Índice
1. Introdução: Teologia e Misticismo na Tradição da Igreja Oriental
2. As Trevas Divinas
3. Deus na Trindade
4. Energias Incriadas
5. Ser Criado
6. Imagem e Semelhança
7. A Economia do Filho
8. A Economia do Espírito Santo
9. Dois Aspectos da Igreja
10. O Caminho da União
11. A Luz Divina
12. Conclusão: A Festa do Reino
NOTAS
6
A ‘Teologia Mística’ é
publicada na Migne III, 997–1048. Há uma versão em ingles por C. E. Rolt
(S.P.C.K. translations of Christian Literature, London, 1920), e uma versão em
francês mais recente por M. de Gandillac, Oeuvres complètes du
pseudo-Denys l’Aréopagite, Aubier, 1943.
As Trevas Divinas
O problema do conhecimento de Deus foi exposto em seus
fundamentos em um pequeno tratado cujo próprio título - Περὶ μυστικῆς θεολογίας
– Sobre a Teologia Mística - é significativo. Este notável livro, cuja
importância para toda a história do pensamento cristão não pode ser exagerada,
é o trabalho do desconhecido autor dos chamados escritos areopagíticos: um
personagem que a opinião comum durante um longo período de tempo procurou
identificá-lo com o discípulo de São Paulo - Dionísio, o Aeropagita. Os defensores
desta atribuição, no entanto, tiveram que levar em conta um fato perturbador: o
silêncio completo reina por quase cinco séculos em relação a essas obras
areopagíticas. Elas não foram citadas nem referidas por qualquer escritor
eclesiástico antes do início do século VI, e foram heterodoxos - os monofisitas
- que, ao buscarem apoiar-se em sua autoridade, primeiro deram-nas a conhecer.
São Máximo, o Confessor tomou esta arma das mãos dos hereges no decurso do
século seguinte, demonstrando em seus comentários (ou scholia) o
significado ortodoxo dos escritos dionisíacos.[1] Desde então, essas obras têm
desfrutado de uma autoridade incontestável na tradição teológica do Oriente,
bem como na do Ocidente. Os críticos modernos, até então longe de concordar
quanto à identidade do 'Pseudo Dionísio' e quanto à data da composição de suas
obras, vagueiam em meio às mais diversas hipóteses.[2] A maneira pela qual as
pesquisas críticas oscilam entre datas tão distantes do século III ao século VI
mostra quão pouca concordância já foi alcançada em relação às origens desta
obra misteriosa.
Mas sejam quais forem os resultados de toda essa pesquisa,
eles não podem de modo algum diminuir o valor teológico da obra Areopagitica.
Desse ponto de vista, pouco importa quem era o autor. O que é importante é o
julgamento da Igreja sobre o conteúdo da obra e o uso que ela fez dela. Não diz
o autor da epístola aos hebreus ao citar um salmo de Davi: "Mas em certo
lugar testificou alguém...”? [3] Assim mostrando em que medida a questão da
autoria é de importância secundária no caso de um texto inspirado pelo Espírito
Santo. O que é verdadeiro para a Sagrada Escritura também é verdade para a
tradição teológica da Igreja.
Dionísio distingue duas vias teológicas possíveis. Uma
delas, a teologia catafática ou positiva, que prossegue por afirmações; a
outra, a teologia apofática ou negativa, que prossegue por negações. A primeira
nos leva a algum conhecimento de Deus, mas é uma via imperfeita. A via
perfeita, a segunda, é a única via apropriada em relação a Deus, que é, em Sua
própria natureza, incognoscível - que nos leva finalmente a ignorância total.
Todo o conhecimento tem como objetivo aquilo que é. Mas Deus está além de tudo
o que existe. Para aproximar-se dele, é necessário negar tudo o que é inferior
a Ele, isto é, tudo aquilo que é. Se vendo Deus compreendemos o que vemos,
então nós não vimos o próprio Deus, mas algo inteligível, algo que Ele é menor.
É pela ignorância (ἀγνωσία) que alguém pode conhecer Aquele que está acima de
todo objeto possível de conhecimento. Procedendo pelas negações, ascende-se dos
níveis inferiores do ser aos mais elevados, ao deixar de lado progressivamente
tudo o que pode ser conhecido, a fim de aproximar-se do Desconhecido na
escuridão da ignorância absoluta. Pois até mesmo a luz, e especialmente a
abundância de luz, torna a escuridão invisível; ainda mais, o conhecimento das
coisas criadas e, em especial, o excesso de conhecimento, destrói a
ignorância, que é a única maneira pela qual se pode alcançar Deus em Si mesmo.
[4]
Se transferirmos a distinção de Dionísio entre a teologia
negativa e a afirmativa para o plano da dialética, somos confrontados com uma
antinomia que, em seguida, buscamos resolver; na tentativa de fazer uma síntese
das duas vias opostas, as unimos como um método único de conhecer Deus. É assim
que São Tomás de Aquino reduz as duas vias de Dionísio para uma só, tornando a
teologia negativa um corretivo para a teologia afirmativa. Ao atribuir a Deus
as perfeições que encontramos nos seres criados, devemos (de acordo com São
Tomás) negar o modo segundo o qual entendemos essas perfeições finitas, mas
podemos afirmá-las em relação a Deus de um modo mais sublime, modo sublimiori.
