart, John of Ragusa, The Catholic Encyclopedia, Vol. VIII., p. 476, New York, NY: Robert Appleton Company, 1912).  João alcançou muitos outros diferenciais e foi um personagem importante nas discussões a respeito da reunião das Igrejas Orientais e Ocidentais.

Basilios Bessarion (Vissarion) (1403 -1472) se converteu ao Catolicismo Romano vindo da Ortodoxia, e tornou-se Cardeal Católico Romano e Patriarca Latino de Constantinopla.

Destaca-se também que João de Ragusa cita amplamente a partir dos textos espúrios de Cirilo (pp. 139 sq., 145 sq.) em seu sermão inaugural "Fiet unum ovile et unus pastor" proferido em Pavia, em 23 de abril de 1423, no Concílio de Pavia-Siena.  Muitas outras partes de seus sermões são baseadas na obra Contra errores Graecorum de Aquino (Walter Brandmüller, Das Konzil von Pavia-Siena 1423-1424, Vol. II., Sermones, Nr. 2, Münster, 1974.)

O padre Católico Romano Francês Gratry escreve:
Todos os nossos irmãos no sacerdócio possuem a obra Teologia Moral de Santo Afonso Ligório.  Todos podem consultar, em algum lugar ou outro, a obra de Belarmino, De Romano Pontifice.  Por exemplo, tenho diante de mim o capítulo em questão, de S. Ligório [S. Liguori, Theologia Moralis, t. i., De Infallibilitate Papæ. Ed. Mellier, p. 109 et suiv.].  Ele reúne todas as passagens de Melchior Cano e de Belarmino, e mantém que o Papa é absolutamente infalível. Ele começa citando uma passagem de Santo Irineu: "Todos devem necessariamente depender da Igreja Romana, como sua fonte e cabeça". “Omnes a Romana Ecclesia necesse est ut pendeant, tanquam a fonte et capite.” Esta passagem é uma pura invenção.  Ela não pode ser encontrada em Santo Irineu.  S. Ligório a copiou de algum lugar ou outro, sem verificá-la. Depois disso, nosso querido santo admite como verdade as duas cartas falsas de Santo Atanásio, citadas por Melchior Cano. Ele então enumera toda a lista das falsas decretais produzidas pelo mesmo autor.  “Idemque senserunt plures alii Pontifices, Evaristus, Alexander I., Sixtus I., PiusI., Victor, Zephyrinus, Marcellus, Eusebius, et alii quos refert Cano.”  ...  Melchior Cano foi enganado pelo falsificador, Belarmino por Melchior Cano, S. Ligório por todos os outros.
(T. J. Bailey (tradutor), Auguste Gratry, Second Letter to Monseigneur Dechamps, I., pp. 14 -15, Londres: J. T. Hayes, 1870; Coulton observa:  "Dr. Franz Meffert, talvez o mais recente biógrafo Ultramontano de Santo Alfonso Ligório, confessa que Döllinger estava certo em sua mais séria acusação; isto é, que Ligório, ao defender a Infalibilidade contra Febronius, baseou alguns de seus argumentos em citações retiradas das Decretais Falsas, mesmo tendo mostrado em momentos diferentes, em dois lugares distintos, o conhecimento de que essas Decretais eram falsas". (George Gordon Coulton, Papal Infallibility, Apêndice IX., p. 269, Londres: The Faith Press, 1932))

Em tempos recentes, uma importante descoberta foi feita acerca de uma falsificação associada ao Pseudo-Isidoro.  Esta componente do complexo de falsificações é uma coleção de trechos dos Atos do Concílio de Calcedônia, intitulada Nonnullæ Sanctiones Sparsim Collectæ Actionis Primæ Sancti et Magni Chalcedonensis Concilii. O autor do Pseudo-Isidoro criou essa falsificação, que ajudou a corromper o registro autêntico de Calcedônia para favorecer a primazia papal e a jurisdição Romana.  Eric Knibbs, professor assistente de História na Williams College em Williamstown, MA, especialista nas falsificações Pseudo-Isidorianas, escreve o seguinte ao abordar uma interpolação nesta coleção:
Os trechos concentram-se no poder episcopal, na jurisdição Romana e na interferência secular nos assuntos eclesiásticos; em alguns lugares o texto foi interpolado ou revisado de forma inautêntica.  ...  Como disse acima, o Nonnullae sanciona alguns dos textos de Calcedônia na forma interpolada. Como era de se esperar, essas interpolações correspondem a adições marginais em Lat. 11611.  ... A anotação na margem [foto acima] é uma das adições inautênticas do Pseudo-Isidoro à ata conciliar; ela diz “... quod apostolicae sedis missi prius semper debeant iudicare ...” (“que os mensageiros da sé apostólica devem sempre julgar primeiramente...": muitas das interpolações têm a ver com prerrogativas papais).

(Eric Knibbs, Pseudo-Isidore: A Blog, Another Component of the Forgery Complex, or, Pseudo-Isidore’s Autograph, (http://pseudoisidore.blogspot.com/2010/04/another-component-of-forgery-complex-or.html)  8 de Abril de 2010.)

O estudo básico desta falsificação caledoniana é Klaus Zechiel-Eckes, Verecundus oder Pseudoisidor?  Zur Genese der Excerptiones de gestis Chalcedonensis concilii, in Deutsches Archivfür Erforschung des Mittelalters, Vol. LVI., pp. 413 –446, Cologne: Böhlau Verlag, 2000.


Doação de Constantino
“Ahi, Constantin, di quanto mal fu matre,
Non la tua conversion, ma quella dote,
Che de te prese il primo ricco patre!”
(Dante, Inferno, xix., 115 – 117)
Afresco do século XIII mostrando Silvestre I e Constantino o Grande, mostrando a falsa Doação.
A doação de Constantino é um documento conhecido que foi citado inúmeras vezes para reforçar as reivindicações do papado, e tem um lugar na coleção das Decretais Pseudo-Isidorianas. Ele começa com as seguintes afirmações significativas:
O Imperador Constantino, no quarto dia após seu batismo, conferiu este privilégio ao Pontífice da Igreja Romana, de que em todo o mundo romano os sacerdotes o considerassem como sua cabeça, como juízes tratam o rei. Neste privilégio está, entre outras coisas, o seguinte: "Nós - juntamente com todos os nossos sátrapas, e todo o senado e meus nobres, e também todo o povo sujeito ao governo da gloriosa Roma - consideramos aconselhável que, assim como o Bem-aventurado Pedro foi constituído como vigário do Filho de Deus na terra, assim também os Pontífices, representantes desse mesmo chefe dos apóstolos, devem obter de nós e do nosso império o poder de uma supremacia maior do que aquele que possui a clêmencia terrena da nossa serenidade imperial, escolhendo esse mesmo chefe dos apóstolos e seus vigários para serem nossos contínuos intercessores junto a Deus. E na medida do nosso poder imperial terreno, decretamos que a sua santa Igreja romana deverá ser honrada com veneração, e que mais do que o nosso império e trono terreno a mais sagrada sé do Bem-aventurado Pedro deverá ser gloriosamente exaltada, tendo nós concedido a ela poder, e dignidade de glória, e vigor, e honra imperial.  E nós ordenamos e decretamos que ele deverá ter a supremacia também sobre as quatro sés principais, Alexandria, Antioquia, Jerusalém e Constantinopla, como também sobre todas as igrejas de Deus em toda a terra. E o Pontífice, que na ocasião deverá estar à frente da própria santa igreja romana, deverá ser mais exaltado do que todos os sacerdotes do mundo inteiro e chefe sobre todos eles, e segundo o seu juízo tudo o que é provido para o serviço de Deus e para a estabilidade da fé dos cristãos deve ser administrado.

