quarta-feira, 18 de maio de 2016

A Busca da Verdade no Caminho da Razão (A. I. Osipov)


É impossível que o homem nunca tenha se incomodado, mesmo que apenas por breves momentos em sua vida, por estas questões: Por que eu vivo? Qual é o significado de toda existência? Onde é que tudo acaba? Que é verdade? Para muitos estas são questões de vida e morte.

Estas questões eram sérias para um asceta piedoso do século XX, Igumen Nikon  (Vorobev,   †1963). Sua sede por respostas para estas questões era tão grande que quando era estudante ele gastava seus últimos centavos, literalmente passando fome, para comprar livros. Ele só podia ler a noite. A princípio ele mergulhou totalmente na ciência. Acompanhou todas suas últimas conquistas. Ansiava pelo momento em que a ciência daria a palavra final e toda a verdade seria revelada. Mas, infelizmente, quanto mais ele aprendia, mais decepcionado se tornava pela capacidade da ciência em explicar qualquer coisa menos sobre o significado da vida. Ele descobriu que a ciência não estava interessada nesta questão. Ele se voltou para a filosofia. Ao mesmo tempo tornou-se particularmente interessado em Henri Bergson. Estudou as línguas francesa e alemã. Graças ao seu surpreendente vigor intelectual e talento, atingiu tamanho sucesso na filosofia que até mesmo seus professores, às vezes, vinham até ele para consultas. Mesmo assim, sua imersão na filosofia nunca trouxe-lhe os resultados desejados.

"O estudo da filosofia", ele disse no fim de sua vida,

Me mostrou que cada filósofo considerava que havia encontrado a verdade. Quantos filósofos existiram? Mas só há uma verdade. Minha alma ansiava por algo mais. A filosofia é apenas um substituto; é como mascar chiclete em vez de pão. Pode o chiclete satisfazer sua fome? Eu entendi que assim como a ciência nada diz sobre Deus e a vida futura, tampouco diz a filosofia. Tornou-se perfeitamente claro para mim que era necessário recorrer à religião.

Em 1914 ele graduou-se de forma brilhante na realschule [escola secundária que enfatiza as ciências duras] e pela última vez tentou encontrar sentido na vida sem Deus, sem a Igreja, entrando no Instituto de Neuropsicologia de Petrogrado. Mas lá ele encontrou não menos decepção. "Eu vi que a psicologia estuda não exatamente o homem, mas somente seu "acondicionamento" - a velocidade de seus processos mentais, a percepção, a memória... essas tolices; era repugnante." Ele deixou o instituo após o primeiro ano. Logo em seguida ele sofreu uma grave crise espiritual. Começou a ter pensamentos suicidas.

Até que um dia, no verão de 1915, na cidade de Vyshny Volochok, quando de repente sentiu uma sensação específica de total desespero, um pensamento o atingiu como um raio sobre sua fé da infância: E se Deus realmente existe, Ele não deveria revelar a Si mesmo? Mas ele não era um crente! Do fundo de sua alma, em seu estado de desespero, ele gritou: "Senhor, se existes, revela-te a mim. Eu não estou Te procurando por algum desejo terreno. Eu só preciso saber uma única coisa - existes ou não?" E o Senhor se revelou! Ele se revelou [de forma tão convincente], que disse, "Senhor, permita que qualquer coisa aconteça comigo, qualquer sofrimento, qualquer tortura, só não Te afastes, não me prive da vida eterna." Com toda minha alma, completamente consciente, disse, "Eu não preciso de nada, nem vida familiar, ou qualquer outra coisa; apenas faça que eu nunca me afaste de Ti, que eu sempre esteja Contigo.'"


"É impossível relatar," disse Pe. Nikon,

Aquela ação de graça que convence uma pessoa da existência de Deus com o poder de algo óbvio, que não deixa espaço para nenhuma dúvida. O Senhor se revela como, por exemplo, um raio brilhante de sol que de repente brilha após nuvens escuras. Você já não duvida: foi o sol ou alguém fez aquele brilho? O Senhor revelou-se a mim de tal maneira que eu caí no chão com as palavras, "Senhor, glória a Ti, eu Te agradeço. Concede-me que possa servir-Te toda minha vida. Que todas as tristezas e sofrimentos na terra venham até mim, mas só não me deixe me afastar de Ti, ou perder Te."

Então ouvi o soar de um grande sino da igreja. No primeiro momento não prestei atenção. Então, quando vi que já era quase três horas da manhã e o sino continuava tocar, lembrei das palavras da minha mãe quando me disse que os idosos que iam visitá-la e diziam que pessoas espirituais as vezes ouvem sinos tocando no céu.