Assim, as negações correspondem ao modus significandi,
ao meio sempre impreciso de expressão; as afirmações, à res significata,
à perfeição que desejamos expressar, que está em Deus de um modo diferente do
que está nas criaturas. [5] Podemos perguntar até que ponto essa invenção
filosófica muito engenhosa corresponde ao pensamento de Dionísio. Se, para o
autor do Areopagitica, há uma antinomia entre as duas "teologias" que
ele distingue, ele admite esta síntese das duas vias? É possível, além disso,
falando em termos gerais, opor-se as duas vias, lidando com elas no mesmo
nível, colocando-as no mesmo plano? Dionisio não diz mais de uma vez que a
teologia apofática supera a catafática? Uma análise do tratado sobre a teologia
mística, que é dedicada a via negativa, mostrará o que esse método significa
para Dionísio. Ao mesmo tempo, nos permitirá julgar a verdadeira natureza desse
apofaticismo que constitui a característica fundamental de toda a tradição
teológica da Igreja Oriental. [6]
Dionísio começa seu tratado com uma invocação da Santíssima
Trindade, a quem ele ora para guiá-lo "ao alto supremo dos escritos
místicos, que está além do que é conhecido, onde os mistérios da teologia,
simples, incondicionais, invariáveis, são colocados à nu numa escuridão de
silêncio além da luz". Ele convida Timóteo, a quem o tratado é dedicado, à
"contemplação mística" (μύστικα θεάματα). É necessário renunciar ao
sentido e ao funcionamento da razão, tudo o que pode ser conhecido pelos sentidos
ou entendimento, tanto aquilo que é como aquilo que não é, para poder alcançar
em perfeita ignorância a união com Ele que transcende todo ser e todo o
conhecimento. Já é evidente que não se trata apenas de um processo de
dialética, mas de outra coisa: é necessária uma purificação, uma κάθαρσις, é
necessária. É preciso abandonar tudo o que é impuro e até tudo o que é puro. É
preciso, então, escalar as alturas mais sublimes da santidade deixando para
trás todos os luminares divinos, todos os sons e palavras celestiais. É somente
assim que se pode penetrar na escuridão, onde Ele, que está além de todas as
coisas criadas, faz a sua morada.[7]
Esse caminho de ascensão, no curso do qual somos
gradualmente libertados do domínio de tudo o que pode ser conhecido, é
comparado por Dionísio à ascensão de Moisés ao Monte Sinai para encontrar-se
com Deus. Moisés começa por se purificar. Então ele se separa de tudo que é
impuro. É então que ele ouve "as muitas notas das trombetas, ele vê as
muitas luzes que emitem muitos raios puros; então ele é separado dos muitos, e
com os sacerdotes escolhidos ele alcança a altura das ascensões divinas. Mesmo
aqui ele não se associa com Deus, ele não contempla Deus (pois Ele não é
visível), mas somente o lugar onde Ele está. O que significa, creio, que na
ordem visível e na ordem inteligível, os objetos mais elevados e os mais
sublimes são vistos e compreendidos não passam de razões hipotéticas dos
atributos que convém Àquele que é totalmente transcendente, razões que revelam
a presença Daquele que está fora de toda a captação mental, acima dos cumes
inteligíveis de seus mais santos lugares.. É então que Moisés é libertado das
coisas que vêem e são vistas (τῶν ὀρωμένων καὶ τῶν ὀρώντων): ele passa para a
escuridão verdadeiramente mística da ignorância, onde ele fecha os olhos para
todas as apreensões científicas, e atinge o que é inteiramente intocado e
invisível, pertencendo não a si mesmo e não a outro, mas inteiramente Àquele
que é acima de tudo. Ele é unido ao melhor de seus poderes com a quiescência
inconsciente de todo conhecimento, e por esse mesmo desconhecimento ele conhece
o que supera o entendimento (καὶ τῷ µηδὲν γινώσκειν, ὑπερ νοῦν γινώσκων).” [8]
Agora fica claro que a via apofática, ou teologia mística -
pois tal é o título do tratado dedicado a via das negações - tem por objeto a
Deus, na medida em
que Ele é
absolutamente incompreensível. Seria até impreciso dizer que tem Deus como seu
objeto. A última parte da passagem que acabamos de citar mostra que, uma vez
alcançada a altura extrema do cognoscível, é preciso libertar-se daquilo que
percebe tanto quanto daquilo que pode ser percebido: isto é, do sujeito, bem
como do objeto da percepção. Deus não se apresenta mais como objeto, pois não é
mais uma questão de conhecimento, mas de união. A teologia negativa é,
portanto, um caminho para a união mística com Deus, cuja natureza permanece
incompreensível para nós.
O segundo capítulo da Teologia Mística opõe à via
afirmativa, aquela de "posições" (θέσεις), a via negativa, aquela de
sucessivas "abstrações" ou "distanciamentos" (ἀφαιρέσεις).