E a seguir: 1. Às igrejas dos bem-aventurados apóstolos Pedro e Paulo, para a provisão das luzes, conferimos propriedades terrestres de posses, e as enriquecemos com diferentes objetos, e através de nosso sagrado mandato imperial lhe concedemos de nossas propriedades no oriente e no ocidente, e até mesmo nas regiões norte e sul; nomeadamente, na Judéia, Grécia, Ásia, Trácia, África e Itália e nas várias ilhas; sob esta condição, de fato, que todas serão administradas pela mão do nosso mais abençoado Pai, o supremo Pontífice, Silvestre, e seus sucessores.
E a seguir: 2. E ao nosso Pai, o Bem-aventurado Silvestre, supremo Pontífice e Papa universal, da cidade de Roma, e a todos os Pontífices, seus sucessores, que se sentarão na sé do Bem-aventurado Pedro até o fim do mundo, nós concedemos o nosso palácio imperial de Latrão, e depois o diadema, isto é, a coroa da nossa cabeça, e ao mesmo tempo a tiara e também a faixa dos ombros, - isto é, a cinta que normalmente envolve o nosso pescoço imperial; e também o manto púrpura e a túnica escarlate, e todas as vestes imperiais; e também o mesmo posto dos que presidem a cavalaria imperial, conferindo também até mesmo os cetros imperiais, e ao mesmo tempo todos os estandartes, e as bandeiras, e os diferentes ornamentos, e toda a pompa de nossa eminência imperial, e a glória de nosso poder.

(Christopher B. Coleman, The Treatise of Lorenzo Valla on the Donation of Constantine, pp. 10 - 15, New Haven, CT: Yale University Press, 1922)

Christopher B. Coleman, professor universitário americano de história no início do século XX especializado nas lendas sobre Constantino, afirma que a Doação de Constantino "foi citada por não menos que dez Papas dos quais conhecemos, isto sem mencionar escritores menores, em disputas pelo reconhecimento do controle papal, e contribuiu muito para o prestígio do Papado". (The Treatise of Lorenzo Valla on the Donation of Constantine -  Texto e tradução para o inglês, por Christopher B. Coleman, 1922)

A Enciclopédia Católica afirma que "este documento é sem dúvida uma falsificação, fabricada entre os anos 750 e 850", e que o documento foi geralmente considerado autêntico até o século XV, tendo sido exposto pelo Tratado de Lorenzo Valla em 1440 que "provou com certeza ser uma falsificação".

Entretanto, mesmo depois desse tratado, "sua genuinidade ainda foi ocasionalmente defendida, e o documento ainda foi usado como autêntico, até que Barônio em seu 'Annales Ecclesiastici' (ad an. 324) admitiu que a 'Donatio' era uma falsificação, após isso foi universalmente admitida como tal".

Os Anais Eclesiásticos de Barônio é uma obra clássica de grande escala sobre a história da Igreja, e foi publicada por volta do final do século XVI. A resposta mais notável a Valla e defesa da Doação foi feita por Agostinus Steuchus (também chamado Agostine Steuco ou Eugubinus, 1497 - 1548), um estudioso italiano, bispo de Chisamo em Creta, e bibliotecário do Vaticano. Steuchus publicou duas respostas a Valla. Em 1530 escreveu "Pro religione christiana adversus Lutheranos", e em 1547 escreveu "Contra Laurentium Vallam de falso donation Constantini libri duo" (veja Ronald K. Delph, Journal of the History of Ideas, Vol. LVII., No, 1., Jan. 1996, pp. 55 - 77)

A primeira vez que um papa citou oficialmente a Doação de Constantino foi o Papa Leão IX em sua carta ao Patriarca Miguel Cerulário de Constantinopla, em 1054, na véspera do Grande Cisma, o que mostra que os latinos se separaram da Igreja baseando-se em informações incorretas. Diz a Enciclopédia Católica:
O primeiro papa que a usou em um ato oficial e que se apoiou nela foi Leão IX; em uma carta de 1054 a Miguel Cerulário, Patriarca de Constantinopla, ele cita a "Donatio" para mostrar que a Santa Sé possuía tanto um império terreno quanto um império celestial, o sacerdócio real. A partir de então a "Donatio" adquire maior importância e é mais frequentemente usada como evidência nos conflitos eclesiásticos e políticos entre o papado e o poder secular. Anselmo de Lucca e o Cardeal Deusdedit a inseriram em suas coleções de cânones. Graciano, é verdade, a excluiu de seu "Decretum", mas logo foi acrescentada a ele como "Palea". Os escritores eclesiásticos em defesa do papado durante os conflitos do início do século XII a citaram como autoritativa (Hugo of Fleury, Deregiâ potestate et ecclesiasticâ dignitate, II; Placidus of Nonantula, De honore ecclesiæ, cc. lvii, xci, cli; Disputatio vel defensio Paschalis papæ, Honorius Augustodunensis, De summâ gloriæ, c. xvii; cf. Mon. Germ. Hist., Libelli de lite, II, 456, 591, 614, 635; III, 71). São Pedro Damião também se apoiou nela em seus escritos contra o antipapa Cadalous de Parma (Disceptatio synodalis, em Libelli de lite, I, 88). O próprio Gregório VII nunca citou este documento em sua longa luta pela liberdade eclesiástica contra o poder secular.  Mas Urbano II fez uso dela em 1091 para apoiar suas reivindicações em relação à ilha da Córsega. Papas posteriores (Inocêncio III, Gregório IX, Inocêncio IV) tomaram sua autoridade como certa (Inocêncio III, Sermo de sancto Silvestro, em P.L., CCXVII, 481 sqq.; Raynaldus, Annales, ad an. 1236, n.24; Potthast, Regesta, no. 11,848), e escritores eclesiásticos muitas vezes apresentaram a evidência da mesma em favor do papado.
Da "Enciclopédia Católica" (http://www.newadvent.org/cathen/05118a.htm)