Ele ficou muito incerto sobre os sinos, preocupado que pudesse ter sido uma alucinação. Ele tranquilizou-se quando leu a autobiografia de Sergei Bulgakov que descreve a respeito de sua experiência de conversão que, "Não foi em vão que ouvi o toque dos sinos do céu naquele verão inteiro." "Então," lembra Pe. Nikon, "também lembrei-me da história de Turgenev, 'Relíquias Vivas', na qual Lukeria também disse que ouviu sinos soarem "de cima", sem se atrever dizer, "do céu".  A partir disso, Pe. Nikon chegou à conclusão que "juntamente com esta experiência espiritual, o Senhor também me permitiu perceber minha comunhão com o céu de forma sensorial." O Senhor revela-se a algumas pessoas de maneira interna e, ao mesmo tempo, através de sinais exteriores especiais para assegurá-los e apoiá-los.

Uma mudança radical na visão de mundo aconteceu em apenas um momento; um milagre claramente ocorreu. Da mesma forma, este milagre foi a conclusão natural e lógica de sua busca pela verdade no caminho da razão. O Senhor revelou o significado da vida para ele, e permitiu provar e ver que o Senhor é bom, e deixou que ele soubesse da Verdade. Isto foi o que Pe. Nikon disse sobre suas primeiras experiências após sua conversão:

Após isto, o Senhor começa a conduzir a pessoa ao longo de um caminho complicado, um caminho muito complicado. Fiquei espantado quando entrei em uma igreja após esta revelação divina. Eu costumava ir à igreja anteriormente - por compulsão; éramos levados para a igreja durante a escola também. Mas o que nós fazíamos lá? Eu ficava lá como um pilar, sem qualquer interesse, com meus próprios pensamentos. 

Mas depois de minha conversão meu coração abriu-se um pouco, e a primeira coisa que eu lembrei quando entrei na igreja foi a história sobre embaixadores do príncipe Vladimir [em sua viagem até Constantinopla], que, ao entrar na Igreja grega, não sabiam onde estavam, no céu ou na terra. Assim, a primeira percepção na igreja depois de experimentar tal estado é que você não está sobre a terra. A Igreja não é a terra - é um pequeno pedaço do céu. Que alegria era ouvir, "Senhor tem piedade!". Isto teve um efeito surpreendente em meu coração; todos os Serviços, a lembrança contínua do nome de Deus em várias formas, o canto, as leituras. Isso evocou uma espécie de êxtase, uma alegria; me preencheu... 

Quando alguém se aproxima e cai diante do Senhor, dizendo "Senhor, faça o que Tu quiseres; eu não sei de nada (e, na verdade, o que sabemos?), faça como quiseres, somente me salve," então o próprio Senhor começa a conduzir aquela pessoa. 

Aquele jovem realmente não sabia sobre o caminho espiritual naquele momento, mas ele caiu em lágrimas por Deus, e o próprio Senhor o conduziu. "Ele me conduziu de tal forma depois daquilo; vivi por 2 anos em Volochok, li livros e orava em casa." Este foi seu período de "coração ardente", como Pe. Nikon recorda.  Ele não via ou ouvia o que estava acontecendo ao seu redor. Naquela época ele havia alugado metade de uma casa privada em Sosnovitsy (perto de Vyshny Volochok). Ele tinha vinte e dois anos de idade. Do outro lado de uma fina parede divisória estavam as danças, os jogos, as músicas juvenis; eles estavam se divertindo. Eles tentavam convidá-lo também, pois ele era uma pessoa interessante - inteligente, atraente e educado. Mas ele tinha perdido o seu gosto pelo mundo. 

Os próximos dois anos de sua vida foram uma época de trabalhos espirituais incessantes, verdadeiro ascetismo. Ele pela primeira vez estava se familiarizando com os escritos dos Santos Padres, e lendo os Evangelhos essencialmente pela primeira vez. Isto foi o que ele disse sobre esse período quando ele chegou ao fim de sua vida: 

Foi somente nos Santos Padres e nos Evangelhos que eu encontrei algo realmente valioso. Quando uma pessoa começa a lutar contra si mesmo, quando ele começa a percorrer o caminho dos Evangelhos, então os Santos Padres tornam-se algo que ele necessita, tornam-se sua família. Um Santo Padre torna-se seu professor mais próximo, que fala à alma; e a alma recebe com alegria e é consolada. Aqueles filósofos e vários ensinamentos sectários repugnantes evocavam tédio, depressão e náuseas; mas eu cheguei aos Padres como eu chegava na minha própria mãe. Eles me acalmaram, me deram sabedoria e me alimentaram... Então o Senhor me deu a ideia de entrar na Academia Teológica de Moscou (em 1917). Aquilo significou muito para mim. 