A primeira é uma descida dos graus superiores do ser aos inferiores; a segunda,
uma ascensão em direção à incompreensibilidade divina. No capítulo três,
Dionísio enumera seus trabalhos teológicos, organizando-os em ordem de
"prolixidade", que aumenta à medida que se desce das teofanias
superiores para as mais inferiores. O tratado Sobre a Teologia Mística é o mais
resumido de todos, pois trata da via negativa que leva ao silêncio da união
divina. No quarto e quinto capítulos, Dionísio considera toda uma série de
atributos emprestados do mundo dos sentidos e da inteligência e recusa-se a
relacioná-los com a natureza divina. Ele conclui seu tratado reconhecendo que a
Causa universal foge toda afirmação, bem como toda negação. “Quando fazemos
afirmações e negações sobre as coisas que são inferiores a ela, afirmamos e não
negamos nada sobre a Causa em si, que, sendo totalmente à parte de todas as
coisas, está acima de toda afirmação, como a supremacia Daquele que, sendo em
Sua a simplicidade liberto de todas as coisas e além de tudo, está acima de
toda negação.” [9]
Houve muitas tentativas de fazer de Dionísio um
neoplatonista. De fato, se compararmos o êxtase dionisíaco com o que
encontramos descrito no final da Sexta Enéada de Plotino, devemos registrar
algumas semelhanças impressionantes. Para aproximar-se do Uno (ἑν) é
necessário, de acordo com Plotino, "alcançar o que é primeiro, separar-se
dos objetos sensíveis, que são as últimas coisas, e ser liberto de todo mal
porque se está ansioso pelo Bom; voltar ao começo dentro de si mesmo, e
tornar-se um em vez de muitos na contemplação do começo e do Uno". [10] É
o primeiro passo na subida, onde nos encontramos livres das coisas do sentido e
recolhidos na inteligência. Mas é necessário ir além da inteligência, uma vez
que a obtenção de um objeto superior a ela está em questão. "Não é algo,
mas antes de tudo; nem é ser, pois aquilo que está sendo tem a forma de seu
ser; mas isto é sem forma, faltando até mesmo forma inteligível. Pois, uma vez
que a natureza do Uno procria todas as coisas, ele próprio não faz parte
delas.” [11] A esta natureza são aplicadas definições negativas que lembram as
da Teologia Mística de Dionísio: "não é algo, nem é de nenhum tipo ou
grau; não é mente, não é alma; não se move nem permanece parado; não é nem no
espaço nem no tempo; é em si mesmo, de um tipo, ou melhor, sem tipo, antes de
todo tipo, antes do movimento, antes da quietude, pois todas essas coisas dizem
respeito ao ser e o torna muitos." [12]
Aqui aparece uma idéia que nunca se encontra em Dionísio, e
que traça uma linha de demarcação entre o misticismo cristão e a filosofia
mística dos neoplatonistas. Se Plotino rejeita os atributos próprios do ser em
busca de alcançar a Deus, não é, como com Dionísio, por causa da
incognoscibilidade absoluta de Deus: uma incognoscibilidade obscurecida por
tudo o que pode ser conhecido nas criaturas. É porque o reino do ser, mesmo em
seus níveis mais elevados, é necessariamente múltiplo: ele não tem a
simplicidade absoluta do Uno. O Deus de Plotino não é incompreensível por
natureza. Se não podemos compreender o Uno pela razão discursiva nem pela
intuição intelectual, é porque a alma, quando apreende um objeto pela razão, se
afasta da unidade e não é absolutamente uma só.[13] Portanto, é necessário
recorrer ao caminho do êxtase, à união em que somos totalmente um com o nosso
sujeito, em que toda multiplicidade desaparece e a distinção entre sujeito e
objeto não existe mais. "Quando se encontram eles não passam de um: é só
quando separados que são dois .... Como afirmar que ele é um objeto diferente
de nós mesmos, mesmo que não o víssemos como diferente, mas unido a nós quando
o contemplávamos?"[14] O que é descartado na via negativa de Plotino
é a multiplicidade, e chegamos à unidade perfeita que está além do ser - já que
o ser está ligado à multiplicidade e é subsequente ao Uno.
O êxtase de Dionísio é uma saída do ser como tal. O de
Plotino é antes uma redução do ser à simplicidade absoluta. É por isso que
Plotino descreve seu êxtase por um nome que é muito característico: o da
"simplificação" (ἅπλωσις). Trata-se de uma reintegração na
simplicidade do objeto de contemplação que pode ser definido positivamente como
o Uno e que, nessa capacidade, não se distingue do sujeito contemplativo.
Apesar de todas as semelhanças exteriores (devido principalmente a um
vocabulário comum), estamos muito longe da teologia negativa da Areopagitica. O
Deus de Dionísio, incompreensível por natureza, o Deus dos Salmos: "que fez
das trevas seu lugar secreto", não é a unidade de Deus primordial dos
neoplatonistas. Se Ele é incompreensível, não é por causa de uma simplicidade
que não pode chegar a um acordo com a multiplicidade com a qual todo
conhecimento relativo a criaturas está contaminado. É, por assim dizer, uma
incompreensibilidade que é mais radical, mais absoluta. De fato, Deus não seria
mais incompreensível por natureza se essa incompreensibilidade fosse, como em
Plotino, enraizada na simplicidade do Uno. Ora, é precisamente a qualidade de
incompreensibilidade que, em Dionísio, é a única definição própria de Deus - se
podemos falar aqui de definições próprias. Em sua recusa em atribuir a Deus as
propriedades que compõem a matéria da teologia afirmativa, Dionísio está
apontando expressamente para as definições neoplatônicas: "Ele não é nem
Um, nem Unidade" (οὐδὲ ἑν, οὐδὲ ἑνότης ) .[15] Em seu tratado Sobre
os Nomes Divinos, ao examinar o nome do Uno, que pode ser aplicado a Deus, ele
mostra sua insuficiência e compara com outro nome "mais sublime" - o
da Trindade, que nos ensina que Deus não nem um nem muitos mas que Ele
transcende essa antinomia, sendo incognoscível no que Ele é. [16]
Se o Deus da revelação não é o Deus dos filósofos, é esse
reconhecimento de Sua incognoscibilidade fundamental que marca a fronteira