Jean-Edmé-Auguste Gosselin (1787 - 1858), padre Católico Romano francês e diretor do seminário, escreve:
Depois que este texto foi inserido nas coleções das Falsas Decretais, ele foi citado por muitos autores, que nunca imaginaram que houvesse a menor dúvida razoável sobre sua autenticidade.  Foi citado pela primeira vez por dois autores franceses; Æneas, bispo de Paris, num tratado contra os gregos, composto por volta do ano 867; e Hincmar de Rheims, numa Carta aos barões franceses, escrita por volta do ano 882.  Embora nenhum destes autores cite as palavras deste documento, eles manifestamente assumem sua existência; e o primeiro afirma que cópias do mesmo foram preservadas nas bibliotecas de várias igrejas francesas.  O Papa Leão IX cita longos extratos dele em sua carta a Miguel Cerulário, patriarca de Constantinopla, em 1054, para estabelecer contra os gregos a jurisdição espiritual e temporal da Santa Sé.  São Pedro Damião também cita alguns extratos dele em sua Discussão Sinodal, compilada por volta do ano de 1062.  Longos trechos dele também são encontrados em uma coleção de cânones, compilada por Santo Anselmo de Lucca na mesma época; e também no Decreto de Ivo de Chartres, e de Graciano, que surgiu no decorrer do século seguinte.

Há, no entanto, razões para acreditar que, embora a doação de Constantino tenha sido tão confiantemente citada por esses autores, a autoridade da mesma não foi universalmente admitida; pois não é mencionada por muitos autores dos séculos X e XI, que não poderiam ignorar a sua existência, nem omiti-la, se acreditassem que a sua autenticidade era inquestionável.  Mesmo Gregório VII não a cita em muitas das cartas em que ele reúne com tanto cuidado todos os argumentos e autoridades favoráveis ao poder extraordinário que ele reivindicou sobre os soberanos.
(Jean-Edmé-Auguste Gosselin, The Power of the Pope During the Middle Ages, Vol. I., Confirmatory Evidence, V., pp. 317 -318, tr. pelo Rev. Matthew Kelly, Biblioteca de Traduções de literatura estrangeira selecionada, Vol. I., Londres: C. Dolman, 1853)

Gosselin também observa:
A edição mais completa das Falsas Decretais encontra-se no Collectio Concil de Merlin, tom. 1. Paris, 1524, 2 vols. fol. A mesma edição foi reimpressa com algumas mudanças na Coleção dos Concílios de Crabbe, Colônia, 1551, 3 vols. fol. A doação de Constantino aparece em ambas as edições.
(Op. cit., p. 317)

Apesar de Gosselin e a Enciclopédia Católica dizer que o Papa Gregório VII nunca usou a Doação, seu amigo próximo Cardeal Deusdedit de San Pietro em Vincoli (+ 1097 - 1100, provavelmente 1099) a inseriu em sua coleção de cânones, e a Enciclopédia Católica diz de Deusdedit:
Foi amigo de São Gregório VII e defensor de suas medidas de reforma; Deusdedit juntou-se à Ordem Beneditina e tornou-se um zeloso promotor das reformas eclesiásticas na segunda metade do século XI.  O Papa Gregório VII o elevou ao cardinalato com o título de San Pietro em Vincoli. ... Em 1078, participou de um sínodo Romano, no qual representou as opiniões de Berengarius de Tours.  No longo conflito pela liberdade da autoridade eclesiástica contra a opressão do poder civil Deusdedit, ao lado de Gregório VII, foi um de seus principais agentes e defensores. Por sugestão evidentemente deste papa, ele elaborou uma compilação de uma coleção de cânones que completou em 1087 e dedicou a Victor III....  Ele pretendia que esta obra defendesse os direitos e a liberdade da Igreja e a autoridade da Santa Sé, de acordo com as medidas de Gregório VII e seus adeptos.  Ao mesmo tempo, esta Coleção revela Deusdedit como um dos mais importantes dos canonistas pré-gracianos. ...  Possivelmente também Deusdedit foi o editor desta famosa e importante coleção de correspondências de Gregório.  Neste caso, o cardeal aparece sob uma nova luz como conselheiro íntimo e herdeiro intelectual de Gregório VII.
(Johann Peter Kirsch, Cardinal Deusdedit, Catholic Encyclopedia, Vol. IV., 1908)

Assim escreve ainda o historiador Protestante Frank Zinkeisen:
Mais meio século se passa antes de ouvirmos falar novamente da "Doação".  Para provar a superioridade da igreja de Roma, Leão IX, em 1054, enviou uma longa carta a Miguel, o patriarca de Constantinopla.  O fato de quase todo o texto da 'Doação' propriamente dito estar inserido nela demonstra a crença implícita que o papa parece ter tido no documento espúrio.  No mesmo ano, Leão IX, mais uma vez, invocou o grande nome de Constantino, mas sem efeito.  Após sua derrota pelos normandos na Civita, em 1054, ele fez as pazes com seus inimigos, mas sem intenção de ser definitiva; pois ele enviou mensageiros com uma carta a Constantinopla para implorar ao imperador oriental que tomasse parte com o imperador alemão na vingança de seus equívocos.   Nessa carta o papa implorou ao imperador que entregasse à santa sé tudo o que Constantino e seus sucessores outrora haviam concedido.  Não houve resposta ao pedido, e o papa pouco tempo depois faleceu. Em contraste significativo com a franca confiança do Papa Leão encontra-se a reserva de Gregório VII.  Ainda assim, não parece estritamente verdadeiro dizer que ele nunca menciona sequer a "Doação"; pois no juramento que Gregório exigiu de Rudolf da Suábia há aparentemente uma alusão à doação espúria: De ordinatione vero ecclesiarum et de terris vel censu quae Constantinus imperator vel Carolus sancto Petro dederunt ... ita conveniam cum papa, ut periculum sacrilegii ... non incurram. Talvez Gregório tivesse em mente a "Doação" quando, em seu famoso dictatus, afirmou que "só o Papa pode utilizar a insígnia imperial", que, certamente, sempre permaneceu uma reivindicação vazia.

Por fim, há outro caso que é mais pertinente, mas ainda mais duvidoso do que os dois anteriores.  Numa carta aos reis e príncipes da Espanha, o papa afirma que regnum Hispaniae ex antiquis constitutionibus beao Petro et sanctae Romanae ecclesiae in ius et proprietatem esse traditum. Ora, a 'Doação' de Constantino é chamada de Exemplar Constituti Domni Constantini Imperatoris num manuscrito do século IX ou X, e esta cópia que Gregório poderia ter visto e tido em mente.   Mas em que base delicada repousa essa hipótese fica duplamente clara quando examinamos outra carta do papa sobre o mesmo assunto, na qual a Espanha é meramente reivindicada como "desde a antiguidade propriedade de São Pedro".  Na realidade, parece-me mais do que provável que a política de Gregório era não invocar a falsa 'Doação', pois em dois casos ele é cuidadoso ao nomear o concedente das terras que ele reivindica para a santa sé.
(F. Zinkeisen, The Donation of Constantine as Applied by the Roman Church, The English Historical Review, Vol. IX., No. 36, Oct., 1894, pp. 627–628, Oxford University Press, 1894.)

