sábado, 14 de setembro de 2019

23 diferenças entre o Oriente e o Ocidente cristão


A lista abaixo destaca algumas (mas não todas) diferenças doutrinárias, litúrgicas e eclesiológicas que existem entre a Igreja Católica Romana, por um lado, e a Igreja Ortodoxa, por outro. Por uma questão de clareza, dividi as diferenças em três seções de tópicos:

[A] Diferenças teológicas

(01) O Oriente e o Ocidente vêem a Trindade de modo diferente. O Ocidente tende a seguir Tomás de Aquino e a tradição agostiniana, que considera as pessoas (hypostaseis) da Trindade como relações de oposição dentro da essência divina (ousia) e que mantém que é a unidade da essência divina (ousia) que estabelece o fato de que existe apenas um Deus. Enquanto o Oriente mantém que as três pessoas divinas (hypostaseis) são realmente distintas uma da outra, não por causa de suas relações em si, mas por causa de suas origens distintas. Assim, a pessoa (hypostasis) do Pai é distinta da pessoa (hypostasis) do Filho e da pessoa (hypostasis) do Espírito, porque o Pai é a causa sem origem da divindade, enquanto o Filho é eternamente gerado pelo Pai, e o Espírito Santo eternamente procede do Pai apenas. O Pai é única causa pessoal (hipostática) da divindade. Em outras palavras, a pessoa (hypostasis) do Pai é ingerada, e a pessoa (hypostasis) do Filho é gerada pelo Pai, e a pessoa (hypostasis) do Espírito Santo é espirada pelo Pai apenas através da processão (ekporeusis). Consequentemente, na teologia do Oriente, existe apenas um Deus, porque existe apenas um Pai, de quem toda a Trindade se origina.

(02) No Ocidente, Deus é considerado ato puro (actus purus), e, como tal, não há distinções reais dentro da divindade, porque mesmo as três pessoas divinas (hypostases) são distintas apenas uma em relação a outra, e não em relação à essência divina (ousia). Assim - na teologia ocidental - essência (ousia) e pessoa (hypostasis) são idênticas em Deus (veja Summa Theologica, Prima Pars, Q. 39, art. 1); enquanto - na teologia oriental - essência (ousia) e pessoa (hypostasis) são realmente distintas uma da outra. Além disso, além da real distinção entre essência (ousia) e pessoa (hypostasis) na triadologia oriental, há também uma distinção feita entre essência (ousia) e energia (energeia) em Deus, com a energia divina sendo Sua glória incriada, que flui para a humanidade como um dom de Sua vida e graça.

(03) Juntamente com essas distinções teológicas (isto é, essência, pessoa e energia), mantém-se que a própria essência divina (ousia) é completamente incognoscível, porque Deus, em Sua essência (ousia), está verdadeiramente além da essência (hyperousios) e além de Deus (hypertheos). Como conseqüência, Deus não se revela em Sua essência (ousia); em vez disso, Ele se revela tri-pessoalmente através de Suas energias incriadas (energeiai).

(04) Pelo que foi dito nos pontos acima, fica claro que o Ocidente e o Oriente entendem a simplicidade divina de maneira diferente. O Ocidente mantém que em Deus não há distinções reais entre o que chama de Seus atributos e Sua essência (ousia), portanto, todos os atributos divinos são idênticos à essência divina. Enquanto no Oriente, a simplicidade divina é entendida como a co-inerência ou interpenetração (pericorese) da essência divina na multiplicidade das energias incriadas de Deus; e assim, cada energia é distinta de qualquer outra energia (por exemplo, a vontade divina é distinta do amor divino, que é distinta da verdade, que é distinta da misericórdia, que é distinta da justiça divina etc.), mas a essência divina (ousia) está presente como um todo em cada uma das energias distintas. Isso significa que a essência divina é indivisivelmente dividida entre as energias personalizadas (enhipostáticas) das três pessoas divinas (hypostaseis). [NT: Os Padres da Igreja, desde o princípio, entenderam a simplicidade divina no sentido de que Deus, sendo absolutamente imaterial e incorpóreo, não pode sofrer divisão ou desagregação em partes, nem tampouco a corrupção ou decomposição no pó da terra, como sucede com os seres corpóreos. Já o conceito latino de simplicidade metafísica absoluta, isto é, da identidade entre a essência e cada um dos atributos, foi influenciado pelo neo-platonismo e adotado pelo tomismo.] Uma nota de esclarecimento é necessária neste momento, porque, embora as energias incriadas correspondam, em certo sentido, ao que o Ocidente chama de atributos, identificar esses dois termos (atributos e energias) pode levar à confusão teológica. No Ocidente, os atributos divinos são normalmente considerados distintos apenas no sentido noético, isto é, são considerados distintos apenas mentalmente (isto é, na mente); e é por isso que o Oriente evita o uso do termo "atributos" quando se refere às energias incriadas de Deus, porque fazendo assim minaria a real distinção que existe entre essência (ousia) e energia (energeia) em Deus, reduzindo-a a uma distinção epistêmica. Além disso, reduzir a distinção entre a essência divina e as energias divinas incriadas para algo que é meramente epistêmico (mental) leva a grandes problemas teológicos na tradição Ortodoxa em relação a doutrina da divinização (theosis).

