sábado, 30 de outubro de 2021

Perenialismo: O Fim do Ecumenismo e a Unidade Transcendente das Religiões (Pe. Peter Heers)

Introdução: As dicotomias do diabo e seu fim

Uma tática experimentada e constante do inimigo da salvação da humanidade em Cristo é limitar as escolhas do homem a duas opções, aparentemente opostas, e bloquear de vista qualquer outra possibilidade, ou descartar como impraticável ou insustentável. Por exemplo, pode-se ser racional ou irracional, supra-racional não sendo uma opção. Ou, a pessoa deve ser cegamente obediente ou obstinada e rebelde, sendo rejeitada a verdadeira obediência. Ou, em uma escala maior, para os africanos ele apresenta uma magia negra aterradora e depois para escapar uma magia branca "boa". Ou, para as massas empobrecidas, a ganância do capitalismo é combatida e corrigida pela "igualdade" e "fraternidade" do comunismo. Ou, para aqueles que sofreram sob o regime autoritário do Protestantismo papal,* existe a autogovernação e o individualismo do Protestantismo reformado. E pode-se continuar e listar muitas outras tais falsas dicotomias nas quais ambas as opções são a inspiração do inimigo. Ainda hoje, em nossa atual "crise do Covid", a narrativa aceita afirma que a única solução para um vírus mortal é uma "vacina" experimental e potencialmente mais mortal - o tratamento inicial com medicamentos existentes sendo largamente ignorado.

[* nota do tradutor: por "Protestantismo papal" Pe. Peter se refere ao Catolicismo Romano. Seguindo teólogos como A. Khomiakov e São Justino Popovic, ele considera que a Igreja de Roma, ao entrar em cisma com as Igrejas do Oriente, foi a precursora do Protestantismo] 

Desta forma, o inimigo tem manipulado com sucesso o homem ocidental por muitas gerações, desde o tempo do Grande Cisma até hoje, mantendo-o dentro de uma série constante de ações e reações, como um pêndulo que se move incessantemente de um extremo a outro. Todo o equilíbrio espiritual, a perspectiva divina, o discernimento de espíritos e o caminho régio dos Padres foi perdido. Neste estado caótico, para aqueles que não têm a perspectiva eterna ou não vêem o A e Ω da história, é impossível determinar onde estamos no fluxo da história ou para onde estes eventos estão nos conduzindo. Para quem pode ver, no entanto, este é um processo de dissolução progressiva, que está aproximando a humanidade passo a passo do cumprimento do mistério da iniquidade, da inversão da Salvação em Cristo e sua substituição pelo Anticristo.

Esta dissolução da tradição cristã e da unidade no Ocidente e a resultante caricatura de Cristo e Sua Igreja no Protestantismo, seja do tipo papal ou reformado, constituem a base para o nascimento do monstro da modernidade. No final do século XIX, as mentes mais vigorosas do Ocidente que buscavam uma saída para o beco sem saída do Ocidente moderno e secular voltaram-se para a tradição do Oriente, mas infelizmente não para o Oriente Ortodoxo, mas para o Extremo Oriente. Estes Tradicionalistas pensaram em salvar o Ocidente do colapso por meio de uma injeção de "tradição" oriental e "metafísica" como expressões da "Filosofia Perene" ou sophia perennis. A justaposição do espantalho do "cristianismo" modernista e nominal, a la Protestantismo, com as culturas tradicionais do Oriente, é mais um exemplo da longa lista de falsas dicotomias do inimigo que servem para manter o homem longe da comunhão com a Verdade Encarnada. No entanto, ao contrário dos extremos anteriores no pêndulo que serviram para confinar e manipular um Ocidente sem-cabeça e fragmentado, o perenialismo promete acabar com os extremos e dar a resposta final "universal" ao problema das divisões, oferecendo uma "unidade" que se encontra de uma só vez tanto para além de todas as Revelações como através delas.

O que é Perenialismo?

De forma geral compreendido e referenciado, o perenialismo é a ideia de que no cerne de todas as grandes religiões se encontra a mesma experiência mística da Realidade Última. A Filosofia Perene tem suas raízes históricas no sincretismo de humanistas renascentistas como Marsilio Ficino e Pico della Mirandola, que sugeriram que Platão, Jesus, a Cabala e Hermes Trismegisto estavam todos apontando para a mesma Realidade Divina. Versões de Perenialismo também são encontradas no transcendentalismo de Emerson, Coleridge e Thoreau. A Maçonaria, a Sociedade Teosófica e o livro de Aldous Huxley de 1945, A Filosofia Perene, popularizou ainda mais uma versão universalista do perenialismo, e nos anos 60 tornou-se uma ideia fundamental da Nova Era.

