A base da ortodoxia é similar a metodologia utilizada nas ciências positivas, e esse fato precisa ser avaliado e identificado com precisão. Isso deve se tornar um foco de interesse para os cristãos ortodoxos, como merece ser.
Por que temos nossa tradição litúrgica? A tradição litúrgica é expressão da tradição de purificação, iluminação e glorificação. Considere todos os serviços: as vésperas, as matinas, a divina liturgia, os serviços do batismo e crisma, o serviço de bênção do crisma realizado pelos bispos na quinta-feira santa, a profissão monástica, casamento - tudo isso trata de purificação, iluminação e glorificação.
Existe um instrumento que é usado na teologia ortodoxa e constitui um elemento indispensável. Sem ele, a teologia ortodoxa não pode existir. É um instrumento chamado de faculdade noética. Embora seja um instrumento, não faz parte da ciência. Este é o único instrumento necessário para a visão divina.
Construímos telescópios, microscópios, balanças e todos os instrumentos utilizados em outras ciências, mas na teologia ortodoxa não construímos nenhum instrumento. Nós temos o instrumento pronto. É parte da personalidade humana. Nós não fazemos ele; tudo o que fazemos é colocar para funcionar. Nós empreendemos a purificação; nós provocamos a iluminação e a glorificação. Deus traz a iluminação e a glorificação. A iluminação e a glorificação são dons de Deus. A purificação, no entanto, é o trabalho do homem com a ajuda de Deus.
Quando tudo é dito e feito, para que o nous seja purificado (expulsando todos os pensamentos) nem sequer é necessário ser cristão. O monge hindu faz o mesmo. É um exercício que ele faz. Não é preciso ser cristão para realizar este exercício. No entanto, a purificação do nous (afastando os pensamentos) é uma coisa e a purificação das paixões é outra coisa. É a purificação não só do nous, mas das paixões que traz a graça divina.
Quando a compreensão patrística da purificação, iluminação e glorificação desapareceu - embora nossos serviços litúrgicos sejam cheios de purificação e iluminação - observe qualquer serviço - rezamos continuamente por purificação, iluminação e glorificação. Está em todos os hinos. Os serviços de Batismo, Crisma, Paraklesis, Compline, os Troparios e os Salmos estão cheios desse ensinamento. Mas, quando a interpretação patrística dessas coisas foi deixada de lado, a purificação foi reduzida à abstenção dos pecados, geralmente, pecados sexuais ou moralistas, como mentiras, roubos e assim por diante. Acabou sendo apenas um ensino ético que não cura a personalidade do homem.
Então, em vez de se preocupar em tratar o núcleo de sua personalidade, o homem passou a se preocupar com os atos externos, tendo uma disposição muito hipócrita. Ele passou a fingir que não tinha tentações, enquanto na verdade tinha. E pensou que poderia superá-las, mas depois viu que não conseguia. Ele pensou, portanto, que ninguém mais tinha tentações e se sentiu culpado. Os jovens ficam chocados com as tentações que eles têm.
Na tradição patrística, em contraste, esses problemas são resolvidos pela oração noética. Ensinar a alguém como ele deve se comportar não é o mesmo que ensiná-lo a encontrar força para se comportar desta maneira. Como ele não consegue fazê-lo, ele finge que conseguiu. Estas são coisas muito engraçadas. Há muita hipocrisia, particularmente entre os cristãos, e quanto mais piedosos são, mais hipócritas são estes dias. É assim que as coisas estão. Não podemos fazer nada sobre isso.
A teologia tem apenas um objetivo: a purificação, a iluminação e a glorificação. A teologia não tem outra finalidade. Você entende? A teologia não tem outro objetivo além da purificação, iluminação e glorificação.
O que é ortodoxia sem purificação, iluminação e glorificação? Não sei se você pode concluir, porque a Igreja não chegou a essa conclusão. Por que não? Porque havia mosteiros. A purificação, a iluminação e a glorificação, como costumavam ocorrer na maneira tradicional, gradualmente se tornaram a tarefa do monaquismo. O bispo, por assim dizer, se sentaria e agiria como administrador e diria: "Tenho cinco mosteiros. Se você quer levar esse tipo de vida, vá para um mosteiro. Estamos envolvidos na administração".