 Do livro The Search for Truth on the Path of Reason por Alexei Osipov

                                                                                                      * * *

Com a idade de 36 anos, depois dos testes mais sérios de suas faculdades, Nikolai Nikolaevitch Vorobiev aceitou a tonsura monástica, tomando o nome de Nikon. Um ano mais tarde, Nikon tornou-se primeiro Hierodiácono, e logo depois, Hieromonge. Em 23 de março de 1933 (no aniversário de sua tonsura), foi preso e condenado a 5 anos em um campo siberiano. Durante vários anos após a sua libertação, privado da possibilidade de continuar a servir como sacerdote, Pe. Nikon trabalhou como assistente médico em Vyshnyaya Volotchka. Durante a Segunda Guerra Mundial, muitos prédios da igreja foram devolvidos à Igreja Ortodoxa Russa, e mais uma vez foi possível servir como padre. Em 1944, Hieromonge Nikon foi nomeado reitor da Igreja da Anunciação em Kozelsk, onde atuou até 1948. Depois disso, foi transferido, primeiro a Belev, em seguida, para a cidade de Efremov, posteriormente, para Smolensk, e, finalmente, naquilo que ele considerava como um exílio, a uma paróquia pobre e degradada na cidade de Gzhatsk.

Em seu novo local, ele primeiro teve de suportar incríveis dificuldades sociais e materiais. Quase imediatamente depois de receber algum dinheiro, batiushka iria distribuí-lo (aos necessitados), assim ele praticamente não tinha dinheiro algum. Suas únicas posses, além das mais básicas essenciais, consistia de livros, principalmente os escritos dos Santos Padres da Igreja Ortodoxa.  

Nos últimos anos de sua vida, quando já um abade, Nikon sofreu várias aflições, dificuldades seculares e vaidades. Antes de sua morte, ele disse que "a vaidade me permitiu enxergar que nós mesmos, sozinhos, somos incapazes de fazer qualquer coisa boa." Como ele mesmo admitiu, durante esse período, ele veio a compreender e experimentar o início da humildade cristã, a experimentar aquilo que nos mostra que "...nós mesmos somos nada; somos meramente a criação de Deus. Portanto, o que temos para nos orgulhar, e o que temos para comparar com Deus?" 

Antes de sua morte, Nikon suportou um último julgamento, uma doença grave. Por mais de três meses antes de sua morte ele tornou-se incapaz de ingerir qualquer alimento além do leite. No entanto, ele não expressou qualquer queixa, manteve-se sempre calmo e focado, e na maioria das vezes tinha um pequeno sorriso no rosto. Até a sua morte, ele manteve-se plenamente consciente e lúcido, e gastava todas suas energias instruindo aqueles ao redor dele. Ele pediu para que preservassem a fé guardando os mandamentos e arrependendo-se; seguindo em todas as formas possíveis os ensinamentos do Bispo Ignaty Biranchaninov; e tivessem cuidado especial em evitar as vaidades, que devastam completamente a alma e afasta-a para longe de Deus.  Para os que lamentavam-se em torno de sua cama, ele dizia: "Não há nenhuma razão para sentir pena de mim. Graças a Deus que eu já tenha concluído meu caminho terreno. Eu nunca quis viver; eu não vi nada de interessante nesta vida, e sempre me impressionou como os outros encontravam algo aqui e se apegavam com toda suas forças. Embora eu nunca tenha feito nada de bom na minha vida, de forma sincera eu sempre me esforcei [em me mover] em direção a Deus. Portanto, com toda minha alma, coloco minha esperança na misericórdia de Deus. O Senhor não pode desprezar aquele que sempre fez o máximo possível esforçando-se em direção a Ele. Eu sinto muito por você. O que mais você enfrentará? Os que vivem terão inveja dos mortos."

O descanso do Abade Nikon (Vorobiev) veio em 7 de setembro de 1963. Ele foi enterrado na cidade de Gzhatsk (agora chamada de Gagarin).

Para aqueles cristãos ortodoxos contemporâneos que sinceramente buscam a salvação, o Abade Nikon merecidamente tornou-se um dos grandes mestres do arrependimento na história recente. "Aqui, enquanto estou morrendo, está minha última vontade: Arrependei-vos, pensem em vós como o publicano, como pecadores, implorem a Deus por Sua misericórdia e tenha compaixão uns dos outros." 

Retirado do site da Igreja de São João Batista

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