O que é de particular interesse para nós, entretanto, é o desenvolvimento do perenialismo no século XX, e em particular como foi apresentado através da Escola Tradicionalista inspirada no Vedanta, especialmente por René Guenon, que muito provavelmente encontrou o perenialismo durante seus anos que esteve em Lojas Maçônicas.

Enquanto Huxley e outros adotaram um "universalismo místico", a Escola Tradicionalista, representada por Guenon, Ananda Coomaraswamy, Frithjof Schuon, e mais tarde por Titus Burckhardt, Martin Lings, Huston Smith, entre outros, é orientada para as tradições ortodoxas e rejeita o sincretismo moderno e o universalismo. É a esta escola que este artigo se referirá pela razão de que suas obras ganharam claramente mais atenção e impulso entre certos teólogos acadêmicos Ortodoxos e o clero.

De acordo com a Escola Tradicionalista, a filosofia perene é "Verdade absoluta e Presença infinita" [1].

"Como Verdade Absoluta é a sabedoria perene (sophia perennis) que se apresenta como a fonte transcendente de todas as religiões intrinsecamente ortodoxas da humanidade... Como Presença Infinita é a religião perene (religio perennis) que vive dentro do coração de todas as religiões intrinsecamente ortodoxas... É precisamente esta "única religião" que Frithjof Schuon chamou de "religião subjacente" ou "religião do coração" (religio cordis), que é o coração de toda religião...[e] que é de natureza essencialmente supra-formal, universal ou espiritual... Em outras palavras, a "religião subjacente" permanece transcendente em relação às religiões, mesmo sendo uma presença vivificante dentro delas" [2].

Assim, para o filósofo perenialista "o cristianismo é," como escreve Clinton Minaar, "muito claramente diferente do islã ou do budismo qua forma; mas é um só com eles qua essência (ou qua filosofia perene)" [3].

Deve ficar imediatamente aparente o potencial que esta compreensão das religiões tem para a "unidade" da humanidade, mas também para a sorte daqueles que rejeitarão esta "unidade" e insistirão em permanecer com o Cristo Encarnado e inalterado. Mas eu estou me antecipando a mim mesmo.

É muito importante que compreendamos a visão perenialista das coisas para que possamos detectá-la e discernir quando ela está sendo promovida, mesmo entre alguns na Igreja. Ela pode, talvez, ser melhor compreendida através de um diagrama:

Imagine a imagem de um círculo com o absoluto no centro (o domínio esotérico - misticismo, gnose, união), vários raios fluindo para fora até a circunferência, sendo seus raios várias revelações de Deus, com caminhos também retornando a Ele, em Quem eles estão transcendentemente unidos. As religiões, embora unidas no cerne, estão posicionadas ao redor do limite da circunferência (o domínio exotérico - formas, dogma, ritual), cada uma separada e distante da outra.

Deste diagrama pode-se ver que central para a teoria perenialista é a questão do esoterismo e do exoterismo em cada religião. A doutrina perenialista ensina que cada religião tem um aspecto formal, institucional, que é o aspecto exotérico da respectiva religião, onde elas diferem mais profundamente; e cada religião tem um aspecto esotérico, que existe nos métodos espirituais das religiões, onde elas parecem se aproximar, e podem até chegar a um ponto de identidade. Examinaremos esta ideia mais adiante, depois de primeiro apresentar brevemente outros aspectos da perspectiva perenialista.

A visão perenialista da religião gira em torno da noção axiomática de múltiplas e diversas Revelações, "que 'cristalizam' e 'atualizam' em diferentes graus de acordo com o caso, um núcleo de certezas que... permanece para sempre na onisciência divina" [4].