entre as duas concepções. Tudo o que pode ser dito em relação ao platonismo dos
Padres, e especialmente em relação à dependência do autor da Areopagitica sobre
os filósofos neoplatonistas, limita-se às semelhanças externas que não vão à
raiz de seus ensinamentos, e se relacionam apenas com um vocabulário que era
comum à época. Para um filósofo da tradição platonista, embora ele fale da
união extática como o único caminho pelo qual alcançar Deus, a natureza divina
é, não obstante, um objeto, algo que pode ser explicitamente definido – o ἑν
-, uma natureza cuja incógnita reside acima de tudo no fato da fraqueza de
nossa compreensão, inseparável como é da multiplicidade. Como acabamos de
dizer, essa união extática será uma redução à simplicidade, e não uma saída do
reino dos seres criados, como em
Dionísio. Pois fora
da revelação nada se sabe sobre a diferença entre o criado e o incriado, da
criação ex
nihilo, do abismo que deve ser cruzado entre a criatura e o Criador. As
doutrinas heterodoxas com as quais Orígenes foi acusado tinham sua raiz em
certa insensibilidade diante da incognoscibilidade de Deus por parte deste
grande pensador cristão. Uma atitude que não era fundamentalmente apofática, fazia
do professor alexandrino um filósofo religioso e não um teólogo místico, no
sentido próprio da tradição oriental. Para Orígenes, de fato, Deus é "uma
natureza simples e intelectual que não admite nenhuma complexidade em si
mesma... Ele é Mônada (μονάς) e Unidade (ἑνάς) e Espírito; a fonte e a origem
de toda natureza intelectual e espiritual."[17] É interessante notar que
Orígenes era igualmente insensível à criação ex nihilo: um
Deus que não é o Deus absconditus da
Escritura não presta-se facilmente às verdades da revelação. Com Orígenes,
o helenismo tenta infiltrar-se na Igreja. Essa concepção vinda de fora tem sua
origem na natureza humana, nos modos de pensamento próprios dos homens -
"aos gregos e aos judeus". Esta não é a tradição na qual Deus se revela
e fala à Igreja. É por essa razão que a Igreja teve que lutar contra o
"origenismo", como sempre lutou contra doutrinas que, ao atacar a
incompreensibilidade divina, substituíram a experiência das profundezas
insondáveis de Deus por conceitos filosóficos.
É a base apofática de toda verdadeira teologia que os
grandes Capadócios estavam defendendo em sua controvérsia com Eunômio. Este
último manteve a possibilidade de expressar a essência divina naqueles
conceitos inatos pelos quais se revela à razão. Para São Basílio, não só a
essência divina, mas também as essências criadas não poderiam ser expressas em
conceitos. Ao contemplar
qualquer objeto, analisamos suas propriedades: é isso que nos permite formar
conceitos. Mas esta análise não pode em caso algum exaurir o conteúdo do objeto
de percepção. Haverá sempre um "resíduo irracional" que escapa à
análise e que não pode ser expresso em conceitos; é a incognoscível
profundidade das coisas, aquilo que constitui sua essência verdadeira e indefinível.
Em relação aos nomes que aplicamos a Deus, estes revelam suas energias que
descem em nossa direção, mas não nos aproximam de sua essência, que é
inacessível.[18] Para São Gregório de Nissa, todo conceito relativo a Deus é um
simulacro, um falsa semelhança, um ídolo. Os conceitos que formamos de acordo
com o entendimento e o julgamento que são naturais para nós, baseando-nos em
uma representação inteligível, criam ídolos de Deus em vez de nos revelar o
próprio Deus.[19] Há apenas um nome pelo qual a natureza divina pode ser
expressa: a maravilha que se apodera da alma quando ela pensa em Deus.[20]
São Gregório Nazianzeno, citando Platão sem nomeá-lo ("um dos gregos
divinos"), corrige uma passagem do Timeu sobre
a dificuldade de conhecer a Deus e a impossibilidade de expressar sua natureza,
da seguinte maneira: "É difícil conceber Deus, mas defini-lo em palavras,
é impossível.” [21] Esse rearranjo de uma frase de Platão por um autor cristão
que muitas vezes é considerado um platonizador, demonstra por si mesmo até que
ponto o pensamento dos Padres é aquele dos filósofos.
O apofatismo, como uma atitude religiosa em relação à
incompreensibilidade de Deus, não pertence exclusivamente ao Areopagitica, mas
é encontrado na maioria dos Padres. Clemente de Alexandria, por exemplo, diz no Stromata que
podemos alcançar a Deus não naquilo que Ele é, mas naquilo que Ele não é.[22] A
própria consciência da inacessibilidade do "Deus desconhecido" não
pode, segundo ele, ser adquirida exceto pela graça: "por essa sabedoria
dada por Deus que é o poder do Pai". [23] Essa consciência da
incompreensibilidade da natureza divina corresponde, assim, a uma experiência:
a um encontro com o Deus pessoal da revelação. No poder dessa graça, Moisés e
São Paulo experimentaram a impossibilidade de conhecer a Deus: o primeiro,
quando penetrava nas trevas da inacessibilidade; o último, quando ouvia as
palavras que transmitiam a inefabilidade divina.[24] O tema de Moisés se
aproximando de Deus nas trevas do Sinai - um tema que já encontramos em Dionísio
e que foi adotado em primeiro lugar por Filo de Alexandria como uma imagem de
êxtase, é o símbolo favorito dos Padres para transmitir a experiência da
incompreensibilidade da natureza divina. São Gregório de Nissa dedica um
tratado especial à Vida de Moisés, [25] no qual a ascensão do Monte Sinai em
direção às trevas da incompreensibilidade representa o caminho da contemplação,
superior ao primeiro encontro de Moisés com Deus quando Ele apareceu a ele na
sarça ardente. Então Moisés viu a Deus em luz; agora ele entra na escuridão,
deixando para trás tudo o que pode ser visto ou conhecido; resta a ele apenas o
invisível e incognoscível, mas nesta escuridão está Deus.[26] Pois Deus faz Sua
morada ali onde nosso entendimento e nossos conceitos não podem ser admitidos.