Sobre o uso da Doação de Constantino pelo Papa Leão IX, Döllinger escreve:
O Papa Leão IX reproduziu quase todo o texto da Doação ao patriarca Miguel Cerulário no ano 1054, de forma aberta e confiante, sem ter (como parece) uma única dúvida quanto à fraqueza do seu documento. Ele desejava que o patriarca se convencesse "do império terreno e do império celestial, do sacerdócio real da Cátedra Romana", e não mantivesse nenhum vestígio de suspeita de que essa cátedra "desejava usurpar o poder com a ajuda de fábulas tolas e de velhas esposas". Ele é, no entanto, o único de todos os papas que trouxe o documento expressamente diante dos olhos do mundo, e desafiou formalmente as críticas.
(Döllinger, Fables Respecting the Popes of the Middle Ages, Parte I., Cap. V., p. 134. Recomendamos a totalidade dos dois capítulos de Döllinger sobre Constantino, intitulados "Constantino e Silvestre" e "A Doação de Constantino", Parte I., Cap. IV. - V., pp. 88 - 182).
[...]

João de Salisbury (1115/1120 - 1180), distinto bispo e estudioso Católico Romano, também cita a Doação de Constantino, em apoio ao Papa Adriano IV, conferindo a Henrique II, rei da Inglaterra, o domínio sobre a ilha da Irlanda em 1155. Döllinger escreve: 
Adriano não menciona a Doação de Constantino em sua Bula; mas seu amigo e confidente, João de Salisbury, aquele que, segundo sua própria confissão, o induziu a dar esse passo tão carregado de consequências, cita a Doação do primeiro imperador crente como o fundamento desse "direito de São Pedro" sobre todas as ilhas.
(Döllinger, Fables Respecting the Popes of the Middle Ages, p. 138)

Döllinger também escreve: 
Numa crônica da igreja de Santa Maria del Principio, afirma-se que Constantino deu todo o reino da Sicília de ambos os lados do estreito, junto com outras posses, ao papa Silvestre; a cidade de Nápoles foi a única coisa que ele reservou como propriedade imperial.
Döllinger observa que, "A crônica parece pertencer ao final do século XII ou início do século XIII". (Döllinger, Fables Respecting the Popes of the Middle Ages, p. 139).

Otto de Freising (1111/1114 - 1158, também Friesingen) foi um influente nobre, historiador, abade e bispo Católico Romano. Döllinger escreve sobre a crônica de Otto de Freising:
Em sua crônica, que foi composta entre 1143 e 1146, ele afirma a autenticidade [1] da Doação, e relata como Constantino, após conferir a insígnia imperial ao papa, foi para Bizâncio, acrescentando que "por esta razão a Igreja Romana afirma que os reinos ocidentais foram cedidos à sua posse por Constantino, e exige deles tributos até hoje, com exceção dos dois reinos dos Francos" (ou seja, o reino francês e o alemão).
[Nota de rodapé:] 1. Chron. 3, ap., Urstis. f., 80.
(Döllinger, Fables Respecting the Popes of the Middle Ages, p. 144.)

Luitprand (ou Luidprand) ou Cremona (920 - 972), cerca de 968 - 969, bispo latino no norte da Itália que fez importantes missões como embaixador na corte bizantina de Constantinopla, faz referência à Doação de Constantino. (F. Zinkeisen, The Donation of Constantine as Applied by the Roman Church, p. 628).

Em seu capítulo, Döllinger menciona outros Católicos Romanos que foram mais cautelosos no uso da Doação, mas que ainda a citaram ou aludiram a ela em favor do Papado, incluindo o Bispo Sicard de Cremona (1155 - 1215), Arcebispo Romuald Guarna de Salerno (1110/1120 - 1181/1182), Roberto Abolant (+ 1214), Bispo Tolomeo de Lucca (ou Batholomew Fiadóni, 1236 - 1327), Amalrich Augerii (ou Amalricus Augerii, século XIV), Bispo Lucas de Tuy (+ 1249), Balduin de Ninove (ou Baudouin de Ninnove, escreveu uma Crônica até 1294), Godfrey de Viterbo (ou Gottfried, 1120 - 1196), Gervasius de Tilbury (ou Gervase, 1150 - 1220), Cónego Rudolf ou Pandulf Colonna (século XIV), Arcediago Nicholas de Clamenge (ou Mathieu-Nicolas Poillevillain de Clémanges, 1360 - 1434/1440). O pároco de Strasburg, joão Hug de Schlettstadt, defendeu a Doação por volta do final do século XV, juntamente com o jurista Pedro de Andlo (ou Petrus de Andlo, 1420 -1480).

Na conclusão de seu capítulo, Döllinger escreve:
Por outro lado, Nicolas Tudeschi, considerado por seus contemporâneos como o maior de todos os canonistas, declara que aquele que nega a Doação encontra-se sob suspeita de heresia. O Cardeal P. P. Parisius, e o bispo espanhol, Arnold Albertinus, declaram o mesmo. Quem declara nula e sem valor a Doação, diz este último, aproxima-se muito de heresia; mas quem afirma que nunca ela ocorreu, encontra-se em um caso ainda pior. Antonius Rosellus, e Ludwig Gomez possuem a mesma opinião; e o cardeal Hieronymus Albano declara assim, ao menos, que existem pessoas sem vergonha que se recusam a se submeter ao "unanimis consensus tot ac tantorum Patrum", com respeito à Doação; ou, segundo a expressão de Petrus Igneus, à "tota academia Canonistarum et Legistarum", com toda a hoste de teólogos. Mas depois que o Cardeal Barônio confessou de uma vez por todas a inautenticidade da Doação, todas essas vozes, que pouco antes haviam sido tão numerosas e tão barulhentas, se tornaram silenciosas.
(Döllinger, Fables Respecting the Popes of the Middle Ages, p. 180 – 181.)

Gabriel de Mussis (ou Giovanni de' Mussi, 1280 - 1356), notário e cronista italiano, alude ao domínio temporal concedido a Silvestre, embora ele diga que este foi a fonte de inúmeros males e guerras, e argumenta contra o poder temporal concedido aos eclesiásticos (E. R. Chamberlin, The Bad Popes, (citação introdutória), Nova York, NY: Dorset Press, 1969).