Mas, isto levanta a questão: qual é a razão convincente de Deus querer múltiplas revelações de Si mesmo que são manifestamente divergentes e aparentemente opostas? Para Schuon, a razão é que as divisões da humanidade exigem isso. A humanidade "está dividida em vários ramos distintos, cada um com suas características peculiares, psicológicas e outras, que determinam suas receptividades à verdade e moldam sua apreensão da realidade". [5] A esses diversos ramos, então, Deus endereçou diversas revelações que foram moldadas pelas peculiaridades de cada grupo da humanidade:

"...o que determina as diferenças entre as formas de Verdade é a diferença entre os recipientes humanos. Já há milhares de anos a humanidade tem sido dividida em vários ramos fundamentalmente diferentes, que constituem muitas humanidades completas, mais ou menos fechadas em si mesmas, a existência de recipientes espirituais tão diferentes e tão originais exige refrações diferenciadas da única Verdade" [6].

Portanto, os perenialistas mantêm que Deus designou cada uma das "grandes religiões mundiais" para um setor ou raça específica da humanidade, e "cada uma é totalmente verdadeira no sentido de que fornece a seus aderentes tudo o que precisam para alcançar o mais alto ou mais completo estado humano".[7] Islamismo para os árabes; hinduísmo, budismo e taoísmo para os povos do Extremo Oriente, cristianismo para os povos do Ocidente; judaísmo para uma seleção dos povos semitas, e assim por diante.

Esta ideia de Deus distribuindo revelações de Si mesmo feitas sob medida para subseções da humanidade, tão crucial para toda a perspectiva perenialista, entra em contradição com o evidente testemunho da história da salvação, começando com o Dia de Pentecostes, no qual a maldição de Babel foi derrubada e a unidade de todas as raças dos homens foi atualizada em Cristo. Em Cristo foi superado o "muro de divisão" e "muitas humanidades" foram unidas, compartilhando como fazem a única natureza humana que Cristo se revestiu e agora se assenta à direita do Pai. Como escreve o Pe. George Florovsky,

A Igreja é a completude em si mesma; é a continuação e o cumprimento da união teantrópica. A Igreja é a humanidade transfigurada e regenerada. O significado desta regeneração e transfiguração é que na Igreja a humanidade se torna uma unidade, "em um só corpo". A vida da Igreja é unidade e união. O corpo é "unido" e "cresce" na unidade do Espírito, na unidade do amor. O âmbito da Igreja é a unidade. E evidentemente esta unidade não é externa, mas é interna, íntima, orgânica. É a unidade do corpo vivo, a unidade do organismo. A Igreja é uma unidade não apenas no sentido de que é uma e única; é uma unidade, primeiramente, porque seu próprio ser consiste em unir a humanidade separada e dividida. É esta unidade que é o "sobornost" ou a catolicidade da Igreja. Na Igreja, a humanidade passa para outro plano, começa uma nova forma de existência. [8]

Líderes eclesiásticos proeminentes expressando Perenialismo

Dos departamentos de estudos religiosos aos departamentos de Estado, e cada vez mais aos departamentos de teologia e hierarquia, a "respeitabilidade" e a "aceitabilidade" da Filosofia Perene fez dela, em muitos aspectos, a filosofia espiritual dominante de nosso tempo. Intelectuais conhecidos ou foram fortemente influenciados por ela ou se juntaram a suas fileiras; todos, de Ken Wilber a John Tavener e ao príncipe Charles, o famoso peregrino de Vatopedi.

A concepção, de que Deus quer [deseja] múltiplas revelações, foi outrora encontrada apenas entre os estudiosos-devotados dos perenialistas; agora ela está sendo expressa e compartilhada pelos mais altos representantes do cristianismo e do islamismo. Em fevereiro de 2019, o Papa Francisco e o Grande Imã de Al-Azhar, Ahmed el-Tayeb, assinaram um Documento sobre a Fraternidade Humana pela Paz Mundial e Convivência Comum, durante uma Conferência Global sobre o tema em Abu Dhabi. Nesta declaração comum, foi afirmado um importante princípio do perenialismo:
"O pluralismo e a diversidade de religiões, cor, sexo, raça e língua são queridas [desejadas] por Deus em Sua sabedoria." [9] [**]
[nota do tradutor: outra possível tradução seria retirada do site vaticannews "O pluralismo e a diversidade de religião, de cor, de sexo, de raça e de linguagem são uma sábia vontade divina"]

O Papa Francisco e Ahmed el-Tayeb
assinam o Documento sobre a Fraternidade Humana 