(05) Como indiquei acima, o Oriente faz mais uma distinção, sem causar separação, na divindade, entre a essência divina (ousia) e as energias divinas incriadas (energeiai). A essência divina (ousia) é completamente incomunicável e transcendente e, como tal, está além da essência (hyperousios); consequentemente, não pode ser conhecida, nem agora, nem mesmo no eschaton. Deus é revelado apenas em Suas energias incriadas, que fluem das três pessoas divinas (hypostaseis) como um dom para o homem (isto é, como graça). Além disso, é somente pela participação do homem nas energias divinas que ele pode realmente possuir um conhecimento experiencial de Deus.

(06) O Ocidente, pelo menos desde a época dos escolásticos, ensinou que a graça é uma realidade criada, enquanto o Oriente - por outro lado - mantém que a graça é incriada. No Oriente, a graça - como indiquei acima - é a energia divina (energeia), que significa que a graça é o próprio Deus, como Ele existe para nós, isto é, como Ele existe fora de Sua essência incomunicável (ousia). Não há conceito de "graça criada" na tradição Ortodoxa oriental.

(07) Como conseqüência de seu ensino sobre a graça, o Oriente sustenta que a divinização (theosis) é causada por uma participação ontológica nas energias incriadas de Deus, e que através das energias divinas o homem realmente participa da vida e glória divinas. As energias incriadas são Deus, como Ele existe fora de Sua essência incompreensível (ousia), e assim as energias divinas são verdadeiramente distintas da essência divina, mas sem serem separadas dela.

(08) O entendimento Ortodoxo da predestinação também difere do entendimento do Ocidente. O Oriente mantém que todos os homens no nível da natureza estão predestinados à redenção através da encarnação do Filho de Deus. Em outras palavras, através da encarnação do Logos eterno, toda a natureza humana foi libertada da corrupção e da dissolução na inexistência provocada pelo pecado ancestral de Adão, e recebeu o dom da redenção da existência eterna. Mas a salvação, por outro lado, diz respeito à integração da pessoa humana (hypostasis) com suas virtudes naturais através do poder das energias incriadas de Deus e à atividade de seu próprio livre arbítrio. A salvação exige que o homem ordene sua vontade através da graça fazendo o bem e evitando o mal. Se um homem vive uma vida boa pelo poder de sua vontade restaurada pela graça, ele pode alcançar a visão de Deus, mas se ele fracassar em integrar suas virtudes naturais em sua pessoa (hipóstase), vivendo uma vida de pecado e vício, ele condena a si mesmo. Assim, na teologia oriental, a predestinação é a redenção universal de todos os homens e de toda a própria criação da corrupção e da inexistência, enquanto a salvação envolve a integração das virtudes naturais do homem com sua existência pessoal (enhipostática) através do poder das energias incriadas de Deus e seu próprio livre arbítrio.

[B] Diferenças litúrgicas

(09) Os ocidentais e os orientais fazem o sinal da cruz de modo diferente, com os orientais fazendo o sinal da testa até o ventre e depois do ombro direito para o ombro esquerdo. O Ocidente começou a fazer o sinal da cruz terminando no ombro direito em algum momento entre os séculos XII e XIII.

(10) O uso do filioque (que significa "e do Filho") na seção final do credo niceno-constantinopolitano em conexão com a processão do Espírito Santo não é aceito como legítimo pelos Ortodoxos. O credo niceno-constantinopolitano, como foi originalmente escrito, não incluía o filioque, mas, infelizmente, o Ocidente adicionou o filioque ao credo, começando na Espanha por volta do século VII, com o filioque finalmente sendo adicionado em Roma em algum momento durante a primeira parte do século 11. [Para mais informações sobre o filioque, veja o adendo na parte inferior do texto]

(11) Nas igrejas orientais, homens casados podem ser ordenados para o diaconado e o sacerdócio; mas, como a Igreja latina, apenas homens celibatários podem ser consagrados como bispos.