A purificação para os piedosos tornou-se uma libertação das falhas morais, do ponto de vista ético. Parece que a mentalidade grega tem um maior problema com o sexo do que com qualquer outra coisa. O problema do sexo tornou-se uma obsessão para os gregos modernos. Portanto, a purificação para piedoso significa não ter tentações sexuais.
A iluminação tornou-se a Escola Dominical: aprender a Sagrada Escritura, a história da Igreja, a vida de alguns santos; em outras palavras, o preenchimento da faculdade racional. Embora a purificação seja a iluminação do nous de uma pessoa, eles tentam iluminar sua razão. Em vez do nous ser iluminado, hoje em dia a faculdade racional é iluminada.
Sem purificação, iluminação e glorificação, não há salvação. Isto é a salvação: purificação e iluminação.
Definição de Purificação
A purificação é essencialmente o ascetismo que pratica-se evitando fazer coisas ruins e fazendo coisas boas. Começa com a ética; há uma orientação moral no início. Aprendemos a jejuar, a fazer tudo o que for necessário para avançar nos estágios iniciais.
Claro, os Padres da Igreja definem especificamente a purificação como a libertação do coração e do nous do domínio dos pensamentos (logismoi) e das paixões. A alma humana tem duas faculdades: a faculdade noética e a faculdade racional. Através da faculdade noética (o nous) o homem entra em contato com Deus e, através da faculdade racional, ele conhece o mundo ao seu redor. Em seu estado natural, a faculdade noética está localizada no coração e tem a lembrança de Deus, e a faculdade racional está no cérebro e forma pensamentos. Quando essas faculdades estão confusas e os pensamentos da mente tomam posse do nous e descem ao coração - na parte passível da alma, onde a raiva e o desejo estão - cria-se impurezas do nous e do coração. Assim, a purificação na tradição ortodoxa é entendida como a libertação da faculdade noética (o nous) de pensamentos, bons e ruins.
Então, o que é a purificação? Purificação significa que todos os pensamentos deixam o nous e apenas um permanece. Este pensamento é a lembrança de Deus, a impressão no coração do homem da lembrança de Deus, que agora funciona vinte e quatro horas por dia. Nós limpamos o nous completamente. Nós lançamos para fora do nous todos os conceitos e pensamentos. Nós deixamos o nous com um único pensamento. Ele tem um pensamento em vez de muitos: a oração de pensamento único começa. Esta é a cura do nous e o retorno da memória - a constante lembrança de Deus. O nous recupera a memória que perdeu. Assim, a purificação para os Padres é um estado ascético que o homem alcança após uma luta, não apenas para evitar o pecado - porque evitar o pecado é parte integrante do ascetismo - mas para purificar o coração.
A purificação do coração não significa apenas evitar o pecado. A purificação do coração significa que os pensamentos deixam o coração e vão para a faculdade racional, deixando o coração livre de pensamentos. [O coração] é deixado com um único pensamento - a oração. Isso é extremamente importante. Uma vez que é adquirida, ela é chamada de oração do coração ou oração de pensamento único. Este pensamento, a própria oração, constitui a constante lembrança de Deus. Esta é a purificação do coração segundo os pais. Não é simplesmente evitar o pecado.
Quando os Padres da Igreja falam sobre a purificação do nous, eles querem dizer que o nous deve ser esvaziado dos bons e maus pensamentos. Quando o nous está vazio e as paixões foram derrotadas, o Espírito Santo vem e visita. Então, o Espírito toma para Si mesmo para orar no coração do homem.
A oração do Espírito Santo não pode vir a alguém, a menos que seu nous já tenha sido esvaziado. Este é o início do tratamento terapêutico do homem. A oração de pensamento único significa a existência de um único pensamento, que é a lembrança de Deus: "Senhor Jesus Cristo, tende piedade de mim, pecador".
O próprio nous é o centro de todos os cinco sentidos. Quando o nous é purificado, os cinco sentidos são purificados. Então, os cinco sentidos tornam-se um sentido, um único sentido. Os cinco sentidos são unidos e se tornam um. Assim, quando alguém concentra seu nous em seu coração, ele pode guardar seus sentidos porque ele guarda seu nous. E desde que seu nous esteja envolvido apenas na oração, pois ele alcançou essa energia única do nous no coração, os problemas dos cinco sentidos também são resolvidos. Todos os conceitos partem do coração e do nous, tudo o que se origina dos sentidos e da faculdade racional, e esse esvaziamento do nous é também a sua purificação. Quando o nous é limpo pela constante lembrança de Deus e a oração noética, a única coisa que ocupa o nous é a lembrança de Deus ou a oração incessante. Nada mais.