Nossa ascensão espiritual nos revela, cada vez mais claramente, a
incompreensibilidade absoluta da natureza divina. Preenchida de um desejo
sempre crescente, a alma cresce sem cessar, sai de si mesma, estende-se além de
si mesma e, ao fazê-lo, é cheia de um desejo ainda maior. Assim a ascensão se
torna infinita, o desejo insaciável. Este é o amor da noiva no Cântico dos
Cânticos: ela estende as mãos em direção à fechadura, ela busca
Aquele que não pode ser agarrado, ela o chama a quem ela não pode alcançar ...
ela alcança a Ele na percepção de que a união é sem fim, a subida sem
limite.[27]
São Gregório Nazianzeno retoma as mesmas imagens,
especialmente a de Moisés. "Eu avançava", diz ele, "para
conhecer Deus. É por isso que me afastei da matéria e de tudo o que é corporal,
eu me recolhi o quanto pude para dentro de mim mesmo e subi em direção ao cume
da montanha. Mas, ao abrir os olhos, mal pude ver o que estava atrás, mesmo
estando coberto pela rocha, quer dizer, pela humanidade do Verbo encarnado para
nossa salvação. Não fui capaz de contemplar a natureza primeira e toda pura que
não é conhecida a não ser por si mesma, ou seja, a Santíssima Trindade. Porque
não posso contemplar aquilo que se encontra detrás do primeiro véu, oculto
pelos querubins, mas somente aquilo que desce em nossa direção, a magnificência
divina que se torna visível nas criaturas." [28] Quanto à essência
divina em si mesma, é “o Santo dos Santos que permanece oculto mesmo dos
Serafins".[29] A natureza divina é como um mar de essência, indeterminado
e sem limites, que se espalha muito além de toda noção de tempo ou de natureza. Se
a mente tenta formar uma débil imagem de Deus, considerando-O não em Si mesmo,
mas naquilo que o circunda, essa imagem lhe escapa antes mesmo de tentar
apreendê-la, iluminando as faculdades superiores como um relâmpago que ofusca
os olhos. [30] São João Damasceno se expressa da mesma maneira:
"Deus, então, é infinito e incompreensível, e tudo o que é compreensível
sobre Ele é Sua infinitude e incompreensibilidade. Tudo o que podemos dizer
catafaticamente a respeito de Deus não mostra a Sua natureza, mas as coisas que
se relacionam com a Sua natureza (τὰ πєρ τὴν ϕύσιν)…. Deus não pertence à
classe das coisas existentes: não que Ele não tenha existência, mas que Ele
está acima de todas as coisas existentes, até mesmo acima da própria
existência. Pois, se todas as formas de conhecimento têm a ver com o que
existe, seguramente, aquilo que está acima do conhecimento certamente também
deve estar acima da essência; e, inversamente, aquilo que está acima da
essência também estará acima do conhecimento." [31]
Seria possível continuar indefinidamente encontrando
exemplos de apofatismo na teologia da tradição oriental. Nós nos limitaremos a
citar uma passagem de um grande teólogo bizantino do século XIV, São Gregório
Palamas: “A natureza super-essencial de Deus não é um assunto para fala ou
pensamento ou mesmo contemplação, pois está muito distante de todas as coisas
que existe e mais do que incognoscível, sendo fundado sobre o poder não
circunscrito dos espíritos celestiais - incompreensível e inefável a todos para
sempre. Não há nome pelo qual possa ser nomeada, nem nesta era nem na era por
vir, nem na palavra encontrada na alma e proferida pela língua, nem no contato
sensível ou intelectual, nem ainda em qualquer imagem que possa proporcionar
qualquer conhecimento sobre ela, se não for aquela perfeita incompreensibilidade
que se professa ao negar tudo o que pode ser nomeado. Ninguém pode nomear
corretamente sua essência ou natureza, se está realmente buscando a verdade que
está acima de toda a verdade.''[32] "Pois, se Deus é a natureza, então
tudo o mais não é natureza. Se aquilo que não é Deus é natureza, Deus não
é natureza e, do mesmo modo, Ele não é, se ou outros seres são. " [33]
Frente a frente com esse apofatismo radical, característico
da tradição teológica do Oriente, podemos perguntar se corresponde ou não a uma
abordagem extática: se existe uma busca de êxtase sempre que o conhecimento de
Deus é buscado por meio de negações. Essa teologia negativa é necessariamente
uma teologia do êxtase ou é suscetível de uma interpretação mais geral? Vimos,
ao examinar a Teologia Mística de Dionísio, que o caminho apofático não é
meramente uma busca intelectual, que é algo mais que um jogo de abstrações.