O Dr. Johannes Fried, historiador e professor alemão, escreve sobre a invenção pseudo-Constantina, e sua exposição em numerosos afrescos em Roma:
a Reforma, que usou o documento falsificado como propaganda contra o pontífice Romano, viu o lado papal reafirmar a autoridade do mesmo. Isto foi proclamado por uma longa série de autores canonistas; significativamente, o comentário sobre Graciano por João de Torquemada, o canonista erudito e ex-cardeal "anticonciliarista", com sua defesa completamente sem originalidade da "Doação" - de fato do governo papal em geral - foi então impresso (1553). Foi exposto em uma elaborada sequência de afrescos solicitados (de Giulio Romano e Gianfrancesco Penni) por Clemente VII (1523-34) na "Sala di Constantino" do Palácio do Vaticano, adaptando os que Rafael tinha pintado para Leão X (1513-1521), e no final do século na Basílica de Latrão por Clemente VIII em 1597.
(Johannes Fried, Donation of Constantine and Constitutum Constantini: The Misinterpretation of a Fiction and Its Original Meaning, 2007, Introdução, p. 3). Este livro é um bom estudo sobre a Doação. A história de Wala de Corbie e Hilduin de São Denis (pp. 96 - 109) é bastante interessante.

Graciano, fazendo uso de outras histórias falsas sobre Constantino, diz: "É suficientemente claro que o Papa não pode ser atado ou solto pelo poder secular, visto que se concorda que ele foi chamado de um Deus pelo piedoso príncipe Constantino, e é evidente que um Deus não pode ser julgado pelos homens" (Gratian's Dist., 96, 7; citado em Literary Forgeries, 1907, James Anson Farrer, p. 142).

Gilbert Génebrard (1535 -1597), arcebispo de Aix e erudito francês, refere-se a falsas lendas de Constantino como genuínas, dizendo que a Silvestre e seus sucessores Constantino deu, como um presente, Roma, e todas as vestes e adornos imperiais; e acrescenta a autoridade de Eugubinus e Fócio para a sua declaração:  “Huic et ejus successoribus Constantinus Imp. dono dedit Romam et Omnia imperatoria indumenta ac ornamenta; ut manifese probat Eugubinus duobus libris, et testatur Photius patriarcha Græcus, tit. 8.” (Génebrard’s Chronicles, Paris, 1580, p. 216;  citado em A Protestant Text Book of the Romish Controversy, p. 271)

Johannes Vergenhans (Nauclerus) (1425 -1510), um eminente historiador e estudioso que é listado pela Enciclopédia Católica como um dos "distintos professores" da Universidade de Tübingen, ao defender a autenticidade da Doação de Constantino, relata a Doação como sendo afirmada na história de Isidoro, no entanto, isto baseia-se em informações falsas, e um estudioso Protestante responde: "Mas nas cópias antigas de Isidoro não se encontra tal coisa".  (The Acts and Monuments of John Foxe, 1841, p. 301)

O Cardeal Cencius Savelli, que mais tarde tornou-se Papa Honório III (1216 -1227), incluiu a doação no "Liber censuum Romanae ecclesiae", que completou em 1192, enquanto era camareiro papal.  A Enciclopédia Católica diz que esta obra foi "talvez a fonte mais valiosa para a história da economia papal durante a Idade Média". Ela compreende uma lista das rendas da Sé Apostólica, um registro das doações recebidas, privilégios concedidos e contratos feitos com cidades e governantes".
(http://www.newadvent.org/cathen/07457a.htm)

João Huss (Jan Hus) (1372 -1415), um influente precursor dos Reformadores protestantes, que foi queimado na fogueira por heresia contra a Igreja Católica Romana, cita e escreve várias páginas discutindo as decretais Pseudo-isidorianas e outros documentos falsos em seu Tratado sobre a Igreja, considerado seu escrito mais importante.  Ele cita as cartas espúrias do Papa Marcelo nas pp. 82 sq., 214 sq., e Anacleto nas pp. 82, 110, 152, 155, 211, como suportando o poder papal, aceitando esses documentos como verdadeiros, e eles influenciam significativamente a sua eclesiologia. Entretanto, ele procura dar uma interpretação menos ultramontana às palavras do Papa Anacleto, e critica as declarações do Papa Marcelo, dizendo que ele cometeu erros, e que "certamente este papa fala de forma confusa". (p. 215).  Além disso, Huss cita uma falsa decretal do Papa Gelásio, a Doação de Constantino e um pacto espúrio entre o Imperador Lewis e o Papa Pascal, sobre o qual o editor comenta "Este pacto entre Lewis e Pascal, 817-824, é encontrado pela primeira vez em Anselmo de Lucca, d. 1073, e é considerado totalmente espúrio ou pelo menos em grande parte interpolado". (pp. 150 sq.) (John Huss, De Ecclesia: The Church; Tr. Ing. pelo Dr. David S. Schaff, Nova York, 1915).

A Doação de Constantino no início não foi inquestionável no Ocidente, embora muitos a tenham adotado mais tarde.  Henry Charles Lea (1825 -1909), um historiador Protestante americano, observa:
Por volta do ano 1000, Otho., em uma doação para Silvestre II. aproveita a ocasião para denunciar a doação de Constantino como uma ficção: “Hæcsunt enim commenta ab illis ipsis inventa, quibus Joannes diaconus, cognomento digitorum mutius (mutilus) præceptum aureis litteris scripsit, sub titulo magni Constantini longa mendacii tempora finxit. ... Spretis ergo commenticiis præceptis et imaginariisscriptis, ex nostra liberalitate sancto Petro donamus quæ nostra conferimus.” (Baronius, ann. 1191, No. 57.) E não muito depois, em uma doação de São Henrique II, confirmando as liberdades anteriores dos imperadores, nenhuma menção aparece no recital sobre o presente de Constantino, mostrando que ela ainda era considerada como inautêntica (Lünig Cod. Ital. Diplom. II. 698).
Isto logo acabou, no entanto, e qualquer dúvida sobre a autenticidade da doação foi tomada como tendo origem em uma inimizade indigna às justas reivindicações de São Pedro.  Por volta do ano 1150 Geroch de Reichersperg escreve: “Memini enim cum in urbe Romana fuissem, fuisse mihi objectum a quodam causidico ecclesiæ Dei adversario, non esse rata privilegia imperatoris Constantini ecclesiasticælibertati faventia, eo quod ipse vel baptizatus vel rebaptizatus fuisset in hæresi Ariana, ut insinuare videtur historia tripartita.” (Geroch. Expos. in Psalm. LXIV.)  O estudo revivido da jurisprudência imperial pode muito bem levar um jurista astuto a duvidar da subserviência de um imperador Romano, mas ele achou prudente justificar sua incredulidade pelo arianismo de Eusébio de Nicomedia, de quem o imperador, em seu leito de morte, recebeu o rito do batismo.