Quando alguém chega a este estado, ele resiste com sucesso às tentações. Assim, vemos o fenômeno dos padres ascéticos que haviam obtido a oração noética e costumavam entrar em prostíbulos para salvar prostitutas, muitos dos quais eram presos nos prostíbulos. Como? Por estarem nesse estado, eles não eram mais afetados pelos arredores; eles não eram mais suscetíveis à influência de seu meio ambiente. Em vez de serem influenciados por seus arredores, eles mesmos tinham um efeito sobre os arredores. Em vez de serem escurecidos pelo ambiente, eles o iluminaram. É por isso que os Padres os chamam de "luzes brilhantes".
Na tradição patrística, que é a tradição da Sagrada Escritura, quando a purificação ocorre, então o homem é batizado na água, os seus pecados são perdoados, e depois há a crismação. Na ortodoxia, o pior ser humano pode ser purificado e atingir a iluminação. Dogmas são um guia para aqueles que passam pela purificação, e continua a ser um guia para aqueles que continuam a ser iluminados.
A purificação foi reduzida hoje em dia à moralidade. Devido ao pietismo que adentrou na Grécia, a purificação foi transformada de purificação ascética em purificação moral. Além disso, algumas pessoas afirmam que os cânones dizem que devemos tomar a Sagrada Comunhão todos os domingos. Em outras palavras, desde que sejamos morais e instruídos na fé, devemos tomar a Sagrada Comunhão todos os domingos.
Definição de Iluminação
O que é iluminação? Essencialmente, a iluminação não é iluminação da faculdade racional. Claro que há iluminação da faculdade racional: reza-se, se vai a igreja, jejua-se. O homem orienta a faculdade racional para fazer o que é certo: libertar os cativos, ajudar os pobres, ir voluntariamente doar sangue, todo esse tipo de coisas.
Para os Padres, a iluminação não é a iluminação da faculdade racional, mas do coração. Há a purificação do coração, depois a iluminação do coração, que não é uma iluminação racional, mas uma iluminação espiritual - isto é iluminação. Esta é a cura. A doença é quando o nous está escuro e a cura é quando o nous está iluminado.
O homem deve se preocupar com os essenciais da vida - com a família, a comunidade, o trabalho e assim por diante. Ele só pode rezar com a faculdade racional em intervalos durante o dia: matinas, vésperas, serviços de meia-noite, etc. O resto do dia ele pode tentar orar enquanto trabalha, mas se ele tentar, ele não será um bom trabalhador, para dizer o mínimo. Eles irão considerar ele um preguiçoso. Ele não será um trabalhador eficiente. Então ele precisa separar sua faculdade noética de sua faculdade racional. Como isso é feito? Expulsando todos os pensamentos da faculdade noética, do nous.
Não é preciso ser um filósofo para aprender essas coisas. Os Padres costumavam dizer que não era necessário ser educado para alcançar a iluminação. O ascetismo, e não a ciência e a aprendizagem, leva à iluminação do nous. Os Padres insistem muito sobre isso.
Quando o nous foi purificado, o nous começa a ser iluminado. Há aqueles que foram recém-batizados e há aqueles que foram recém-iluminados, e presume-se que os iluminados possuam a lembrança constante de Deus. O nous foi liberto da faculdade racional, das paixões e assim por diante, e só está ocupado com a oração, a oração noética e a lembrança de Deus.
Em nossa tradição, a iluminação ocorre quando o coração foi purificado e a multidão de nossos pensamentos foi substituída por um único pensamento, que é uma oração simples. Foi o que o apóstolo Paulo quis dizer com as palavras "Orai sem cessar" (Tessalonicenses 5:17). Isso é iluminação e é assim que São Paulo descreve. Isso é iluminação na Igreja primitiva.