A influência do perenialismo, no entanto, não se limita de forma alguma aos líderes dos heterodoxos. Hierarcas Ortodoxos se expressaram em termos idênticos, praticamente citando as obras de Schuon e Coomaraswamy. Citando um conhecido Arcebispo do Patriarcado Ecumênico que recentemente falou a um encontro inter-religioso:
"Quando você eleva uma religião acima de todas as outras, é como se você decidisse que existe apenas um caminho que leva ao topo da montanha. Mas a verdade é que você simplesmente não pode ver as miríades de caminhos que levam ao mesmo destino, porque você está cercado por rochedos de preconceito que obscurecem sua visão." [10]

É difícil conceber uma afirmação mais em consonância com o perenialismo e o espírito da época e mais sem fundamento e em desacordo com o phronema dos santos de Deus, os verdadeiros iniciados na vida da Santíssima Trindade. A igualdade das religiões, e sua unidade esotérica, e seus caminhos salvíficos que levam desde o exotérico até o absoluto - as características do perenialismo - estão todas aqui. O que nos interessa ainda mais particularmente é a identificação da fidelidade a Cristo, enquanto único Caminho para o Pai, com intolerância e preconceito. Isto nos traz à mente os julgamentos de dois apologistas Ortodoxos bem conhecidos: Pe. John Romanides, em sua resposta ao acordo de Balamand, e Pe. Daniel Sysoev, e sua previsão do futuro para a missão e perseguição Ortodoxa. 

 Depois que os Ortodoxos em Balamand caíram em engano e estenderam o pleno reconhecimento dos sacramentos latinos, Pe. John reconheceu perceptivamente que, seguindo adiante, a única explicação plausível para a contínua recusa dos Ortodoxos de inter-comunhão e con-celebração seria a intolerância.

Ainda mais perspicazes são as declarações do Pe. Daniel. O Pe. Daniel foi um grande missionário e sua experiência em pregar e ensinar a fé a muitos heterodoxos, incluindo os mais de 80 convertidos muçulmanos que se converteram através de seu trabalho, o levou a ver claramente a natureza da perseguição que se aproximava. O desafio que se aproxima não será para os cristãos negar a Divindade de Cristo de forma direta. A exigência será, ao contrário, que os cristãos aceitem as religiões não-cristãs como caminhos igualmente salvíficos para o Único Deus. Os cristãos serão divididos entre aqueles que aceitam a proposta unindo-se desta forma às religiões, e aqueles que se recusam, assim, sendo perseguidos como fanáticos e perigosos para a paz e segurança da sociedade.

Uma breve análise Ortodoxa da visão perenialista

O que se pode dizer, no tempo limitado que nos foi concedido, sobre a perspectiva perenialista? Em primeiro lugar, com relação à questão do conhecimento, a gnosiologia, pode-se observar que, embora se considere que as percepções esotéricas devem ser obtidas a posteriori, elas são assumidas a priori. O que é essencialmente uma pura especulação racional por parte do escritor - já que ele não pode, por definição, ter uma experiência pessoal de toda religião - é apresentado com excepcional, mas injustificada, confiança (orgulho). Além disso, as perspectivas religiosas representadas pelos apologistas perenialistas são quase exclusivamente não cristãs, e especialmente não-Ortodoxas. Isto não impede eles de assegurar a seus leitores que essencialmente, esotericamente, o caminho da oração, purificação e comunhão são realmente semelhantes - se não idênticos - por todo o panorama religioso. É muito conveniente para o perenialismo que a "unidade das religiões" esteja além da linha divisória esotérica-exotérica e, portanto, é uma realidade que nunca pode ser confirmada empiricamente, já que cada aderente deve permanecer dentro de sua própria tradição religiosa. É, em última análise, uma questão de confiança nos "mestres" perenialistas e observa-se que mesmo grandes convertidos à Ortodoxia retêm altos níveis de confiança neles, de modo que a Ortodoxia é vista através do prisma do perenialismo e não o contrário.