A vitalidade persistente infundida nestas falsificações pelo sucesso delas em estabelecer o poder papal é demonstrada pelo erudito Christianus Lupus, já tarde no final do século XVII, aludindo à doação de Constantino com muita confiança como se sua autenticidade nunca tivesse sido questionada (Chr. Lupi Opp. II. 261).
(Henry Charles Lea, Studies in Church History, The Rise of the Temporal Power, p. 167, Philadelphia, PA: Henry C. Lea’s Son & Co., 1883)

É significativo que a edição oficial do Direito Canônico Romano em 1582, o "Corpus Juris", defendeu a Doação de Constantino. Já mencionamos que Bartoli ressaltou que esta obra manteve as decretais Pseudo-isidorianas.  Os estudiosos que compuseram esta obra são referidos como os Correctores Romani, ou Corretores Romanos, que comentaram extensivamente sobre Graciano:
Os Corretores Romanos eram um grupo de estudiosos predominantemente humanistas que, na sequência do Concílio de Trento, se empenharam em editar os textos do direito canônico. ... Três dos cinco cardeais que compuseram o cerne da congregação original (estabelecida em 1566 sob a direção do Papa Pio V) eram estudiosos renomados: Ugo Buoncompagni (mais tarde Papa Gregório XIII), provavelmente o canonista mais experiente da cúria papal; Guglielmo Sirleto, especialista em manuscritos gregos e latinos, e diretor das bibliotecas do Vaticano desde 1554; e Francesco Alciati, ex-professor de direito da Universidade de Pavia. Havia outros vinte e oito membros, tanto leigos como clérigos, muitos com dossiês notáveis. O líder efetivo do comitê era Miguel Thomás Taxaquet, protégé do famoso canonista Antonio Agustín, arcebispo de Tarragona. ... eles realizaram seu trabalho com diligência e inteligência, embora houvesse uma divisão "entre aqueles que acreditavam que a boa prática da crítica textual humanista era de primordial importância e aqueles que estavam relutantes em se separarem da tradição medieval" (p. 62). Um ponto em que a tradição triunfou foi a defesa que fizeram da Doação de Constantino (pp. 79-81, 95).
 (The Catholic Historical Review, Volume 97, Número 4, Outubro 2011, pp. 804, 805)

Após tomarem conhecimento da natureza espúria deste documento, alguns Católicos Romanos afirmaram que se tratava de uma invenção grega.  Contudo, Döllinger demonstra que este não é o caso em seu capítulo sobre a Doação de Constantino.  Döllinger escreve:
Que a Doação era uma invenção dos gregos, composta em grego, e trazida do Oriente para Roma, foi de fato sustentado há muito tempo por Barônio.  Em seguida Bianchi se empenhou em defender essa opinião, no entanto, sem melhores fundamentos além da fraca alegação de que ela se encontra em Balsamão; e mais tarde, Richter também opinou que ela provavelmente se originou na Grécia.  Mas pelo texto grego, assim como pelo próprio conteúdo do documento, o oposto disso pode ser demonstrado com segurança.
(Döllinger, Fables Respecting the Popes of the Middle Ages,tr. by Alfred Plummer, V., p. 110, London: Rivingtons, 1871 (publicado originalmente em alemão em Munique, em 1863))

Döllinger então demonstra a origem latina do texto, e conclui: 
A Doação de Constantino, portanto, indubitavelmente, foi composta no Ocidente, na Itália, em Roma e por um eclesiástico Romano.  A época de sua aparição aponta para a mesma conclusão.
(Döllinger, Fables Respecting the Popes of the Middle Ages,tr. by Alfred Plummer, V., p. 117, London: Rivingtons, 1871 (publicado originalmente em alemão em Munique, em 1863))

O artigo sobre a Doação de Constantino na Enciclopédia da Itália Medieval afirma:
O quão eficaz este documento foi e que uso o papado fez dele durante o período carolíngio são tópicos de debate, embora se saiba que o documento esteve disponível em Roma. A situação mudou com a reforma gregoriana, quando a Doação foi citada numa carta do Papa Leão IX, provavelmente escrita por Humberto de Silva Candida.   Outras referências encontram-se no formulário do Papa Gregório VII e nas cartas dos Papas Urbano II, Adriano IV (1154 -1159), Inocente III (1198 -1216) e Gregório IX (1227 -1241).  Os papas reconfirmaram a Doação ainda no século XV, juntamente com outras doações imperiais.  Ainda assim, pode-se ter feito um uso muito maior da falsificação.  Segundo Fuhrmann (1981), uma perigosa ambivalência ou ambiguidade rodeava a Doação: a primazia papal poderia apresentar-se como dom de um imperador Romano e não como algo divinamente concedido.  Vários papas, portanto, usaram o documento apenas como prova secundária para suas reivindicações.
(Uta-Renate Blumenthal, Medieval Italy: An Encyclopedia, editado por Christopher Kleinhenz, Vol. I., p. 306, New York, NY: Routledge, 2004.)

Em resumo, os papas que fizeram uso da Doação incluem o Papa Leão IX, Nicolau III, Inocêncio III, Inocêncio IV, Clemente V, João XXII, Urbano II, Adriano IV, Gregório IX, e implicitamente por Adriano I, Nicolau V, Alexandre VI, Calisto III, Sisto IV, Inocêncio VIII, e Leão X. Foi talvez implicitamente usado por Estêvão III/II e Gregório VII.  Há provavelmente muitos outros Católicos Romanos que utilizaram a Doação em apoio ao poder papal.

Dante Alighieri (1265 -1321), poeta italiano Católico Romano, escreveu em sua Divina Comédia as seguintes linhas, acreditando que a Doação de Constantino era autêntica, mas que foi um grave erro, o que augurava mal para a Igreja:
“Ahi, Constantin, di quanto mal fu matre,
Non la tua conversion, ma quella dote,
Che de te prese il primo ricco patre!”

"Ah, Constantino, quantos males produziu,
não a tua conversão, mas a doação,
que de ti recebeu o primeiro papa enriquecido!"

(Dante, Inferno, xix., 115 –117;  The Metropolitan, Vol. III., March 1832, The Irish Church and her Tithes, p. 295, London: James Cochrane and Co., 1832;  Há muitas traduções em inglês - uma outra é apresentada em The Westminster Review,Vol. XXXIII. (Nova série), janeiro de 1868, Arte. III., Two Temporal Powers, p. 84, Londres: Trübner & Co., 1868, “Alas! Constantine, of how great ill was the mother,  Not thy conversion, but that dowery,  Which from thee accepted the first rich father.” O autor observa: "Dante alude aqui ao que se acreditava em seus dias, ou seja, que Roma e o território ao seu redor, chamado de Patrimônio de São Pedro, foram dados por Constantino ao Papa Silvestre". Veja também Dabney G. Park, Dante and the Donation of Constantine, pp. 67 -161, Dante Studies: with the Annual Report of the Dante Society, No. 130, The Johns Hopkins University Press, 2012).