(12) Na teologia sacramental bizantina, o padre (e não o casal) é o ministro do sacramento do matrimônio e, portanto, sua bênção é necessária para a validade do sacramento, que é chamado de "coroação" no Oriente. Isso também significa que um diácono não pode oficiar um casamento Ortodoxo.

(13) Na teologia oriental, considera-se que o pão e o vinho da Eucaristia são consagrados no corpo e no sangue de Cristo por toda a anáfora, e especificamente pela oração da epiclesis (a invocação do Espírito Santo), e não pelas "palavras da instituição", como no Ocidente. 

(14) Na celebração da Eucaristia, as Igrejas Ortodoxas usam pão fermentado e não pão sem fermento (ázimo), e como Pe. Jungmann explicou no seu magnum opus sobre a liturgia romana, essa diferença surgiu no século IX, quando a Igreja romana rompeu com a prática original de usar pão fermentado (Veja Pe. Joseph Jungmann, Missa do Rito Romano, 2: 33-34; veja também Pe. Adrian Fortescue, A Missa: Um Estudo da Liturgia Romana, páginas 300-303; veja também Pe. Johannes H. Emminghaus, A Eucaristia: Essência, Forma, Celebração, páginas 70 e 162).

(15) A igreja Ortodoxa, ao contrário da igreja latina e das igrejas protestantes, usa a tradução grega do Antigo Testamento comumente chamada de Septuaginta (LXX) e, por causa dessa diferença, a igreja Ortodoxa tem um cânone maior das escrituras em comparação com a Igreja Latina (por exemplo, a Igreja Ortodoxa canta a "Oração de Manassés" durante a Grandes Completas).

(16) Na Igreja Ortodoxa os ícones são sempre imagens bidimensionais escritas de acordo com regras estéticas específicas, muitas vezes referidas como "perspectiva reversa", e, portanto, raramente se vê estatuária (ou mesmo pinturas naturalistas) em uma Igreja Ortodoxa.

(17) Acredita-se também que os ícones contenham energia divina e, assim, concedem graça àqueles que os veneram. [NT: É importante ressaltar aqui, principalmente para os protestantes, que veneração (do grego "dulia", presta-se aos santos e às imagens e relíquias) não é o mesmo que adoração (do grego "latria", presta-se exclusivamente a Deus)]. Os ícones, por serem cheios de energia, manifestam a pessoa ou evento retratado neles e, consequentemente, não são meros sinais apontando para uma realidade ausente, mas tornam presente a realidade pessoal do santo ou evento.

(18) Como um ícone é produzido (isto é, escrito) é regulado na tradição Ortodoxa, porque acredita-se que um ícone seja uma expressão viva da fé Ortodoxa. Em outras palavras, um ícone não é uma obra de arte, e o iconógrafo não é um artista no sentido moderno dessa palavra, porque ele não está tentando expressar suas próprias idéias, nem está tentando exibir seus próprios talentos naturais. O iconógrafo está, em primeiro lugar, criando uma oração litúrgica, uma janela para o céu, e para isso deve viver a fé Ortodoxa através da oração e do jejum, seguindo as normas estabelecidas pela tradição iconográfica da Igreja. Além disso, ao escrever um ícone, o iconógrafo está criando uma memória específica (anamnesis) de um evento ou pessoa na vida da Igreja, uma memória (anamnesis) que é idêntica à memória (anamnesis) de toda a Igreja. Assim, um ícone é uma teofania, isto é, é uma manifestação de Deus através de uma erupção de energia divina no mundo, o que significa que um ícone é realmente o que significa; e assim, tocar um ícone é tocar a realidade pessoal do próprio mistério. Para obter mais informações sobre ícones, eu recomendaria obter uma cópia do livro: O Sentido dos Ícones, de Leonid Ouspensky e Vladimir Lossky. Outros textos úteis incluem o livro do Pe. Kucharek, A liturgia bizantina-eslava de São João Crisóstomo, e a obra de dois volumes de Leonid Ouspensky, intitulado Teologia do ícone.

(19) Na Igreja Ortodoxa, os sacramentos da iniciação não são separados; e assim, os bebês são batizados, crismados com o santo myron (confirmados) e recebem a primeira comunhão durante o mesmo serviço ritual.
(20) A Igreja Ortodoxa rejeita a idéia de que existem apenas sete santos mistérios (sacramentos).