No entanto, devemos perguntar: será que o forte contraste entre exotérico e esotérico é sequer legítimo? A partir da Tradição Patrística Ortodoxa e da experiência de Deus, temos alguma base para fazer uma distinção tão nítida entre as formas e o Espírito? O realismo Ortodoxo não nos permite separar a Carne que o Logos se revestiu do Espírito que o Logos enviou e que desce sobre as formas de pão e vinho para transformá-las no Corpo e Sangue que agora se assenta à direita do Pai. De fato, a transformação dessas formas exotéricas pelo Espírito em Vida Eterna acontece para além do "muro de divisão" esotérico-exotérico, onde nós, ainda em carne e osso, ascendemos. É precisamente esta particularidade "escandalosa" da Encarnação e da Identidade Eterna do Logo com a Carne Ele assumiu que é um "obstáculo" para as religiões do mundo e que coloca à parte o Corpo de Cristo como o Céu na Terra e nenhuma outra religião. Na Pessoa de Cristo, o Absoluto esotérico se manifestou em forma exotérica, pois "quem viu Cristo viu o Pai" (João 14:9), e "porque por ele... temos acesso ao Pai em um mesmo Espírito." (Ef 2:18).

Não temos testemunhas oculares do Logos que atestam Seu ser na forma de um livro, muito menos do Alcorão, mas sim, Ele, "sendo em forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus. Mas esvaziou-se a si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-se semelhante aos homens" (Fil 2,6-7). Ao contrário das teorias dos perenialistas, a experiência das religiões, especialmente do Islã, não é a de um Deus kenótico, que "sendo achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz" (Fil 2,8). Ao contrário, também, da ideia perenialista de uma economia de salvação limitada em Cristo a uma parte da humanidade e da limitação do Nome do Logos Encarnado à esfera "exotérica", e até mesmo a apenas uma parte dela, pregamos um Cristo Crucificado que "Deus também exaltou soberanamente" e deu "o nome que é sobre todo o nome; para que ao nome de Jesus se dobre todo o joelho dos que estão nos céus, e na terra, e debaixo da terra, e toda a língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para glória de Deus Pai." (Filipenses 2:9-11)

No Corpo de Cristo, a Igreja, temos a unidade da terra e dos céus, do tempo e da eternidade, da origem da Revelação e da Verdade manifesta, do absoluto e do finito. Uma vez que o Logos se fez e permaneceu sarx, o modo "exotérico" Pessoal de Deus é ao mesmo tempo o "modo esotérico, superior" de Deus. Uma vez que o Logos se fez carne e a carne se revestiu de Cristo, o "mundo exotérico" deixou de ser uma realidade qualificada. O Logos que se fez carne e se assenta à "direita" de Deus veio, e virá novamente, para julgar todos os homens, e não apenas uma parte da humanidade, não com base em uma lei espiritual esotérica, mística e oculta, mas com base em Seus Mandamentos que foram dados para que todos vivessem de acordo, pois eles não são formas criadas, mas energias divinas incriadas.

Por que a Ascensão do Perenialismo sinaliza o fim do Ecumenismo?

A esta altura, já deveria ser aparente que, com o Perenialismo, não temos o ecumenismo no sentido popular habitual, pois a unidade de que estes filósofos falam existe apenas no plano transcendente - o de Deus, que é a própria Unidade Transcendente em Si mesmo. Portanto, eles não estão trabalhando para uma manifesta unidade na verdade, como faz [supostamente] o ecumenismo moderno, pela simples razão de que eles já reconhecem esta unidade como existente no plano esotérico, transcendente e não desejam, e muito menos vêem qualquer necessidade dela no plano manifesto exotérico, imanente.

A tarefa impossível de criar um mosaico divinamente belo do Corpo de Cristo a partir dos muitos pedaços despedaçados do Protestantismo será em breve finalmente abandonada. O fim do ecumenismo, como o conhecemos, está à vista. A "unidade" que o mundo busca será encontrada na unidade transcendente das religiões do Perennialismo.

E esta unidade será experimentada como uma grave tentação, que visitará a Igreja em todo o mundo, pois ela irá obscurecer, para deixar de lado, a Pessoa Teantropica de Jesus Cristo e Seu Corpo, a Igreja. Esta será a última tentação da história. Ela foi profetizada pelo próprio Cristo no Livro do Apocalipse. Ele diz: "Como guardaste a palavra da minha paciência, também eu te guardarei da hora da tentação que há de vir sobre todo o mundo, para tentar os que habitam na terra" (Apocalipse 3:10). Como nos diz o grande ancião Athanasius Mitilianaios, "porque esta tentação afetará o mundo inteiro, será a grande adulteração da fé na Pessoa Teantropica de Cristo".