O conhecimento adquirido através desta iluminação não é conhecimento filosófico, mas sim a oração. Não é o conhecimento racional, mas o conhecimento da oração, porque o conhecimento racional permanece na faculdade racional. A oração do iluminado é incessante. Ela dura vinte e quatro horas por dia, até mesmo durante o sono.
Todas as orações são palavras e conceitos, então palavras e conceitos são usados na experiência de iluminação pelo próprio Espírito Santo. Ele toma as próprias palavras com que oramos, os Salmos, por exemplo. O Espírito toma essas palavras e conceitos e ora em nós com nossas próprias palavras.
Nosso cativeiro chega ao fim quando a lembrança incessante de Deus é restaurada no cume das energias da alma, chamado de nous, que se transforma, deixando de ser um poder cativo nas garras das paixões. O que se entende por um nous obscurecido? A ausência do Espírito Santo orando no coração.
De acordo com os Padres da Igreja, alguém que é visitado pelo Espírito Santo adquire a iluminação do nous. O Espírito Santo entra no coração e nos dá a oração, então adquirimos oração noética, adoração noética. Caso contrário, nós damos a Deus uma adoração racional.
Quando alguém tem a oração associada ao estado de iluminação, isto é, a oração noética no coração, esta oração ilumina o seu nous. Ele agora vê através da fé, pelo testemunho do Espírito Santo, coisas dentro de seu coração que ele não via antes. Ele as vê através da fé e entende palavras e conceitos espiritualmente, não filosoficamente. Ele lê a Sagrada Escritura. Ele entende as palavras e os conceitos, não do ponto de vista do método filosófico, mas do ponto de vista da metodologia. Por quê? Porque as palavras e conceitos são considerados remédios para o homem.
Eu ouvi freiras dizerem: "Agora vou orar a oração noética". Elas se sentam, pegam um cordão de oração e pensam que é oração noética. Elas não entendem que a oração deve estar no coração, não só no cordão de oração e no cérebro. Elas não conhecem a diferença entre adoração racional e a noética. Não são a mesma coisa. São diferentes.
O iniciante que não consegue fazer isso, pois ele ainda não distinguiu entre o nous e a faculdade racional, senta e ora o tanto quanto pode com a faculdade racional, sob a orientação de seu pai espiritual. Ele ora continuamente até o dia em que, em vez de orar esta oração com sua faculdade racional, ele começa a orar com seu nous em seu coração. O pai espiritual guia a iluminação e também a verifica.
A oração noética é a ressurreição do nous, a libertação do nous da faculdade racional, das paixões, do corpo e seus arredores. O nous existe com o propósito de estar em contato com Deus apenas. A faculdade racional existe para permitir que o homem se adapte ao seu entorno, crie coisas, para que ele possa viver em harmonia com seu ambiente.
A pobreza é um requisito indispensável para alcançar a iluminação. Sem estar livre dos bens, não se pode chegar à iluminação. É impossível.
Basílio o Grande escreve que aquele que não sofre interrupção na constante lembrança de Deus devido às preocupações cotidianas é um templo de Deus. Isto é o que se entende quando cantamos (no hino querubínico) "Afastemos de nós neste momento todo o pensamento mundano". Se adquirimos a iluminação do nous, então, quando estivermos ocupados com cuidados cotidianos, essas preocupações mundanas não interromperão a contínua lembrança de Deus. Por que? Porque a faculdade racional está ocupada com cuidados mundanos enquanto o nous está incessantemente ocupado com a lembrança de Deus. Essas coisas acontecem ao mesmo tempo.
Alguém que não atinge a iluminação é auto-centrado. Ele é dominado pelo instinto de auto-preservação e torna-se ganancioso. Ele quer tornar-se rico, adquirir bens, fazer coisas, encontrar segurança, e tem todo tipo de atitudes estranhas hostis em relação a seus semelhantes, a ponto de cometer assassinatos, roubar e mentir.
Esses estados não são curados simplesmente pela fé no Evangelho. Há muitas pessoas que acreditam no Evangelho. Sacerdotes sentam-se durante todo o dia nos dizendo para nos amarmos uns aos outros e nenhum deles nos diz como amar. O amor "não procura seus interesses" (1 Cor. 13: 5). Como alguém pode adquirir esse amor? Como é feito?