Como nos platonistas extáticos, com também em Plotino, trata-se de uma
κάθαρσις: de uma purificação interior. Há, no entanto, essa diferença: a
purificação platônica é, acima de tudo, de natureza intelectual, destinada a
libertar a compreensão da multiplicidade inseparável do ser. Para Dionísio, por
outro lado, é uma recusa em aceitar o ser como tal, na medida em que oculta o
não-ser divino: é uma renúncia ao domínio das coisas criadas a fim de obter
acesso àquele do incriado; uma libertação mais existencial envolvendo todo o
ser daquele que quer conhecer a Deus. Em ambos os casos, é uma questão de
união. A união com o ἑν (Uno) de Plotino pode significar, de fato, uma
percepção da união primordial e ontológica do homem com Deus: em Dionísio, a
união mística é uma nova condição que implica um progresso, uma série de
mudanças, uma transição do criado para o incriado, a aquisição de algo que não
é até então possuído pela natureza. De fato, ele não só sai de si mesmo (pois
isso também acontece em Plotino), mas ele pertence completamente ao
Incognoscível, sendo deificado nesta união com o incriado. Aqui união significa
deificação. Ao mesmo tempo, enquanto intimamente unido a Deus, ele O conhece
apenas como Incognoscível, em outras palavras, como infinitamente separado por
Sua natureza, permanecendo, mesmo na união, inacessível naquilo que Ele é em
Seu ser essencial. Embora Dionísio fale de êxtase e união, embora sua teologia
negativa, longe de ser um exercício puramente intelectual, envolva uma
experiência mística, uma ascensão para Deus; ele deixa claro que, apesar de
atingirmos os picos mais altos acessíveis aos seres criados, a única noção
racional que podemos ter de Deus ainda será a da incompreensibilidade Dele. Consequentemente,
a teologia deve ser menos uma busca de noções positivas sobre o ser
divino do que uma experiência que supera todo entendimento. "Falar
de Deus é algo bom, mas ainda melhor é se purificar para Deus", diz São
Gregório Nazianzeno. [34] O apofatismo não é necessariamente uma teologia do
êxtase. É, acima de tudo, uma atitude mental que se recusa a formar conceitos
sobre Deus. Tal atitude exclui totalmente toda a teologia abstrata e puramente
intelectual que gostaria de adaptar os mistérios da sabedoria de Deus aos modos
de pensar humanos. É uma atitude existencial que envolve todo o homem: não há
teologia à parte da experiência; é necessário mudar, tornar-se um novo homem.
Para conhecer a Deus, é preciso aproximar-se Dele. Ninguém que não siga o
caminho da união com Deus pode ser um teólogo. O caminho do conhecimento de
Deus é necessariamente o caminho da deificação. Aquele que, seguindo este
caminho, imagina, num dado momento, que ele sabe o que é Deus, esse tem um
espírito depravado, de acordo com São Gregório Nazianzeno. [35] O apofatismo é,
portanto, um critério: o sinal seguro de uma atitude mental conformada à
verdade. Nesse sentido, toda verdadeira teologia é fundamentalmente apofática.
Será naturalmente perguntado qual é a função da teologia
"catafática" ou afirmativa, a teologia dos "nomes divinos"
que encontramos manifestada na ordem da criação. Ao contrário da via negativa,
que é uma ascensão em direção à união, esta é uma via que desce até nós: uma
escada de "teofanias" ou manifestações de Deus na criação. Pode até
ser dito que é uma e a mesma via que pode ser seguida em duas direções
diferentes: Deus condescende em direção a nós nas "energias" nas
quais Ele é manifestado; nós nos aproximamos dEle nas "uniões" nas
quais Ele permanece incompreensível por natureza. A "suprema
teofania", a perfeita manifestação de Deus no mundo pela encarnação do
Verbo, conserva para nós seu caráter apofático. "Na humanidade de Cristo",
diz Dionísio, "o supra-essencial manifestou-se na substância humana, sem
deixar de se esconder depois dessa manifestação, ou para me expressar segundo
uma maneira mais celestial, nessa própria manifestação". [36] "As
afirmações de que a humanidade sagrada de Jesus Cristo é o objeto têm toda a
força das negações mais formais." [37] Tanto mais as teofanias parciais de
grau inferior escondem Deus naquilo que Ele é, enquanto O manifesta naquilo que
Ele não é por natureza. A escada da teologia catafática, que revela os
nomes divinos extraídos, acima de tudo, da Sagrada Escritura, é uma série de
passos que a alma pode subir para a contemplação. Essas não são as noções
racionais que formulamos, os conceitos com os quais nosso intelecto constrói
uma ciência positiva da natureza divina; elas são, antes, imagens ou idéias
destinadas a nos guiar e se adequar às nossas faculdades para a contemplação
daquilo que transcende todo o entendimento. [38] Especialmente nos níveis
inferiores, essas imagens são formadas a partir dos objetos materiais menos
propensos a desencaminhar as mentes não treinadas na contemplação. De fato, é
mais difícil confundir Deus com pedra ou fogo do que ser identificado com
inteligência, unidade, essência ou bondade. [39] O que parecia evidente no
início da ascensão - "Deus não é pedra, Ele não é fogo" - é menos e
menos ainda quando atingimos as alturas da contemplação, impulsionadas pelo
mesmo espírito apofático que agora nos leva a dizer: 'Deus não é ser, Ele não é
o bem'. A cada passo dessa ascensão, à medida que alguém se depara com imagens
ou idéias mais elevadas, é necessário evitar fazer delas um conceito, "um
ídolo de Deus". Então pode-se contemplar a própria beleza divina: Deus, na
medida em
que Ele se
manifesta na criação. A especulação gradualmente dá lugar à contemplação,
conhecimento à experiência; pois, ao rejeitar os conceitos que prendem o
espírito, a disposição apofática revela horizontes ilimitados de contemplação
em cada passo da teologia positiva. Assim, há diferentes níveis na teologia,
cada um apropriado às diferentes capacidades dos entendimentos humanos que
alcançam os mistérios de Deus. Neste contexto, São Gregório Nazianzeno retoma a
imagem de Moisés no Monte Sinai: "Deus ordena que eu entre na nuvem e
converse com Ele; se algum for Arão, suba comigo, e fique perto, estando
pronto, se for assim, para ficar fora da nuvem. Mas se algum for um Nadabe ou
um Abiú, ou da ordem dos anciãos, suba de fato, mas que fique de longe… Mas se
alguém for da multidão, indigno dessa altura de contemplação, se ele for
completamente impuro, que ele não se aproxime, pois seria perigoso para ele;
mas se ele for pelo menos temporariamente purificado, que ele permaneça abaixo
e ouça a voz apenas, e a trombeta, as palavras nuas de piedade, e que ele veja
a montanha fumegando e iluminando… Mas se existe uma besta maligna e feroz,
quero dizer aos homens incapazes de especulação e de teologia que não ataquem
os dogmas com fúria… que se afastem o máximo possível da montanha, ou serão
apedrejados.’[40]
Este não é um ensinamento mais perfeito ou esotérico
escondido do profano; nem é uma separação gnóstica entre aqueles que são
espirituais, psíquicos ou carnais, mas uma escola de contemplação na qual cada
um recebe sua parte na experiência do mistério cristão vivido pela Igreja. Esta
contemplação dos tesouros ocultos da Sabedoria divina pode ser praticada em
graus variados, com maior ou menor intensidade: seja uma ascensão do espírito
em direção a Deus, distanciando-se das criaturas, o que permite que Seu
esplendor se torne visível; seja uma meditação sobre as Sagradas Escrituras em
que Deus se
esconde, como se estivesse atrás de uma tela, sob as palavras que expressam a
revelação (Gregório de Nissa); seja através dos dogmas da Igreja ou através de
sua vida litúrgica; seja, finalmente, através do êxtase que penetramos no
mistério divino, esta experiência de Deus será sempre o fruto dessa atitude
apofática que Dionísio nos recomenda em
sua Teologia Mística.