(21) A voz humana, de acordo com a tradição da Igreja Ortodoxa, é o único instrumento musical permitido durante as celebrações litúrgicas, pois, como escreveu São João Crisóstomo: "Antigamente Davi cantou canções, hoje também cantamos hinos. Ele tinha uma lira com cordas sem vida, a Igreja tem uma lira com cordas vivas.As nossas línguas são as cordas da lira com um tom diferente, de fato, mas muito mais de acordo com a piedade. Aqui não há necessidade da citara, nem de cordas esticadas, nem de palheta, nem de arte, nem de nenhum instrumento; mas, se quiser, você mesmo pode se tornar uma citara, mortificando os membros da carne e criando uma completa harmonia da mente e do corpo. Pois quando a carne já não mais cobiçar contra o Espírito, mas se submeter a suas ordens e for conduzida longamente ao melhor e mais admirável caminho, você criará uma melodia espiritual "[Exposição sobre Salmos, nº 41].

[C] Diferenças eclesiológicas
(22) A maior diferença eclesiológica, claro, diz respeito ao lugar do bispo de Roma na Igreja. Os ortodoxos rejeitam qualquer tipo de primazia que o coloque isolado da estrutura sinodal da Igreja (isto é, do episcopado universal). Nesse sentido, a primazia e a sinodalidade são consideradas recíprocas (veja o Cânon 34 das Constituições Apostólicas). [NT: No cânon 34 lê-se: Os bispos de todas as nações devem reconhecer quem é o primeiro entre eles e considerá-lo seu líder, e não fazer nada de importante sem o seu consentimento; mas cada [bispo] somente pode fazer as coisas que dizem respeito à sua diocese e às terras que pertencem a ela. Não permita  que ele (que é o primeiro) faça algo sem o consentimento de todos; pois assim haverá unanimidade e Deus será glorificado através do Senhor no Espírito Santo.] Todos os bispos são sucessores de todos os apóstolos, incluindo Pedro. A Igreja Ortodoxa nunca aceitou a idéia de que Roma detém o primado por revelação divina. A primazia concedida ao bispo de Roma entre os patriarcas baseia-se nas decisões canônicas dos concílios ecumênicos.

[NT: Veja o cânon 28 do Concílio de Calcedônia que atribui a primazia de Roma ao fato de ser uma cidade importante (imperial) e não a um "direito divino": Os Padres atribuíram corretamente as prerrogativas a sé da antiga Roma, porque era a cidade imperial. E assim, movidos pelo mesmo raciocínio, concedemos prerrogativas iguais a santa sé da Nova Roma [Constantinopla], considerando com justiça que essa cidade é honrada pelo poder imperial e pelo senado e desfruta de prerrogativas iguais às da antiga Roma, a cidade imperial mais antiga e deve ser elevada como a antiga Roma nas questões da Igreja, ficando em segundo lugar depois dela.  Observe que a frase "porque era a cidade imperial" não dá credibilidade a nenhum argumento de primazia baseado no fundamento apostólico. Pe. Meyendorff também argumenta que havia muitas cidades de origem apostólica no Oriente, nenhuma das quais reivindicava autoridade primazial. Ele escreve: "Antioquia, Corinto, Tessalônica e muitas outras igrejas foram fundadas por apóstolos, mas nunca reivindicaram primazia com base nesse fato".(Retirado do artigo Primacy and Unity in Orthodox Ecclesiology do site orthodoxwiki)]

(23) Uma eclesiologia bizantina de comunhão [eclesiologia eucarística], que vê cada Igreja local como a plena realização da Igreja una, santa católica e apostólica através da celebração da liturgia e da profissão da fé Ortodoxa, sob a orientação de um bispo em sucessão apostólica, é incompatível com a eclesiologia universalista romana medieval tardia promovida pelos escolásticos, que divide a Igreja em partes que só depois são juridicamente unidas por um conceito de subserviência hierárquica ao bispo de Roma.