Quando a iluminação do nous começa e se torna um estado integrado e estável, o egoísmo e o egocentrismo são gradualmente substituídos pelo amor que "não procura seus interesses". A perfeição do amor surge através do aparecimento de Cristo "em glória" para aquele que é espiritualmente vigilante. Quando alguém chega a este estágio, ele alcançou a theoria e está a caminho da glorificação. Não são pessoas que são meramente morais, mas pessoas curadas no núcleo de sua personalidade.
Quando Cristo disse: "Vocês são a luz do mundo" Ele quis dizer aqueles cristãos que estavam iluminados. Os cristãos não são a luz do mundo simplesmente porque acreditam em Cristo. A essência da Sagrada Tradição, seu núcleo, é a iluminação, através da qual passamos a frente a tocha. O homem torna-se uma luz brilhante para iluminar os outros. Assim, a iluminação é a essência do cristianismo, onde os iluminados que espalham luz entregam a luz aos outros, que é diagnóstico e a cura. A cura é a iluminação do homem.
Por que aqueles que negaram o Cristo em vez de enfrentar o martírio foram excluídos da Sagrada Comunhão? Porque era prova de que eles não tinham atingido o estado de iluminação. Se estivessem em estado de iluminação, que é a oração noética, teriam sido incapazes de negar a Cristo. Isso não aconteceu porque a Igreja queria punir essas pessoas. Foi simplesmente em reconhecimento do fato de que essas pessoas não estavam em estado de iluminação. Não estando num estado de iluminação, eles não deveriam tomar a Sagrada Comunhão.
Se não alcancei a iluminação, não estou pronto para encarar a glória de Deus. Se alguém chegou à iluminação e à oração noética, desde que seja fiel até o fim, ele deixará relíquias sagradas.
O clero não tem monopólio neste tratamento terapêutico. O tratamento pode ser dado por qualquer um que tenha oração noética, ao passo que o clero celebra os Mistérios. Estas são duas coisas diferentes, então, na ortodoxia, elas sempre foram separadas. O celebrante está ocupado com os rituais. Mas alguém que alcançou a iluminação será o pai espiritual.
Definição de Glorificação
O homem foi criado para estar em estado de iluminação ou de glorificação. A glorificação é um estado empírico. Não tem nada a ver com a metafísica. A glorificação do homem significa união com Deus, ou theosis. É a theoria divina, a visão divina. O homem se torna deus pela graça durante a visão de Deus, se ele alcançar a este ponto. O objetivo da Sagrada Escritura é levar o homem à visão divina, à glorificação, para que ele possa ver Cristo em glória.
Quando o homem é glorificado, isso significa que ele vê a glória em que ele se encontra. Somente alguém que está dentro da luz incriada vê a luz incriada. É preciso estar em Deus para ver Deus. O homem vê Deus através de Deus.
A experiência da glorificação enche as páginas do Antigo Testamento e do Novo Testamento. Theosis não está lá, mas a glorificação está. O apóstolo Paulo usa a palavra "glorificado" para descrever a theosis (1 Cor. 12:26; 2 Cor. 12: 1-6). Theosis, ou glorificação, é a santificação do homem, a sua participação na glória. Quando os Padres da Igreja dizem "theosis" ou "glorificação", eles estão se referindo à visão divina, que é a visão da glória de Deus, Sua Luz incriada. Os profetas no Antigo Testamento viram a glória de Cristo, o que significa que eles alcançaram a glorificação. O mesmo pode ser dito sobre aqueles que viram Cristo em glória no Novo Testamento. O homem não pode ver Deus a menos que tenha sido glorificado. A diferença é que os profetas experimentaram a glorificação antes da encarnação e da salvação, enquanto os apóstolos experimentaram a glorificação após a encarnação e da salvação.
A glorificação é o conhecimento mais seguro de Deus. A glorificação transcende o entendimento, e é por isso que São Gregório, o Teólogo diz: "É impossível conceber Deus". Mesmo os glorificados não podem conceber Deus. O glorificado conhece Deus sem conhecimento, e concebe sem entender, e ouve sem ouvir, e vê invisivelmente, e assim por diante. Chega-se à glorificação quando se vê o que é incriado. A visão de algo criado vem de energias demoníacas, mesmo que pensemos que estamos vendo Deus.