Os eventos apocalípticos estão no horizonte. Assim como a última geração de homens clamará por paz e segurança precisamente por falta dela (e então a espada cairá), os homens que agora clamamam por unidade (de fato, unidade universal) - precisamente por falta dela - a encontrarão no perenialismo, o que lhes proporciona esta unidade quase sem esforço (sem a cruz e a crucificação da mente). Como o comunismo, que não pôde satisfazer o anseio dos homens, devido a sua orientação negativa e repressiva, o ecumenismo sincretista do modernismo não satisfaz o anseio dos homens por uma unidade mais profunda e mística de cada homem e da humanidade como um todo. A humanidade exigirá uma explicação robusta, tradicional e universalmente aceitável (apelando para os orientais) de como a religião não divide, mas une a humanidade. O perenialismo está pronto para ser a justificação teórica de muitos cristãos (mesmo "Ortodoxos") para a unidade essencial, se transcendente e esotérica, das religiões sob o Anticristo.

Finalmente o pêndulo deixou de balançar, pois estamos chegando à 12ª hora da história, o coração da noite deste mundo, quando os discípulos dormem e os traidores traem, e o Cristo Encarnado, o Crucificado, é posto de lado para um Salvador sem cruz.

Notas

1 Lings, Martin; Minnaar, Clinton (2007), The Underlying Religion: An Introduction to the Perennial Philosophy, World Wisdom, p. xii.

2 Ibid.

3 Ibid, p. xv.

4 Oldmeadow, Harry (2010), Frithjof Schuon and the Perennial Philosophy, Word Wisdom, ISBN 978-1-935493-09-9, page vii.

5 Oldmeadow, Harry, Traditionalism: Religion in the light of the Perennial Philosophy, Sophia Perennis, San Rafael, CA., 2000, p. 69.

6 Schuon, Frithjof, Gnosis: Divine Wisdom, Perennial Books, London, 1979, p. 29.

7 Cutsinger, James, “Perennial Philosophy and Christianity”: https://www.cutsinger.net/pdf/perennial_philosophy_and_christianity.pdf

8 Florovsky, Fr. Georges, “The Catholicity of the Church”: https://jbburnett.com/resources/florovsky/1/florovsky_1-3-catholicity.pdf, p. 3.

9 Fonte: https://www.vaticannews.va/en/pope/news/2019-02/pope-francis-uae-declaration-with-al-azhar-grand-imam.html

10 Fonte: https://www.goarch.org/-/irf-summit



Texto original: https://orthodoxethos.com/post/perennialism-the-end-of-ecumenism-and-the-transcendent-unity-of-religions

Nota do blog - leituras recomendadas:

- Para uma crítica ao conceito perenialista de uma Tradição Primordial por Philip Sherrard veja: 

http://skemmata.blogspot.com/2021/05/o-erro-do-conceito-perenialista-de-uma.html

- Para um comentário geral sobre a incompatibilidade do Perenialismo e o Cristianismo Ortodoxo veja: "Considerações ortodoxas sobre o perenialismo" http://avidaintelectual.blogspot.com/2010/04/consideracoes-ortodoxas-sobre-o.html

- Para uma crítica feita pelo Philip Sherrard mais aprofundada da relação entre lógica e metafísica na obra de Guénon veja seu ensaio "A metafísica da lógica" (disponível em português em http://avidaintelectual.blogspot.com/2015/12/a-metafisica-da-logica.html )

- Para uma crítica a tese da "Unidade Transcendente das Religiões" veja o artigo "The Problematic of the Unity of Religions" pelo teólogo Católico Romano Jean Borella (trecho disponível em português em http://wearetime.blogspot.com/2017/06/o-problema-da-unidade-das-religioes.html )

- Para um comentário sobre René Guénon escrito pelo Pe. Serafim Rose em uma de suas cartas veja http://aenergeia.blogspot.com/2015/04/padre-serafim-rose-e-rene-guenon.html

- Para um comentário sobre a teosofia e o ocultismo escrito pelo Pe. Sergius Bulgakov veja http://skemmata.blogspot.com/2016/06/os-enganos-do-ocultismo-e-teosofia.html

- Para uma crítica ao perenialismo a partir de uma crítica à teologia natural https://www.youtube.com/watch?v=-4hSTDM91Kg

- Para uma crítica à metafísica perenialista a partir do trinitarismo Ortodoxo veja: http://skemmata.blogspot.com/2021/06/metafisica-perenialista-e-trinitarismo.html



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