Tudo o que dissemos sobre o apofatismo pode ser resumido em
poucas palavras. A teologia negativa não é meramente uma teoria do êxtase. É
uma expressão dessa atitude fundamental que transforma a totalidade da teologia
em uma contemplação dos mistérios da revelação. Não é um ramo da teologia, um
capítulo ou uma introdução inevitável sobre a incompreensibilidade de Deus, da
qual se passa tranquilamente a uma exposição doutrinária na terminologia usual
da razão e da filosofia humanas em
geral. O apofatismo
nos ensina a ver, acima de tudo, um significado negativo nos dogmas da Igreja: proíbe-nos
seguir os modos naturais de pensar e formar conceitos que usurpam o lugar das
realidades espirituais. Pois o cristianismo não é uma escola filosófica para
especular sobre conceitos abstratos, mas é essencialmente uma comunhão com o
Deus vivo. É por isso que, apesar de toda a sua aprendizagem filosófica e
inclinação natural à especulação, os Padres da tradição oriental, permanecendo
fiéis ao princípio apofático da teologia, nunca permitiram que seu pensamento
cruzasse o limiar do mistério, ou substituísse os ídolos de Deus por Deus
mesmo. É também por isso que não há filosofia mais ou menos cristã. Platão não
é mais cristão que Aristóteles. A questão das relações entre teologia e
filosofia nunca surgiu no Oriente. A atitude apofática deu aos Padres da Igreja
aquela liberdade e liberalidade com a qual empregaram termos filosóficos sem
correr o risco de serem mal interpretados ou de cair em uma "teologia de
conceitos". Sempre que a teologia é transformada numa filosofia religiosa
(como no caso de Orígenes), é sempre o resultado do abandono do apofatismo que
é verdadeiramente característico de toda a tradição da Igreja Oriental.
Incognoscibilidade não significa agnosticismo ou recusa em
conhecer a Deus. No entanto, esse conhecimento só será alcançado no caminho que
leva não ao conhecimento, mas à união - à deificação. Assim, a teologia nunca
será abstrata, operando através de conceitos, mas contemplativa: elevando a
mente àquelas realidades que ultrapassam todo entendimento. É por isso que os
dogmas da Igreja freqüentemente se apresentam à razão humana como antinomias,
tanto mais difíceis de resolver quanto mais sublime é o
mistério que expressam. Não se trata de suprimir a antinomia adaptando o dogma
à nossa compreensão, mas de uma mudança de coração e mente que nos permita
alcançar a contemplação da realidade que se revela a nós quando nos eleva a
Deus e nos une, de acordo com nossas diversas capacidades, a Ele.
O ponto mais alto da revelação, o dogma da Santíssima
Trindade, é eminentemente uma antinomia. Para alcançar a contemplação dessa
realidade primordial em toda a sua plenitude, é necessário alcançar o objetivo
que ela colocou diante de nós: atingir o estado de deificação; pois, nas
palavras de São Gregório Nazianzeno, "serão herdeiros da luz perfeita e da
contemplação da Santíssima e Soberana Trindade aqueles que se unirem totalmente
ao Espírito total, e assim será, segundo acredito, o Reino Celeste”. A via
apofática não leva a uma ausência, a um vazio absoluto; pois o incognoscível
Deus do cristão não é o Deus impessoal dos filósofos. É para a Santíssima
Trindade, "superessencial, mais que divino e mais que bom" [42] que o
autor da Teologia Mística se recomenda ao entrar no caminho que o levará a uma
presença e uma plenitude sem medida.
1 Scholia ou comentários sobre o Corpus
Dionysiacum que estão sob o nome de São Máximo são, em grande parte, obra de
João de Cipótolis (fl. 530-40) cujas notas foram confundidas com as de Máximo
por copistas bizantinos. O texto da Scholia apresenta uma estrutura em que é
praticamente impossível desvendar a parte que pertence ao próprio São Máximo.
Veja sobre este assunto as pesquisas de S. Epiphanovitch, Materiais para o
estudo da vida e obra de São Máximo o Confessor, Kiev, 1917 (em russo); e um
artigo do pe. von Balthasar intitulado "Das Scholienwerk des Johannes von
Scythopolis", em Scholastik, XV (1940), pp. 16-38.