Para mais leituras, veja Christopher B. Coleman, The Treatise of Lorenzo Valla on the Donation of Constantine, New Haven, CT: Yale University Press, 1922;  Christopher B. Coleman, Constantine the Great and Christianity: Three Phases: the Historical, the Legendary, and the Spurious, New York, NY: The Columbia University Press, 1914;  Dimiter G. Angelov, The Donation of Constantine and the Church in Late Byzantium;  Péter Bara, The Use of the Donation of Constantine in Late-Eleventh-Century Byzantium: the Case of Leo Metropolitan bishop of Chalcedon;  Johannes Fried, Donation of Constantine and Constitutum Constantini: The Misinterpretation of a Fiction and Its Original Meaning, 2007;  Frank Zinkeisen, The Donation of Constantine as Applied by the Roman Church, em The English Historical Review, Vol. IX., No. 36, Out., 1894, pp. 625 –632, Oxford University Press, 1894;  Döllinger, The Donation of Constantine, em Fables Respecting the Popes in the Middle Ages.

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Erros do "Contra os Erros dos Gregos" de Aquino

O Contra Errores Græcorum, ad Urbanum IV Pontificem Maximum de Aquino, que já mencionamos anteriormente, é sua principal obra controversa contra os gregos. Grande parte do tratado é dedicada à controvérsia do filioque.  "Tomás de Aquino estava a caminho do concílio de reunião de Lião, levando consigo seu Contra Errores Graecorum, quando faleceu em 7 de março de 1274" (Siecienski, The Filioque, p. 131), e esta obra foi influente naquele concílio. Há muitos erros nesta obra, especialmente as fontes inautênticas utilizadas, sobre as quais nos concentraremos nesta seção.

Se o leitor examinar as notas de rodapé (Contra Errores Græcorum de São Tomás de Aquino, O.P., traduzido por Peter Damian Fehlner, F.I., reeditado e capítulos faltantes fornecidos por Joseph Kenny, O.P.; disponível em http://dhspriory.org/thomas/ContraErrGraecorum.htm), verificará que todo o tratado depende quase completamente de fontes inautênticas.

Siecienski escreve "A maioria das citações usadas por Tomás de Aquino no Contra Errores Graecorum, que foram extraídas do Libellus de fide ss. Trinitatis de Nicholas de Cotrone [1], foram desde então provadas serem espúrias, e a versão do Contra Eunomium de Basílio utilizada pelos latinos em Florença hoje se sabe que inclui seções da própria obra de Eunômio, acrescentada mais tarde por um antigo editor".  (O Filioque, p. 8). Siecienski diz mais adiante: "O uso que Thomas faz do material patrístico em seu Contra Errores Graecorum apresenta dois problemas distintos.  O primeiro é o reconhecimento de que muitas das citações patrísticas citadas na obra (especialmente as dos Padres Gregos) foram desde então provadas serem ou corrompidas ou espúrias". (p. 130).

Isso acontece a tal ponto que, no início da Parte I, Capítulo IV, onde Aquino escreve: "Entre as afirmações dos referidos Padres se encontra a de que a essência é gerada no Filho e espirada no Espírito Santo", o editor Católico Romano observa: "Os referidos Padres: nenhum desses Santos Padres é o autor dos dez comentários examinados neste capítulo; antes, eles expressam a teologia do Libellus". Muitas das citações falsas utilizadas por Aquino acabaram aparecendo em outros autores, como já examinamos em alguns textos.

Por exemplo, Aquino cita frequentemente textos espúrios de Atanásio, incluindo uma carta espúria de Atanásio para Serapião. Essa carta espúria é citada (tendo Aquino como fonte) várias vezes nos documentos do Concílio de Florença. (Concilium Florentinum Documenta et Scriptores, Vol. II., Pt. I., p. 30, 38, 43, 45, 46, 51, Roma 1942), (Vol. II., Pt. II., Introductio, L., Roma, 1944), (Vol. II., Pt. II., Cap. XXXII., pp. 29 - 30) (Sessio Florentina, collatio VIII., univ. XXI., 24 martii 1439, Acta Latina Concilii Florentini, Vol. VI., 125r, p. 212, Roma, 1955).

[1] O Libellus: É importante mencionar a fonte da qual Tomás de Aquino extraiu muitas de suas citações. Nicholas de Cotrone, um grego nativo de Dyrrachium (Durazzo), compilou uma obra intitulada "Liber de fide Trinitatis, ex diversis auctoritatibus sanctorum graecorum confectus contra graecos", ou simplesmente Libellus, que ele enviou ao Papa Urbano IV em 1262.  O Papa Urbano então submeteu a obra a Aquino, que a utilizou para escrever seu tratado Contra Errores Græcorum (Contra os Erros dos Gregos) em aproximadamente 1263 ou 1264.   Das duzentas e cinco citações dos Padres Gregos na obra de Aquino contra os Gregos, duzentas foram extraídas do Libellus.  No entanto, este documento contém muitos textos espúrios que foram falsificados para induzir os gregos a se juntarem à Igreja Latina.  O Papa Urbano fez uso de afirmações deste documento ao escrever para o imperador grego, Miguel VIII Palaeologus, e os latinos o utilizaram repetidamente em seus esforços para persuadir os gregos, especialmente na época do Segundo Concílio de Lyon (1272 -1274). Antes de meados do século 20, pouco se sabia sobre o Libellus e a ligação de Nicholas de Cotrone com ele.  (Veja também Dr. Alexander Alexakis, Codex Parisinus Graecus 1115 and Its Archetype, Capítulo V., pp. 234 et sqqq., Dumbarton Oaks Studies XXXIV., Washington, D.C.: Dumbarton Oaks Research Library and Collection, 1996).

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Falsificações no Catecismo Romano de Trento

Há múltiplas citações dessas falsificações no "Catecismo do Concílio de Trento", também conhecido como "Catecismo Romano" ou "Catecismo de Trento", um documento autoritativo que tem sido louvado e citado por inúmeros Papas.

O Catecismo Romano cita o pseudo-epistola de Anacleto na nota de rodapé da página 222 da edição inglesa de 1829, que se refere a este falso documento como prova da primazia do Pontífice Romano (veja a Nota Introdutória ao volume Padres Pré-Nicenos, que citamos extensamente), e também cita a epístola espúria do Papa Fabiano sobre o crisma.  A suposta declaração de Cirilo no Concílio de Éfeso (que o Papa é "o Pai e Patriarca de todo o mundo") é igualmente falsa, que discutimos na seção sobre as obras espúrias e interpolações atribuídas a São Cirilo de Alexandria.