Adendo sobre o filioque
A triadologia Ortodoxa, diferentemente da teologia escolástica ocidental, centra-se em primeiro lugar na monarquia do Pai, que é visto como o único princípio (arche), fonte (pege) e causa (aitia) da divindade. Segue-se da doutrina da monarquia do Pai que tanto o Filho como o Espírito Santo recebem sua subsistência somente Dele, ou seja, somente Ele (o Pai) é a única fonte e origem; e assim, eles (o Filho e o Espírito Santo) são - como consequência - um em essência (homoousios) com Ele. Além disso, é importante lembrar que a própria palavra homoousios, usada pelo Primeiro Concílio Ecumênico de Nicéia para descrever a comunhão eterna da natureza que existe entre o Pai e o Filho, é um termo que indica uma relação de dependência . Em outras palavras, o uso do termo homoousios pelos Padres da Igreja envolve o reconhecimento do fato de que o Filho recebe Sua existência como pessoa (hypostasis) somente de Deus Pai, por geração (gennatos), e que Ele depende do Pai em relação à Sua natureza co-essencial. Dito isto, segue-se que o Filho procede da pessoa do Pai (hypostasis), e não da essência divina (ousia), que é sempre absolutamente comum às três pessoas divinas. O mesmo se aplica à processão hipostática (ekporeusis) de origem do Espírito Santo, em oposição à Sua projeção (proienai)*, porque Ele também recebe Sua existência somente do Pai, isto é, da pessoa do Pai (hypostasis), e não da essência divina (ousia), que - como eu já indiquei - é absolutamente comum às três pessoas divinas [veja São Gregório Palamas, "Logos Apodeiktikos", I, 6]. Assim, é do próprio Pai pessoalmente que as outras duas pessoas da Santíssima Trindade derivam sua subsistência eterna e sua natureza co-essencial.

Agora, com as informações anteriores em mente, fica claro que a Igreja Ortodoxa deve rejeitar qualquer sistema ou teoria teológica que tente elevar o Filho a um co-princípio de origem em relação à processão existencial (ekporeusis) do Espírito Santo como pessoa (hypostasis), porque na triadologia bizantina uma proposição teológica desse tipo implica tanto o pecado do diteísmo, que envolve postular a falsa ideia de que existem dois princípios ou causas da divindade (ou seja, o Pai e o Filho); ou a heresia do modalismo sabeliano, que envolve propor a falsa noção de que o Espírito Santo como pessoa (hypostasis) procede do Pai e do Filho "como um princípio", causando assim uma mistura não intencional das pessoas do Pai e do Filho dando ao Filho uma característica pessoal (isto é, o poder de espirar o Espírito Santo como pessoa) que é própria somente ao Pai.


The Differences Between the Christian East and the Christian West" escrito por Steven Todd Kaster 



*NT: O filioque, formulado pelos escolásticos, é inaceitável para o Oriente, porque envolve uma confusão da processão hipostática do Espírito (ekporuesis) de origem como pessoa, que é somente do Pai, com Seu envio pelo Filho (ou através do Filho) no tempo (economia). Ou seja, para a teologia Ortodoxa, há uma distinção entre ekporuesis (processão, referente a eternidade) e proienai (projeção ou envio, referente ao envio temporal): "ekporuesis" refere-se ao ponto de origem do Espírito Santo. Uma vez que essa origem é 'de toda a eternidade' (ou seja, fora do tempo, antes do início do tempo), refere-se à origem eterna do Espírito Santo e não à Sua missão temporal (seu envio ao mundo no tempo).

Até declarações recentes do Vaticano confirmam esse entendimento.
o termo "ekporeusis", distinto do termo "proceder" (proienai), pode apenas caracterizar uma relação de origem com o princípio sem princípio da Trindade: o Pai.
Fonte: L'Osservatore Romano, 20 de setembro de 1995: 'As tradições grega e latina relativas à processão do Espírito Santo'

NT: O famoso teólogo protestante americano Jaroslav Pelikan - que no fim de sua vida converteu-se ao Cristianismo Ortodoxo - escreveu: O filioque não era apenas ilegítimo, mas também incorreto. Foi baseado em certas premissas teológicas que o Oriente considera inadequadas ou errôneas e que se tornaram visíveis no decorrer dos debates. Várias dessas premissas estavam na área do que deve ser chamado de 'método teológico', pois envolviam diferenças na maneira como a doutrina trinitária deveria ser entendida. Além dessas diferenças metodológicas, havia algumas diferenças metafísicas centrais na doutrina de Deus em si ... (Pelikan, Spirit, pp. 192-193)

NT: O autor do texto usa os termos "igrejas orientais" e "teologia oriental" de forma ampla no texto original, sem precisar que nem toda "igreja oriental" está em comunhão com a Igreja Ortodoxa. Ele escreve assim porque ele mesmo parece ser um uniata (isto é, ele faz parte das igrejas católicas romanas e segue o rito oriental ou bizantino). Por isso, para evitar confusão, preferi omitir as referências que ele faz no texto as igrejas uniatas (pois essas não estão em comunhão conosco e ainda que exteriormente sejam semelhantes, essa semelhança é meramente superficial).

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