Glorificação é uma repetição de Pentecostes. Aqueles que alcançam a glorificação têm igual graça com os Apóstolos no Pentecostes. Não há diferença, pelo menos do ponto de vista patrístico. Os Padres dizem que o Pentecostes é a maior experiência de glorificação antes da Segunda Vinda. Isto é assim porque é a glorificação que existia no Antigo Testamento com a adição da encarnação e da salvação.
No estado de glorificação, a oração cessa. A visão divina toma o lugar da oração, então não se ora, mas se tem a visão de Deus. Quando a experiência da glorificação chega ao fim, volta-se à oração. O estado de glorificação não é um estado permanente. Qualquer um que alcança a glorificação volta à iluminação. Poderia durar um minuto, uma hora, um dia, uma semana, 40 dias ou um ano; Deus determina a duração. No entanto, há aqueles no estado de iluminação que nunca alcançam a glorificação, porque não há necessidade espiritual. A glorificação é dada por Deus, não apenas para atender às necessidades pessoais, mas geralmente para atender às necessidades dos outros.
No estado de glorificação, o conhecimento de Deus desaparece, a teologia não existe mais, porque vemos Cristo agora "face a face". O conhecimento das coisas criadas não é abolido, porque ainda temos nossos sentidos. O Apóstolo Paulo foi cegado pela Luz, mas falou e ouviu enquanto estava nesse estado. Ele não comeu e bebeu por três dias, porque essa função natural cessa. Quando esse estado de glorificação cessa, a oração e a profecia começam novamente; prega-se e ensina-se e assim por diante.
A oração noética também cessa na experiência da glorificação. Quando a glorificação, a visão divina, cessa, a oração noética começa de novo. Glorificação é um conhecimento direto e experiência de Deus. No entanto, alguém em estado de glorificação pode celebrar a Liturgia e dizer as orações da Igreja como de costume.
Sabemos da experiência de Moisés no Sinai e da experiência dos santos, que como Moisés chegaram à theoria antes da morte corporal, que durante esta experiência de glorificação as paixões naturais e irrepreensíveis são suspensas de tal forma que não há fome, sede , cansaço, medo, desconforto ou sono. O estado de perfeição é tal que o diabo se torna, em sua maior parte, se não completamente, impotente. É por isso que temos os estilitas que suportaram os elementos extremos a que estavam totalmente expostos, e os ascéticos que sofreram fome e sede extremas, geadas e calor extremos.
A teologia da Igreja é uma expressão da experiência da theosis, a glorificação do homem, quando ele alcança a revelação. A teologia vem da visão divina dos profetas, dos apóstolos, dos santos e de todos os que foram glorificados. A oração noética é o fundamento da teologia e a teologização, segundo os pais. Na Igreja primitiva, alguém era autorizado a teologizar apenas quando havia alcançado a iluminação. Ele era chamado de teólogo quando havia chegado à glorificação. Este é o uso histórico desses termos.
A teologia ortodoxa significa que alguém vê e, com base na experiência da visão divina e da glorificação, ele teologiza. O que ele vê no estado de glorificação? Ele vê todos os dogmas. Aquele que ora teologiza, e aquele que teologiza ora. Teologia e oração são a mesma coisa. Quando os Padres teologizam, eles não teologizam apenas da Sagrada Escritura, mas de sua própria experiência. As expressões sobre Deus são, portanto, simbólicas. É por isso que temos o termo "teologia simbólica", porque usamos símbolos para falar sobre Deus.
De acordo com os Padres da Igreja, a glorificação é a liberdade perfeita, e a purificação e a iluminação são o início da liberdade. As relíquias sagradas são o resultado da glorificação, pois alguém que alcançou a glorificação é suspenso entre a imortalidade e a corrupção; há uma certa degradação, mas a identidade das células é preservada em grande medida. Quando os glorificados partem para o Senhor, eles continuam glorificados. Eles não deixam de ser glorificados e compartilham a glória de Deus, na visão divina. É por isso que oramos para essas pessoas e pedimos que intercedam por nós.
Estes são os sermões vivos da ortodoxia. A ortodoxia sempre se baseia na vida dos santos. O calendário dos santos é a espinha dorsal da teologia ortodoxa.
Do livro Empirical Dogmatics of the Orthodox Church According to the Spoken Teaching of Father John Romanides, vol. 2. pp. 260-329.
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