As páginas 74 -75 citam Cipriano para mostrar que "Uma cabeça visível é necessária para preservar a unidade", mas nós demonstramos que Cipriano não concordaria com a doutrina romana moderna sobre o Papado.  O Catecismo Romano prossegue citando Santo Optatus de Milevis, São Basílio e Santo Ambrósio fora de contexto. As palavras de São Optato de Mileves parecem as mais relevantes, mas o estudioso anglicano William Chillingworth (1602 -1644) comenta apropriadamente sobre sua impertinência (Chillingworth's Works, Vol. II., p. 276, 1820). Estas são as páginas principais do Catecismo, onde são definidos os direitos do Papa.

Uma Falsa Citação de Santo Ambrósio em Múltiplas Edições e Traduções do Catecismo de Trento

O Dr. John Donovan, do Maynooth College, publicou uma popular tradução inglesa do Catecismo de Trento em 1829, que contém muitos erros e é muito infiel ao texto original em latim do Catecismo (Veja Cramp's Text Book of Popery, pp. 430 et sqq., 3rdEd., 1851). Focaremos aqui uma citação falsa grave de Santo Ambrósio, onde as palavras dos autores do Catecismo do século XVI foram erroneamente colocadas como uma citação de Santo Ambrósio.  Algumas edições em latim do Catecismo foram corrompidas aqui neste ponto (talvez por engano, negligência ou fraude), e este erro passou para as traduções em inglês, francês e italiano.  A seguinte citação não é de Ambrósio, mas é citada como se fosse dele na tradução inglesa de Donovan:
Por fim, S. Ambrósio diz: "Se alguém objetar que a Igreja deve contentar-se em ter Jesus Cristo como único chefe [cabeça] e esposo, e não requer nenhum outro; a resposta é óbvia; pois, como consideramos Cristo não só o autor de todos os Sacramentos, mas também o seu ministro invisível (é ele quem batiza, é ele quem absolve, embora os homens sejam nomeados por ele os ministros externos dos Sacramentos), assim ele colocou sobre a sua Igreja, que governa por seu espírito invisível, um homem para ser seu vigário, e o ministro de seu poder: Uma Igreja visível necessita de uma cabeça visível e, portanto, o Salvador nomeia Pedro chefe [cabeça] e pastor de todos os fiéis, quando, nos mais amplos termos, ele se compromete a apascentar todas as suas ovelhas; desejando que ele, que o sucederia, fosse investido do mesmo poder de reger e governar toda a Igreja."
(The Catechism of the Council of Trent, On the Ninth Article, pp. 98 -99, Dublin: John Donovan, 1829; p. 97 do Baltimore 1833 ed.; p. 75 de um Baltimore sem data ed. [publicado por Lucas Brothers]; p. 75 de um Baltimore sem data ed. Nova York. (publicado por The Catholic Publication Society); observe que nenhuma citação é fornecida para esta passagem, enquanto as citações para outros Padres normalmente têm citações).

A edição de Londres de 1852 do Catecismo de Trento, com notas do estudioso anglicano Theodore Alois Buckley corrige este erro.  Buckley escreve no Prefácio:
Embora me confesse em muitos aspectos devedor da tradução publicada pelo Rev. J. Donovan, devo expressar minha surpresa pelo fato de que uma obra que contém inúmeras imprecisões evidentes, tenha obtido aprovação pública, e até sido reimpressa na Propaganda Press.  O estado da Teologia Católica Romana deve estar baixo, onde uma edição tão descuidada de documentos tão importantes, constitui o único meio de sua divulgação em língua inglesa.
(Theodore Alois Buckley, The Catechism of the Council of Trent, Prefácio, v., Londres: George Routledge & Co., 1852).

Na nota de rodapé da passagem ambrosiana em questão, Buckley escreve:
Lib. ix. Com. in Luc. c. 9.  Por um erro tipográfico, esta passagem de Santo Ambrósio foi omitida, e as seguintes palavras estranhamente atribuídas a esse Padre, em várias das melhores edições do Manutius, de 1831, e da reimpressão Leipsic, e outras.  O mesmo erro também passou para as traduções em francês e italiano.  Ver Ambros. in Luc. ix. 9.
(Theodore Alois Buckley, The Catechism of the Council of Trent, Questão XI., p. 100, nota f., Londres: George Routledge & Co., 1852; Em outra fonte, lemos que esta citação falsa ambrosiana está "Nas edições de Tauchnitz e L'abbé Doney (à Dijon, 1840), bem como na de Paulus Manutius, e na tradução de Figliucci" (Notes and Queries, Second Series, Vol. I., 3 de maio de 1856, pp. 356 -357, Londres: Bell & Daldy, 1856).

O presbiteriano John Hughes comenta:
Na página 97 da Tradução, há doze linhas do latim suprimidas.  Estas são de Ambrósio, que diz: "Cristo é a rocha", e que Cristo conferiu seus títulos peculiares aos doze discípulos.  O porquê disto ser excluído é muito claro!  Mas a falsificação não pára aqui. As palavras dos compiladores do catecismo, escritas muitos anos depois da morte de Ambrósio, são colocadas na boca dele, e fazem-no falar como um papista meticuloso, deixando entre as palavras - "Santo Ambrósio diz", e depois apagando tudo o que ele tinha dito, e tornando-o Padre um longo parágrafo composto no século XVI, sobre o poder dos papas! Será isto menos que infame?
(John Hughes e John Breckinridge, A Discussion of the Question, Is the Roman Catholic Religion, in Any Or in All Its Principles Or Doctrines, Inimical to Civil Or Religious Liberty?: And of the Question, Is the Presbyterian Religion, in Any Or in All Its Principles Or Doctrines, Inimical to Civil Or Religious Liberty?, p. 426, Baltimore, MD: John Murphy & Co., 1867.)

Esta tradução enganou alguns autores posteriores, que citaram na íntegra esta falsa citação de Santo Ambrósio do Catecismo de Trento como uma evidência a favor das pretensões papais, sem perceber sua falsidade. Entre eles:

Charles White e M. J. Spalding (editors), The United States Catholic Magazine and Monthly Review, Volume IV., Anna H. Dorsey, The Student of Blenheim Forest, or The Trials of a Convert, Cap. VI. p. 101, Baltimore, MD: John Murphy, 1845.

W. E. Youngman, For Husks, Food, Ch. IV., pp. 42 –43, New York, NY: D. & J. Sadlier & Co., 1874.James Harvey Robinson e Charles Austin Beard, Readings in Modern European History, Vol. I., Cap. VIII., Section 25, pp. 151 –152, Boston, MA: Ginn & Co., 1908. É estranho que esses dois professores da Universidade de Columbia tenham copiado integralmente do Catecismo de Trento essas inconsistências sem nenhum comentário crítico.


Fonte: Errors of the Latins do George A. 


(Nota do tradutor: o livro Errors of the Latins ainda está em processo de ser publicado. Obtive a cópia com o próprio autor. Caso tenha interesse entre em contato através do blog.)

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