2 Assim, para H. Koch, os escritos
areopagíticos foram obra de um falsificador do final do século V,
"Pseudo-Dionysius Areopagita in seinen Beziehungen zum Neoplatonismus und
Mysterienwesen" (Forsch. zu christl. Litter. und Dogmengeschichte 86, I, 1
and 2, Mainz, 1900). A mesma data é aceita por Bardenhewer (Les Pères de
l'Eglise; Paris, 1905). Pe. Stiglmayr identificaria o Pseudo-Dionísio com
Severus de Antioquia, um monofisita do século VI, "Der sogennante
Dionysius areopagita und Severus von Antiochen" (Scholastik III, 1928). Ao
criticar esta tese, M. Robert Devreesse transporta a data da composição dos
escritos de Dionísio para um período antes do ano 440, "Denys 1'Aréopagite
et Sévère d'Antioche" (Archives d’histoire doctrinale et littéraire du
moyen age, IV 1930). M. H.-Ch. Puech reivindicou a atribuição dos escritos a
uma data no final do quinto século, Liberatus de Carthage et la data
d'apparition des écrits dionysiens (Annuaire de l'École des Hautes Etudes,
1930-1931). Para Monsenhor Atenágoras, Dionísio foi um discípulo de Clemente de
Alexandria. Ele identifica-o com Dionísio, o Grande, bispo de Alexandria
(meados do século III), γνήσιος συγγραφεὺς τῶν εἰς Διονύσιον τὸν
Ὰρεοπαγίτην ἀποδιδομένων συγγραμμάτων, Athènes, 1932 ; Διονύσιον ὁ μέγας,
ὲπίσκοπος Ὰλεξανδρείας, ὁ συγγραφεὺς τῶν ἀρεοπαγιτικῶν σηγγραμμάτων,
Alexandrie, 1934. Finalmente, pe. Ceslas Pera, em seu artigo 'Denys le Mystique
et la θεομαχαα' (Revue des sciences philosophiques et théologiques, XXV, 1936),
detecta a influência do pensamento capadócio nos escritos dionisíacos, e
procura atribuí-los a um discípulo desconhecido de São Basílio.
3 Heb.
ii, 6.
4 Ep. I. ,
Migne P.G., III, 1065.
5 Quaestiones disputatae, VII, 5.
7
‘Mystical Theology’, I, 3, P.G., III, 1000.
8 Ibid.
1000–1001.
9
Ibid., 1048 B.
10
Enn., VI, ix, 3.
11 Ibid.
12
Ibid.
13
Enn., VI, ix, 4.
14
Enn., VI, ix, 10.
15
P.G., III, 1048
A .
16 Of
the Divine Names, XIII, 3; P.G., III, 981
A .
17 ‘П ρί ἀρχ ν’, P.G. XI, 125
A .
18
‘Adversus Eunomium’, I, i, c. 6, P.G., XXIX, 521–4; I. ii.
c. 4. 570–80; I. ii.
c., 648 ‘Ad Amphilochium, Epist. 234’ ,
P.G., XXXII, 869
A C. Cf. Gregory of Nyssa,
‘Con. Eunom’, X, P.G., XLV, 828.
19 ‘De
Vita Moysis’, P.G., XLIV, 377 B., new edition by J. Daniélou, S.J., Series
Sources chrétiennes (Paris, 1955), p. 82. ‘Con. Eunom.’, III, P.G., XLV, 604
B-D; XII, ibid., 944
C .
20 ‘In
Cantica Canticorum. Homil.’, XII, P.G., XLIV, 1028 D.
21
Oratio XXVIII (theol. II) 4, P.G., XXXVI, 29–32. Ed. A. J. Mason (The Five
Theological Orations of Gregory of Nazianzus), Cambridge ,
1899, p. 26.
22 ‘Stromata’, V, 2; P.G., IX, 109
A .
23
Ibid., V, 13, 124 B–125 A.
24
Ibid., V, 12, 116–124.
25
P.G., XLIV, 297–430. Ed. J. Daniélou, Sources Chrétiennes, 1bis.
26 Veja o artigo por M. Henri-Charles
Puech, ‘La ténèbre mystique chez le pseudo-Denys l’Aréopagite et dans la
tradition patristique,’ in Etudes Carmélitaines, Oct. 1938, pp. 33–53.
27 ‘In
Cant. Canticorum’, P.G., XLIV, 755–1120.
28
‘Oratio XXVIII (theologica II)’, 3, P.G., XXXVI, 29 AB.
29
‘Oratio XXXVII, In Theophaniam’, 8, ibid., 320 BC. Cf. ‘Or. XLV, In sanct. Pascha’,
4, ibid., 628D–629 A.
30
‘Oratio XXXVIII’, 7, ibid., 317 BC; ‘Oratio XLV’, 3, 625–628 A.
31 ‘De fide orthodoxa’, I, 4, P.G., XCIV,
800 BA.
32
‘Theophanes’, P.G., CL, 937
A .
33
‘Capita 150 physica, theologica, moralia et practica, cap. 78’ ,
P.G., CL, 1176 B.
34
‘Oratio XXXII, 12, P.G., XXXVI, 188
C .
35
‘Carmina moralia. X: П ρί ἀρ τ ’, P.G., XXXVII, 748.
36
‘Epist. III’, P.G., III, 1069 B.
37
‘Epist. IV’, ibid., 1072 B.
38
Gregory of Nyssa, ‘Con. Eunom.’,
P.G., XLV, 939–41.
39 ‘De Coel. hier., II, 3–5’, ibid., 140–5.
40
‘Oratio XXVIII (theologica II), 2’ ;
P.G., XXXVI, 28
AC .
41
‘Oratio XVI’, P.G., XXXV, 945
C .
42
‘Myst. Theology, I, 1’ ,
P.G., III, 997.